Cidades

Corregedora arquiva reclamação contra juiz da Vara Cível de Cuiabá

A reclamação disciplinar, ajuizada pela empresa Global Participações em Agropecuária, contra o juiz Flávio Miraglia Fernandes, da 1ª Vara Cível de Cuiabá, foi arquivada pela corregedora-geral de Justiça de Mato Grosso, desembargadora Maria Erotides Kneip Baranjak.

O episódio impõe derrota ao conceituado escritório de advocacia chefiado por Sérgio Bermudes, sediado em Brasília, que representa os interesses da empresa agrícola. O advogado já havia denunciado o mesmo juiz, Flávio Miraglia,no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por atuação em outros processos que também envolvem disputas de terras.

Nesse caso, Bermudes entrou com a reclamação disciplinar pelo fato de Miraglia ter arquivado um processo de alvará judicial que estava repleto de irregularidades e vícios absolutos. De acordo com o blog “Isso é Notícia”, trata-se do Alvará Judicial 8575-13.2008.811.0041, onde figuram as empresas Olvepar S/A – Indústria e Comércio, como autor, e Agromon S/A Agricultura E Pecuária e Gobal Participações Em Agropecuária S/A, como interessados.

Miraglia decidiu contra os interesses da Global Participações, que contava com decisões favoráveis e consideradas nulas, proferidas pelo juiz que atuava no processo.

As decisões nulas foram assinadas pelo juiz José Geraldo da Rocha Palmeira, aposentado compulsoriamente pelo pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em 2004. Ele foi acusado de vender decisões judiciais para uma quadrilha de tráfico internacional de drogas, facilitando a fuga de uma traficante.

Além disso, ele também é investigado em outras demandas, acusado de diversas irregularidades enquanto atuava na Vara de Falências e Concordatas de Cuiabá.

Entre as ilegalidades constatadas estão a distribuição direcionada, ausência de documentos e alvarás. A decisão ainda declara nula a venda da fazenda da massa falida da empresa Olvepar para a Agromom.

Para a corregedora, após analisar a decisão, ficou claro que não houve desvios funcionais por parte do magistrado. A decisão pelo arquivamento é do dia 29 de abril. Essa mesma reclamação também foi proposta ao CNJ, pelos mesmos fundamentos, a ministra Nancy Andrighi também arquivou a demanda.

Com informações do blog Isso é Noticia

Confira a íntegra da decisão do juiz Flávio Miraglia

Decisão->AdmissãoProcesso Código n. 337540.

Vistos, etc.

Cuida-se de incidente nos autos da então concordata (atual falência) de OLVEPAR S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO, na qual requereu expressa autorização para realizar a negociação e transferência das cotas de capital social da empresa OLVEPAR AGROPECUÁRIA LTDA para a empresa AGROMON S/A AGRICULTURA E PECUÁRIA, mediante assunção de dívidas hipotecárias existentes com o Banco Brasil e BNDES.

Este pedido foi protocolado junto à escrivania da especializada, em data de 15/12/2000, observando-se que nessa mesma data o feito foi despachado, determinando a manifestação do Comissário e do Curador de massas.

O processo foi retirado pelo Dr. José Célio Garcia, em data de 15/12/2000 (sexta-feira), e devolvido em data de 18/12/2000 (segunda-feira), com manifestação favorável do então Comissário Sr. Vanilso de Rossi.

No mesmo dia 18/12/2000, o feito foi então encaminhado ao douto curador de massas, que se manifestou nesse mesmo dia, de forma sucinta e nos seguintes termos: “MM. Juiz: Pugno pela manifestação dos credores hipotecários (BB e BNDES), a fim de manifestarem-se sobre o pedido de assunção de divida. Cuiabá, 18/12/2000 – Almir Tadeu de Arruda Guimarães – Promotor de Justiça.” (fl. 143)

Na data de 19/12/2000, foi proferida a sentença, conforme se vê as fls. 145/148, observando-se que sem a manifestação dos credores hipotecários, conforme manifestou o douto curador de massas. Na sentença o magistrado ressaltou: “DEFIRO a comercialização e transferência das cotas de capital social da empresa OLVEPAR AGROPECUÁRIA LTDA, coligada a empresa concordatária, para a empresa AGROMON S/A AGRICULTURA E PECUÁRIA, apenas e tão somente MEDIANTE EXPRESSA ANUÊNCIA E ASSUNÇÃO DE DÍVIDAS DOS CREDORES HIPOTECÁRIOS, BANCO DO BRASIL E BNDES – BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL, que deverá ser comprovados nestes autos.”

A sentença foi encaminhada para publicação no dia 04/01/2001, tendo circulado na data de 05/01/2001, certificando-se o trânsito em julgado da sentença em 07/02/2001, sem oposição de nenhum recurso.

Na data de 26/09/2001, o então juiz titular desta especializada, determinou o arquivamento do feito ante a certidão de trânsito em julgado. (fl. 150).

À fl. 151 consta a guia de recolhimento relativo a desarquivamento sob número 159622/2002, emitida em data de 15/04/2002, sem nenhuma identificação em relação à pessoa que fez a solicitação de desarquivamento.

Posteriormente à solicitação de desarquivamento, encontra-se certidão datada de 12/03/2008, lavrada pela Sra. Gestora, informando que: “certifico que, em 10/03/2008, compareceu nesta escrivania parte interessada na localização deste processo, o qual não está cadastrado no Sistema Apolo, nem sequer distribuído. Que após varias buscas nesta Secretaria, o processo foi encontrado dentre aqueles que estavam no Setor de Arquivo, equivocadamente, sem a devida carga.” 

Na mesma data o processo foi despachado, determinando a sua distribuição bem como o recolhimento de custas, visando propiciar o seu cadastramento junto ao sistema Apolo e possibilitar que o mesmo fosse despachado, pois se assim não fosse o sistema não aceitaria qualquer tipo de andamento.

Em data de 27/05/2008, foi determinado que fosse colhida a manifestação do douto curador de massas, sendo que às fls. 176/185 manifestou-se sobre as irregularidades processuais requerendo a destituição do ex sindico e a declaração de ineficácia do negócio jurídico realizado entre a Requerente e a Agromon S/A. 

Aduz que a Requerente omitiu que receberia pagamento pela venda das ações, afirmando que a transação ocorreria meramente pela assunção das dívidas hipotecárias, e que a ação monitória revelou a existência de um Instrumento Particular de compromisso de Compra e Venda onde a Agromon S/A se comprometeu a pagar R$ 2.000.00,00 (dois milhões de reais) pelas cotas e mais R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) pelos bens, benfeitorias e ativo imobilizado.

Em petição constante nas fls. 187/190, o síndico apresentou informações dando conta de que o negócio não se restringiu somente a comercialização de cotas de capital social e assunção de dividas junto ao Banco do Brasil e BNDES, mas também faz expressa referência ao “Instrumento particular de compra e venda do total de cotas do capital social e outras avenças da sociedade Olvepar Agropecuária Ltda, ativo imobilizado, bens, benfeitorias e adesões”.

Expôs ainda que além da assunção das dívidas, ainda haveria o pagamento de R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais), correspondente a Us$ 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil dólares americanos) pelo ativo imobilizado, divididos em quatro parcelas, sendo a primeira de Us$ 400.000, com vencimento na data da assinatura do contrato, ou seja, 22/02/2001; duas parcelas, cada uma no valor de Us$ 470.000 com pagamento para as datas de 15/06/2001, 15/06/2002; e uma quarta parcela no valor de Us$ 460.000, com pagamento para a data de 15/06/2003, sendo que ainda foi expressamente assinalado na informação que a última parcela, constante de item “C-4, da letra c – do preço do ativo imobilizado, bens e benfeitorias” estava em aberto. 

Foi anexada à petição a cópia da sentença de quebra, bem como do instrumento particular acima referido, constando forma e datas de pagamento, tendo como referência o dólar americano. 

Às fls. 214/241 verifico a presença de uma petição onde Global Participações em Agropecuária S/A afirma que adquiriu da Agromon S/A e outros sócios, em janeiro de 2005, a totalidade das quotas representativas do capital social da Olvepar Agropecuária Ltda, hoje Pirapó Agropecuária S/A, alegando serem terceiros de boa-fé e que não poderiam sofrer as conseqüências de supostas irregularidades.

Ato seguinte, às fls. 289, fora determinado ao síndico que fosse apresentado os comprovantes dos depósitos em relação aos pagamentos feitos por Agromon S/A, constando ainda desse mesmo despacho, que fosse feita a demonstração desses depósitos e de seu lançamento contábil.

Às fls. 294/318, em 07 de abril de 2009, verifico petição arrazoando a respeito de nulidades absolutas que constam no processo, alegando que o processo tramitou sem distribuição no Sistema Apolo e sem preparo.

Às fls. 326/358 o síndico apresentou manifestação em atendimento ao despacho mencionado no parágrafo anterior, onde este apresentou os dados solicitados, e juntou documentos (extratos bancários, recibos, guias de DARF, contratos de honorários advocatícios e instrumento particular de cessão e transferência de crédito), informando acerca dos valores depositados, bem como o lançamento contábil em relação à venda celebrada entre Olvepar S/A Industria e Comércio e Agromon S/A Agricultura e Pecuária.

Às fls. 361/378, o juiz reconheceu claramente a existência das nulidades absolutas, destituindo o Síndico no âmbito do próprio processo de Alvará.

Em 09/11/2010 foi expedido edital de intimação aos credores da Massa Falida Olvepar S/A Indústria e Comércio visando dar conhecimento da existência destes autos, para, querendo, requerer às providências que entender necessárias, vez que ocorreu a alienação de imóveis sem seu conhecimento.

Em 02/06/2011 o magistrado ordenou a expedição do alvará judicial levando em consideração o pagamento da última parcela objeto da ação monitória, autos sob o n. 026/2007. 

Verifico que, na data de 25/04/2013, consta uma petição em nome de Alvário Pizzato Quadros e Juarez Pizzato Quadros requerendo a anulação do processo desde à petição.

Eis o relatório do necessário. Decido.

Depois de acurada análise de todas as peças que fazem parte deste feito, fica evidente a presença de irregularidades, principalmente em relação às circunstâncias da venda celebrada e suas peculiaridades.

Preambularmente, menciono o “protocolo” que se deu em 15/12/2000 (sexta-feira), nesse mesmo dia foi despachado pelo juiz titular a época, e foram retirados os autos na mesma data pelo procurador do síndico (sem procuração nos autos), e devolvido com manifestação na segunda-feira, dia 18/12/2000.

Com estranha celeridade, o feito foi encaminhado ao curador de massas no mesmo dia 18/12/2000, tendo sido apresentada manifestação também nessa mesma data, pugnando pela manifestação dos credores hipotecários (BB e BNDES), a fim de manifestarem-se sobre o pedido de assunção de dívida.

No dia seguinte, 19/12/2000 (terça-feira), o magistrado proferiu sentença favorável às fls. 145/148, da lavra do Dr. José Geraldo Rocha Barros Palmeira, que acolheu integralmente o pedido formulado, contrariando a manifestação do digno curador de massas, que se manifestou pela oitiva dos credores hipotecários, o que não foi atentado.

E ainda, determinou-se no final da sentença, que com a expressa “comprovação da assunção de dívidas”, seria expedido o alvará para que pudessem ser transferidas as quotas. Logo, ficava condicionada a expedição do alvará à comprovação anteriormente mencionada.

O art. 149 do Decreto Lei nº 7.661/45, que traz a seguinte redação:

“Art.149. Enquanto a concordata não for por sentença julgada cumprida (art.155), o devedor não pode, sem prévia autorização do juiz, ouvido o representante do Ministério Público, alienar ou onerar seus bens imóveis ou outros sujeitos a clausulas de concordata; outrossim, sem o consentimento expresso de todos os credores admitidos e sujeitos aos efeitos da concordata, não lhe é permitido vender ou transferir o seu estabelecimento. Parágrafo único: Os atos praticados pelo concordatário com violação deste artigo, são ineficazes relativamente a massa, no caso de rescisão da concordata.”(grifei)

Todavia, contrariando o que fora determinado, mesmo sem a comprovação da assunção de dívidas, o feito foi arquivado pelo magistrado Dr. José Geraldo Rocha Palmeira, contrariando o teor final da sua própria sentença, pois não existia nessa época tal assunção e nem o alvará.

A comprovação da assunção de dívidas somente aportou nestes autos com a manifestação do síndico na data de 30/04/2008 às fls. 156/158, sobremaneira devido à determinação exarada no despacho lançado nos autos da falência n°069/2000, no qual foi solicitado informações acerca da arrecadação das cotas da empresa Olvepar Agropecuária Ltda.

Logo, ficava nítido pela sentença, que as quotas societárias somente poderiam ser transferidas para a então compradora Agromon S/A Agricultura e Pecuária, com o aporte nos autos da comprovação da assunção de dívida tanto do BNDES quanto do Banco do Brasil S/A, o que não ocorreu.

Determina a Lei 7661/45:

“Art.52. Não produzem efeito relativamente à massa, tenha ou não o contratante conhecimento do estado econômico do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores:

(…)

VIII. a venda, ou transferência de estabelecimento comercial ou industrial, feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao falido bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, dentro de 30 (trinta) dias, nenhuma oposição fizeram os credores à venda ou transferência que lhes foi notificada; essa notificação será feita judicialmente ou pelo oficial de registro de títulos e documentos.” 

Verifica-se que a transferência de quotas para a empresa Agromon S/A Agricultura e Pecuária bem como para as pessoas físicas de Renato Ribeiro Abreu e Mario Aurélio da Cunha Pinto foi realizada há muito tempo conforme fls. 243/245.

Resta evidente que o juízo foi induzido a erro, fazendo-o crer que o negócio seria apenas uma assunção de dívidas, quando, na realidade, houve uma venda propriamente dita. Ademais, vejo que foi intencionalmente omitido, que nesta negociação haveria ainda a “compensação de dívidas” de Olvepar para com a empresa Agromon S/A Agricultura e Pecuária.

O represente do Ministério Público manifestou-se sobre as irregularidades processuais requerendo a declaração de ineficácia do negócio jurídico realizado entre a Olvepar S/A Indústria e Comércio e a Agromon S/A. Aduz que a Olvepar S/A Indústria e Comércio omitiu que receberia pagamento pela venda das ações, afirmando que a transação ocorreria meramente pela assunção das dívidas hipotecárias, e que a ação monitória revelou a existência de um Instrumento Particular de compromisso de Compra e Venda onde a Agromon S/A se comprometeu a pagar R$ 2.000.00,00 (dois milhões de reais) pelas cotas e mais R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) pelos bens, benfeitorias e ativo imobilizado. 

Afirma que a Agromon S/A pagou de sinal pelo negócio o valor de R$ 1.010.000,00 (um milhão e dez mil reais) e que o valor atribuído a Olvepar Agropecuária Ltda foi baseado em uma avaliação ocorrida em 1997, três anos antes do pedido, sendo que o valor do imóvel e das máquinas foram os critérios utilizados para se chegar ao montante de R$ 9.600.000,00 (nove milhões e seiscentos mil reais). 

Analisando a certidão de fls. 159/162, em que são partes Banco do Brasil S/A, e Olvepar Agropecuária Ltda, verifica-se que foi retificada e ratificada a Escritura Pública de confissão e assunção de dívidas com garantia hipotecária e cessão de créditos, correspondente a operação de n. 492.300.044, no valor de R$ 3.188.000,00 (três milhões, cento e oitenta e oito mil reais), com vencimento para 01/12/2020, cuja qual se encontra registrada no Livro 056, fls. 119 a 128, no cartório do 1º Serviço Notarial Registro de Imóveis da cidade de Diamantino/MT, o que é discrepante do lançado na petição inicial, uma vez que consta nesta que o valor da dívida junto ao Banco do Brasil é de R$ 3.921.218,22 (três milhões novecentos vinte um mil, duzentos dezoito reais e vinte dois centavos) originária dos contratos de n. 11/58562-5 e 11/58606-0, com vencimento para o dia 15/06/2005, registrada no livro de n. 33, fls. 098/106, junto ao Cartório do 2º Serviço Notarial e Registral Capistrano da Cidade de Diamantino/MT, bem como da 
cédula de crédito industrial celebrada em 21/01/1999, cujo vencimento se daria em 15/02/2004. 

Desta feita, resta evidente que a certidão de fls. 159/162 sequer chegou a ser concretizada.

Quanto à dívida com o BNDES, os valores lançados na petição não conferem com o confessado, pois às fls. 163/173, vê-se na cláusula segunda, que o valor confessado referente aos contratos de nºs 98.2.410.6.1 e 98.2.410.6.2, é da ordem de R$ 6.536.397,26 (seis milhões quinhentos e trinta e seis mil trezentos e noventa e sete reais e vinte e seis centavos), e este valor é divergente do lançado na inicial, que assinalou que a dívida seria de R$ 7.929.382,20 (Sete milhões, novecentos e vinte e nove mil e trezentos e oitenta e dois reais e vinte centavos), portanto, existe uma diferença de R$ 1.392.985,00 (um milhão, trezentos e noventa e dois mil, novecentos e oitenta e cinco reais). 

Em suma, apontou-se uma divida superior a que realmente era devida.

Como se verifica pela exposição feita, as nulidades existem desde a petição inicial, portanto, não há dúvida de que o alvará concedido é plenamente nulo. 

Cumpre salientar que as nulidades podem ser alegadas de ofício pelo juiz.

Dessa forma, aplica-se plenamente o disposto no art. 168, parágrafo único do CC: “As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes”. 

Assim, é patente que, deparando-se com causa de nulidade (vício ofensor da ordem pública) o juiz deve conhecê-la e declará-la de ofício, desconstituindo eventuais efeitos do ato nulo, com as pertinentes exceções.

Pode ainda, ser argüida a nulidade absoluta a qualquer tempo, pois são insuscetíveis de preclusão. 

Destarte, ressalto ainda que decisão em processo de alvará, como este em comento, não propicia fato constitutivo do direito, nem coisa julgada. 

Alvará, como consta neste processo, é uma licença para vender o que já está caracterizado no âmbito material, de maneira que, uma vez concedido pelo juiz, pode ser revogado e considerado nulo a qualquer tempo, já que eivado de ilegalidades.

A pretensão da Requerente não foi comunicada aos seus credores, os quais, ao que se aponta nos autos, nem tomaram conhecimento da transação, pois a apreciação do pedido ocorreu com extrema rapidez (o protocolo se deu em 15/12/2000 e a sentença foi proferida em 19/12/2000).

Com efeito, a transferência das cotas do capital social não atendeu à finalidade da concordata preventiva, instituto que buscava facilitar o adimplemento dos credores, a fim de se elidir a falência.

Ora, se a petição inicial não foi distribuida, o preparo não foi pago e não houve registro do processo de Ação de Alvará, então o processo é nulo, pois acima de tudo foi desobedecida a forma prescrita em lei.

À fl.145 consta um ato nulo de pleno direito, tendo em vista que o juiz decidiu sobre um processo que para o mundo jurídico não existia, bem como, consta à fl.152 uma certidão de que o processo não foi cadastrado no sistema Apolo e nem distribuido. 

De forma também surpreendente, à fl. 153, o Juiz operou como se estivesse validando um ato nulo pois mandou distribuir e pagar as custas de um processo, cuja tramitação tinha sido concluída e conforme se vê na fl. 150, havia sido determinado o arquivamento, que foi precedido sem carga. 

O requerimento de Alvará consta com data do dia 28 de novembro de 2000, já a regular distribuição consta com data do dia 23 de abril de 2008.

E não é só, a decisão concedendo o Alvará foi proferida em 19 de dezembro de 2000, mas a emissão das guias para o preparo consta com data de 24 de abril de 2008. Logo, o registro, distribuição e preparo foram realizados com período de 08 anos após a decisão do magistrado propiciando o alvará. 

A norma é cogente, de ordem pública, visto que determina que será cancelada a distribuição se em 30 (trinta) dias não houver o preparo.

Art. 257 CPC: “Será cancelada a distribuição do feito que, em 30 (trinta) dias, não for preparado no cartório em que deu entrada”.

Como visto, no presente caso, ao menos existia distribuição para que fosse cancelada. Na realidade, não existia processo judicial valido e regular. O que realmente existia era um calhamaço de papel escrito, cujos interesses de pessoas restritas alí constava sorrateiramente, o que induz a possivel pratica de atos ilicitos escusos visando exclusivamente lesar a empresa e seus credores.

Ademais, verifico ainda outra nulidade insanável que constou no processo, mesmo antes de ter sido concedido o alvará e que foi ratificada pelo respectivo juiz à fl. 145, correspondente ao artigo 84 do Código Civil: “Quando a lei considerar obrigatória a intervenção do Ministério Público, a parte promover-lhe-á a intimação sob pena de nulidade do processo.”

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “A ausência do Ministério Público, quando fiscal da lei, em casos nos quais deve intervir em nome do interesse público, gera nulidade absoluta.” Acórdão volume/91 – página 75; Apelação 274.824-1. Rel. Des. Leite Cintra.

Ainda, o entendimento de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, no Código de Processo Civil Comentado, 10ª ed. Fls.491/492: “A intervenção posterior do MP não convalida o processo.”

Ressalto o trabalho que consta nas páginas 294/319 deste processo, que evidencia demonstrações claras que correspondem às nulidades absolutas.

Não podem os pagamentos ocorridos mediante um acordo constante no processo de Ação Monitória que foi habilmente ajuizada, justamente para a obtenção do resultado que agora querem que seja aplicado, ter o condão de revalidar as nulidades absolutas que estão no processo de alvará. 

Há contrassenso na postura do magistrado que decidiu às fls. 361/376. 

Ora, na página 368, o juiz prolator daquela decisão, evidencia várias nulidades absolutas, concluindo na exoneração do Síndico. 

Todavia, mesmo apos essa constação grave de existencia de nulidades absolutas e por isso insanaveis, propiciou o andamento do processo viciado.

O fato do terceiro de boa-fé adquirir bens que tem em seu nascedouro ato eivados de nulidade absoluta, não descaracterizam essas nulidades. 

Outrossim, o fato do terceiro adquirente ter pago determinado preço pelo bem, cujo documento caracteriza-se como absolutamente nulo, não elide o respectivo vício de origem.

Constatada a nulidade absoluta do ato, o bem retorna ao proprietário e o terceiro adquirente passa a ostentar o direito de indenização, ou de ressarcimento com acréscimos legais pelo que pagou. 

E mais, este Poder diante dessas irregularidades, não pode ficar omisso ou pactuar com esta situação nefasta, devendo fazer cumprir os ditames da Lei.

Ante o exposto, DECLARO A NULIDADE DO PROCESSO DE ALVARÁ DESDE O PROTOCOLO DA PETIÇÃO INICIAL, devendo ser cancelada a distribuição indevidamente procedida, ANULANDO O ATO DA VENDA DA EMPRESA OLVEPAR AGROPECUÁRIA LTDA. 

Declaro ainda a nulidade do negócio jurídico celebrado entre Olvepar S/A Indústria e Comércio e Agromon S/A Agricultura e Pecuária.

Determino a intimaçao do síndico para adotar as providências cabíveis à arrecadação do bem em favor da MASSA FALIDA OLVEPAR S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO.

Intime-se. Cumpra-se. Publique-se.

Cuiabá, 10 de outubro de 2013.

Flávio Miraglia Fernandes

Juiz de Direito

Redação

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