Segundo o sul-africano Eddie Cottle, autor do livro “Copa do Mundo da África do Sul: um legado para quem?” em entrevista ao Le Monde Diplomatique Brasil, a população sul-africana se deixou ludibriar por promessas de mais emprego, mais turistas e investimentos bilionários que viriam com a Copa, mas nada disso se materializou.
Ele ainda afirmou que, naquela ocasião, a Fifa também fez pressão sobre os prazos de conclusão das obras. “Grande parte dos atrasos foi causada por mudanças no projeto arquitetônico. Era a Fifa querendo algo novo”, relatou.
A entrevista foi publicada em novembro do ano passado, muito antes da fatídica declaração do secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, sugerindo um “pontapé no traseiro” dos organizadores da Copa 2014, para que entreguem a tempo as obras de infraestrutura para o Mundial.
Em Cuiabá, apesar das expectativas, as obras de mobilidade urbana estão longe de chegar a contento segundo os que realmente entendem do assunto. O professor do Núcleo de Estudos de Logística e Transporte (NELT) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), o engenheiro e pesquisador Luiz Miguel de Miranda, é incisivo ao dizer: o Estado não vai conseguir cumprir com o compromisso de entregar as obras propostas.
Segundo ele, a demora pela escolha do modal contribuiu para o atraso, mas nem se as obras já tivessem começado há um mês, seria possível cumprir o cronograma. Um balanço feito pelo site oficial do Mundial, Portal 2014, apontou que VLT cuiabano demorou para ter seu edital de licitação elaborado e a previsão de início das obras é entre maio e junho ((leia mais sobre VLT na página 5).
“É importante frisar que o atraso é em todo o País. O Rio de Janeiro é um dos poucos a estar adiantado – eles vão fazer BRT e VLT – mas estão seguindo dois cronogramas: um para a Copa 2014 e outro para as Olimpíadas de 2016”, esclarece.
Devagar e sempre – O que também agrava o atraso e confirma a passos largos a tese do professor é o andamento das obras que circundam o modal e as rotas alternativas – serão cerca de 90 – para atenuar transtornos. As trincheiras previstas para cortar a Avenida Miguel Sutil têm previsão para iniciar até o fim do semestre. “As obras devem ser feitas pedacinho por pedacinho, para não obstruir as principais vias. Imagina o tempo que isso leva? Desta forma, em dois anos será impossível concluir essas obras”, alerta.
Quanto às questões aeroportuárias, as obras da primeira etapa de ampliação do terminal de passageiros do aeroporto Marechal Rondon – orçadas em R$ 5,8 milhões – estão previstas para iniciar apenas em maio. Em contrapartida, a Arena do Pantanal figura como um dos estádios mais adiantados, com 43% das obras concluídas.
Em encontro que reuniu a Secopa e as entidades empresariais na última segunda-feira (19), o secretário-adjunto de Infraestrutura da Secopa, Marcelo Oliveira, deixou claro que nada seria feito às pressas. “Não vamos sair rasgando e quebrando tudo. Vamos fazer as coisas como devem ser feitas”, afirmou.
Na ocasião, o secretário Eder Moraes ainda brincou ao dizer que nada mais pode atrapalhar o início das obras. “Quando começarem as escavações, vamos contratar um ajudante só para ficar com uma pazinha”, revelou. “Se aparecer um ossinho diferente, uma perereca ‘não sei o quê das quantas’, ele tira logo que é pra não ter que embargar a obra”, completou.
Eder Moraes afirmou ainda que os empresários não precisam se preocupar, pois “apesar dos boatos de que o Governo do Estado está em crise, todos os recursos para as obras de mobilidade urbana estão garantidos”.
Crescimento no tráfego, diminuição nas vias
Só na Avenida Historiador Rubens de Mendonça, em frente ao Shopping Pantanal, o professor do Núcleo de Estudos de Logística e Transporte (NELT), Luiz Miguel de Miranda contabilizou um fluxo de 85 mil veículos por dia. “Para contingenciar todo esse fluxo, quando começarem as obras, será um trabalho e tanto”, afirma.
Segundo dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), em Cuiabá e Várzea Grande existem cerca de 430 mil veículos para uma população média de 800 mil habitantes; se comparado aos levantamentos dos anos anteriores, a tendência é que a proporção reduza ainda mais.
Em dezembro de 2003, a frota de ambas as cidades era de aproximados 178 mil veículos, saltando para aproximados 349 mil em dezembro de 2009 e 430 mil em fevereiro deste ano. Isso equivale a um crescimento de quase 142%, entre 2003 e 2012. Se for mantido o crescimento médio de 11% anual, constatado entre 2009 e 2012, no ano do Mundial, mais de meio milhão de veículos – em torno de 525 mil – entre automóveis, caminhonetes, motocicletas e ônibus estarão circulando pelas cidades.
O secretário-adjunto de Infraestrutura da Secopa, Marcelo Oliveira, afirmou que toda a população, em algum momento, será prejudicada pelos canteiros de obras. “As reuniões com os consórcios serão pontuais no sentido de tentarmos fazer pistas paralelas às grandes trincheiras.”, elucidou. Oliveira ainda instrui que mesmo com a providência das obras de desbloqueio, a população já deve começar a procurar outros caminhos para fugir dos engarrafamentos.
Isadora Spadoni – Da Redação
Fotos: Mary Juruna