Foto: Bruno Cidade
Roseli de Fátima Meira Barbosa, esposa do ex-governador Silval Barbosa (PDMB) e ex-secretária de Estado da Secretaria de Trabalho e Assistência Social de Mato Grosso (SETAS-MT), foi presa durante a segunda fase da operação “Arqueiro” pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) no dia 20 de agosto, em São Paulo. O jornal Circuito Mato Grosso, há mais de dois anos, foi o primeiro veículo de comunicação a denunciar as irregularidades que culminaram na investigação, resultando em sua detenção.
Denominada “Ouro de Tolo”, a operação investigava desvios dos cofres públicos entre os anos de 2011 e 2014, período em que Roseli ficou à frente da SETAS. No dia 25 de março de 2015, a juíza Selma Rosane Santos Arruda, titular da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, havia acatado denúncia do Ministério Público Estadual (MPE) e incluiu a ex-primeira-dama e outras 32 pessoas como réus no esquema que desviou R$ 8,1 milhões para confecção de apostilas com termos de baixo calão oriundas da Desciclopédia, um conhecido site de humor da internet.
De acordo com a denúncia, Roseli Barbosa ficava com 40% dos recursos desviados.
As polêmicas envolvendo a ex-secretária de Estado, no entanto, começaram bem antes. No dia 11 de julho de 2013, a edição 448 do jornal Circuito Mato Grosso publicou uma reportagem que já denunciava a gestão fraudulenta da ex-primeira-dama. “Descaso, superlotação e maus-tratos”, assinada por Sandra Carvalho, apontava para uma dispensa de licitação no valor de R$ 5,2 milhões em favor da empresa de pequeno porte (EPP) Elza Ferreira dos Santos Serviços (SELIGEL) para atender o Lar da Criança, instituição de acolhimento mantida pela SETAS.
O contrato teria duração de seis meses e tinha como objeto “serviços de mão de obra de natureza contínua visando à implementação de ações para o atendimento das demandas do Lar da Criança”. A matéria trazia ainda denúncias de maus tratos e superlotação do estabelecimento.
Se semana seguinte, a edição 449 do veículo mato-grossense informava que o MPE investigava a SETAS por conta dessa dispensa de licitação, além de divergências entre a pasta e a antiga Secretaria de Administração (SAD), que afirmavam ter informações diferentes acerca do número de servidores a serem contratados e que estavam previstos pelo acordo, bem como a justificativa da dispensa de licitação por parte do poder executivo, que relatou um suposto caráter de urgência solicitado pelo MPE, mas que foi negado pelo órgão.
A matéria trazia ainda outra informação “curiosa”: apesar de ser considerada de pequeno porte, a SELIGEL já havia faturado R$ 38,1 milhões da gestão Silval Barbosa – isso até julho de 2013.
Retaliação
Expor situações corruptas de gestores públicos tem sido um dos papéis da imprensa, que pode até não ter poder de polícia, mas possui jogo de cintura para escapar, sempre que possível, dos tentáculos da política partidária. Essas ações, infelizmente, não estão blindadas de possíveis retaliações, como ocorreu com o Circuito Mato Grosso na época das denúncias envolvendo o Lar da Criança e a ex-primeira-dama e ex-secretária de Estado da SETAS, Roseli Barbosa.
Após as duas edições que denunciaram essas irregularidades na SETAS, Roseli “convocou” um determinado veículo de comunicação de Mato Grosso para dar sua versão da história, e se negou a passar informações para o Circuito. A matéria foi publicada na edição 450, de 25 de julho de 2013, e confirmava a denúncia de superlotação do estabelecimento pela juíza Ana Paula da Veiga Carlota Miranda, da Vara da Infância e da Juventude.
Maus tratos
Na edição 451 de 1º agosto de 2013 do semanário mato-grossense, outro fato envolvendo o Lar da Criança se somou às irregularidades apontadas pelo jornal. “Quatro crianças agredidas na Instituição vão ao IML”, relatava que a Delegacia Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (DEDDICA) registrou entre os anos de 2012 e 2013 quatro denúncias de maus tratos contra crianças dentro do Lar.
Todas haviam se submetido a exames de corpo delito no Instituto Médico Legal (IML) e um deles já havia denunciado o caso formalmente à justiça.
Gaeco entra em cena
O promotor Clóvis de Almeida Júnior, da 36º Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público do MPE, foi um dos principais atores nas investigações sobre a atuação de Roseli Barbosa. Ele, que investigava a dispensa de licitação milionária no contrato firmado entre a empresa SELIGEL e a SETAS, solicitou auxílio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO).
A informação foi veiculada na edição 459 do jornal Circuito Mato Grosso, que informava também outro negócio polêmico da pasta comandada pela ex-primeira-dama do Estado: o pregão presencial 024/2013, que previa a compra de 100 mil colchões, ao custo de R$ 6,5 milhões.
No dia 8 de maio de 2014, a edição 487 estampou em suas páginas a “Operação Arqueiro”. Deflagrada pelo GAECO, a ação isolou Roseli politicamente, que já havia deixado a SETAS em fevereiro do mesmo ano. O grupo fez apreensão de vários documentos nas áreas contábeis, licitatórias, de liquidação e de prestação de contas referentes a convênios firmados entre a pasta e empresas de fachada para realização de cursos profissionalizantes como o “Qualifica Mato Grosso” e “Copa Ação”.
Apartamentos são sequestrados pela justiça
A juíza Selma Rosane de Arruda determinou bloqueio de apartamento duplex avaliado em mais de R$ 3 milhões onde a ex-secretária da SETAS, Roseli Barbosa, reside com seu marido, o ex-governador de Mato Grosso, Silval Barbosa.
O imóvel fica no Jardim das Américas, uma das regiões mais valorizadas de Cuiabá. Segundo informações do jornal “A Gazeta”, foram ainda sequestrados quatro lotes em Matupá (704 km da Capital), e outros três apartamentos, sendo dois duplex. No total, 38 imóveis de nove pessoas estão indisponibilizados pela justiça.
A medida foi solicitada pelos promotores e acolhida pela magistrada, que visa garantir o ressarcimento de recursos públicos desviados pelos acusados. A prisão de Roseli teve como base a delação de Paulo César Lemes à justiça, que também está envolvido no esquema.
Desembargador nega habeas corpus
O desembargador Rondon Bassil Dower Filho negou na última segunda-feira (24), pedido de habeas corpus em favor da ex-primeira-dama de Mato Grosso, Roseli Barbosa, presa desde o dia 20 de agosto em razão da “Operação Ouro de Tolo”, desdobramento da “Operação Arqueiro”, que investigava denúncias envolvendo a SETAS e empresas de fachada que confeccionaram apostilas para programas governamentais com base em textos satíricos e de humor, do site Desciclopédia.
Rondon reafirmou a necessidade da prisão de Roseli de modo a não prejudicar a ordem pública, pois "na medida em que os delitos apurados ocorreram em órgão público estadual, destinado à assistência ao trabalho e assistência social, não se limitando, a paciente, à conduta omissiva, mas, também, participando comissivamente do desvio dos recursos financeiros".
Além da ex-primeira-dama, também foram presos o ex-chefe de gabinete da gestão Silval Barbosa, Silvio César Corrêa Araújo. O ex-assessor da SETAS, Rodrigo de Marchi, também foi preso, mas se beneficiou de um habeas corpus concedido na segunda-feira (24) pelo desembargador do TJ-MT, Orlando Perri. Já Nilson Costa e Faria, empresário envolvido no esquema, continua encarcerado no presídio do Carumbé, em Cuiabá.
Confira detalhes da reportagem do Jornal Circuito Mato Grosso