Internacional

Brasileiros relatam clima de pânico e incertezas na Grécia

Vivendo em Atenas desde 2008, o mecânico brasileiro Alexandre Mitrogiannis diz que o Plano Collor e as turbulências econômicas que vivenciou no Brasil quando era mais jovem o prepararam para enfrentar a atual crise grega.

A crise na Grécia já se estende há anos, e o impasse com os credores e o temor de uma corrida aos bancos fez com que o governo determinasse que as agências bancárias ficassem fechadas por uma semana até a próxima segunda-feira. Até lá, os saques nos caixas automáticos estarão limitados a 60 euros (R$ 208) por dia.

"Pelo menos essa medida não afetou tanto nossa família, porque já tínhamos tirado nossas economias do banco", diz Alexandre. "Quem tem a experiência do Brasil dos anos 1980 e 1990, da hiperinflação e Plano Collor, já sabe onde esse tipo de crise pode chegar", diz ele, explicando que há rumores de que os bancos possam permanecer fechados por 2 ou 3 meses se a Grécia for obrigada a deixar a zona do euro
Nesta terça-feira (30), Atenas não conseguiu pagar uma parcela de 1,6 bilhão de euros de sua dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o que complicou ainda mais a situação do país.

Trata-se da mais grave crise enfrentada pela zona do euro – formada por 19 países – em seus 16 anos de história. E o Banco Central grego já advertiu sobre o risco de que o país tenha de abandonar a moeda europeia e até deixar a UE se uma solução não for encontrada para liberar o pacote de resgate para o país.

No domingo (5), será realizado um referendo sobre o acordo da Grécia com seus credores, que exigiria que o governo do país corte ainda mais seu orçamento. O primeiro-ministro Alexis Tsipras, eleito em janeiro com uma plataforma antiausteridade, faz campanha pelo "não" – a não aceitação das condições impostas pelos credores.

Ninguém tem certeza sobre o que um ou outro resultado representaria para o futuro do país, mas, segundo analistas, uma vitória do "não" pode dificultar a permanência da Grécia na zona do euro, enquanto que se o "sim" ganhar o governo de Tsipras deve perder sua base de apoio.

Alexandre e outros brasileiros que vivem na Grécia relatam um clima de muita incerteza e tensão, principalmente nos grandes centros urbanos gregos.

"A atmosfera é de pânico. Talvez a situação nem seja tão ruim como alguns imaginam, mas a boataria sobre o que pode acontecer [se a Grécia sair do euro] faz com que haja muito medo e tensão no ar", diz a professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira Debora Arruda Pio, que vive na Grécia há 16 anos.

"No sábado, as pessoas correram para o supermercado para comprar comida por temor de que haja um desabastecimento. No fim do dia, todas as prateleiras estavam vazias. Parecia que tinha ocorrido um bombardeio em Atenas."

Depois do anúncio do fechamento dos bancos, as filas nos postos de gasolina e nos caixas eletrônicos também teriam se multiplicado, segundo relatos dos brasileiros.

"Todo mundo quer garantir seus 60 euros, por isso as filas duram até tarde da noite", diz a dentista brasileira Márcia Papoudos, que também vive em Atenas.

Segundo Márcia, o governo chegou a anunciar um aumento do policiamento nas instituições financeiras para evitar que os correntistas sejam roubados.

"Acho que o que torna a situação ainda mais tensa é que há uma guerra de informações na imprensa e os políticos estão fazendo pouco para informar a população de forma clara sobre o que está em jogo nessa consulta popular – ou seja, o que acontece com a Grécia no caso de uma vitória do sim ou de uma vitória do não", opina.

Corrida aos bancos
Muitas famílias que vivem na Grécia temem perder parte de suas economias no banco se o país voltar a utilizar o dracma, moeda que circulava antes do euro. É por isso que algumas pessoas já estão guardando euros em casa, como conta Alexandros Gantzias, presidente da Associação Lar Brasileiro na Grécia e dono de um portal de notícias focado no setor financeiro.

"Cerca de 30 bilhões de euros já foram sacados dos bancos gregos nos últimos meses", conta.

Alexandros diz que tem sido contatado por muitos turistas brasileiros, que compraram pacotes de viagem para a Grécia e estão preocupados sobre complicações em suas férias.

"Teve até uma moça que vai se casar por aqui. Mas os turistas não têm tido grandes problemas, além de mais filas no caixa eletrônico. Eles podem usar o cartão de débito e crédito e para eles não há limite de saque", diz ele.

"O turismo é a indústria mais próspera da Grécia, o que ainda sustenta a economia do país. Para o governo, fazer qualquer coisa que possa afastar muitos turistas é dar um tiro no pé", opina.

A situação econômica grega começou a se deteriorar há oito anos.

Dois pacotes de resgate já foram aprovados para o país. Agora, para liberar mais recursos, credores europeus exigem novas reformas econômicas, cortes de gastos e aumentos de impostos.

O governo de Tsipras, porém, foi eleito prometendo bater de frente contra essas exigências e se recusa a "violar seu mandato".

As dificuldades financeiras têm tido grandes repercussões sobre a vida dos gregos – e, evidentemente, também sobre os brasileiros que vivem no país.

Debora, por exemplo, calcula que já teve seu salário cortado em 30% nos últimos 5 anos em função da crise econômica e seu marido, economista, está desempregado há dois anos.

"Acabamos fazendo trabalhos extras para compensar. Eu dou aulas particulares, por exemplo", explica.

Alexandre diz que está cada vez mais difícil fazer planos. "O problema é que, ainda que eu consiga proteger minhas economias, se as pessoas não tiverem dinheiro não terão como pagar pelos meus serviços", explica o mecânico.

Já Márcia diz que embora ela e o marido, um cirurgião plástico grego, também tenham tido uma queda dos rendimentos nos últimos anos, sua maior preocupação é com os filhos, que estão na universidade.

"Um estuda Engenharia e o outro Negócios. Espero que consigam um bom emprego por aqui, porque muitos jovens acabam tendo de migrar", diz ela.

Os brasileiros dizem que, apesar das dificuldades, não avaliam a possibilidade de deixar a Grécia.

"Esse ainda é um país com uma boa qualidade de vida, principalmente se comparado ao Brasil", diz Márcia. "Não há muita violência e o custo de vida é relativamente baixo. Além disso, a situação econômica do Brasil não é muito animadora."

Luis Almeida, brasileiro descendente de gregos que tem uma locadora de carros na ilha de Kefalonia diz que quem vive fora dos centros urbanos está mais protegido da crise.

"O turismo é uma área que continua crescendo na Grécia", diz ele.

"E mesmo a possibilidade de o país sair do euro, não é algo que me preocupa muito. Podemos ter algum problema no curto prazo, mas seria algo pontual. Meus clientes são principalmente britânicos, que ganham em libras e vão continuar vindo para as ilhas gregas – ainda mais se a transição para o dracma significar preços mais atrativos para eles."

Fonte: iG

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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