Foto tirada pela brasileira com a filha em Portugal mostra os pés das duas; ela não quis revelar a identidade para proteger o anonimato da menina, que tem sete anos (Foto: Arquivo pessoal)
A Justiça portuguesa tirou a guarda de uma menina de 7 anos de sua mãe, uma brasileira que mora em Portugal há 17 anos, e a entregou ao pai, acusado de abusar sexualmente da menina.
A mãe da criança agora tenta reverter a decisão da juíza da cidade de Tavira, no sul do país, com o apoio da família no Brasil e de associações de defesa de mulheres e crianças em Portugal. O caso ganhou ampla repercussão na imprensa portuguesa e um abaixo-assinado para que as autoridades brasileiras acompanhem o caso.
A decisão foi tomada com base na acusação do pai da menina de que sofria alienação parental (quando um dos pais faz a criança rejeitar o outro). A mãe alega que o pai não podia visitar a criança porque as duas viviam nos últimos oito meses em uma residência para vítimas de violência, para a qual se mudaram após ele agredi-la e ameaçá-la.
O processo em que o pai da menina é acusado de abuso sexual e violência doméstica ainda corre na Justiça. A juíza diz que não está provado que o crime tenha ocorrido. A mãe da garota diz que apresentou relatórios de quatro psicólogos diferentes atestando que há sinais de que os abusos de fato ocorreram.
Suposto abuso
A brasileira falou com o G1, mas pediu que seu nome não fosse revelado para proteger a identidade da filha. Engenheira e empresária, Ana (nome fictício) tem 35 anos e mora em Portugal desde os 17. Ela passou sete anos com o ex-companheiro, do qual se separou em 2010, quando a filha tinha dois anos.
A primeira suspeita de que o pai abusava da filha veio em 2012, após a menina voltar de uma visita à casa dele com relatos que preocuparam a mãe. “A psicóloga conversou com ela, contatou a polícia e informou a suspeita que ela tinha [de abuso sexual]. Fui ao centro de saúde, mas só nos chamaram para o exame de medicina legal 14 dias depois. O próprio médico disse que o exame se mostraria inconclusivo, por ter passado tanto tempo”, contou Ana.
Após o relato de dois psicólogos diferentes, a Justiça decidiu que as visitas da criança ao pai fossem supervisionadas. Mas, depois de um tempo, devido ao exame físico ter se mostrado inconclusivo, visitas sem supervisão voltaram a ser permitidas.
Segundo Ana, após uma dessas visitas, em 2015, o ex-companheiro a agrediu e a ameaçou de morte. Na mesma época, as suspeitas da ocorrência de abuso sexual voltaram, após mais relatos da criança e de ela ter sido diagnosticada com uma doença na vagina.
As duas então saíram de casa por sugestão de associações de apoio a vítimas de violência e foram encaminhadas a um abrigo por motivos de segurança. “Abandonei minha casa, minha empresa e uma vida confortável para ir para esse lugar a 10 horas de viagem dali. Mas era o certo a fazer, pelo bem da minha filha”, diz Ana.
Da escola para a delegacia
A reviravolta no caso veio no último dia 29 de fevereiro, quando a juíza aceitou a queixa do pai da criança de que não podia ver a menina e deu a guarda a ele. Ana diz que só soube da decisão quando a polícia foi buscar a filha na escola.
“Ligaram dizendo que ela já estava na delegacia. Fui correndo para lá. Ela não estava entendendo nada. Pedia para não ir, perguntava quando eu iria buscá-la, se eu não gostava dela. Foi um choque. Ela nem sequer pôde ser preparada para abandonar a mãe, com quem vive desde que nasceu”, contou a brasileira à reportagem, chorando muito.
A juíza se baseou na queixa do pai de que não podia ver a criança e no relatório de um médico que, segundo Ana, nem examinou a garota. “Ela me acusou de alienação parental, mas eu não deixei que ele visse minha filha porque ele é o agressor e ela estava em perigo. A gente morava em uma casa de proteção justamente por isso”, diz a brasileira.
A guarda total da menina foi dada ao pai em caráter provisório, mas Ana não sabe quando poderá ver a filha novamente. Nesta quinta-feira (9) ela será ouvida pela juíza e espera poder reverter a decisão.
“Não sei quanto tempo vai levar esse processo. Enquanto isso, minha filha está em perigo. Dói demais saber que ela está passando por isso. Dói demais”, diz.
Fonte: G1