Há quase 20 anos resistindo com esforços coletivos e voluntários, a Biblioteca Comunitária do bairro Parque Geórgia ganha “fôlego” para se manter em funcionamento. Um dos únicos espaços de leitura da região do Coxipó, coração de uma estrutura que já sediou diversas ações de cunho cultural e educativo, foi contemplado com um projeto de revitalização pela Lei Aldir Blanc.
A reforma é uma demanda antiga da comunidade que se localiza entre os bairros Jardim Gramado e São Gonçalo Beira Rio. É que sem recursos para manutenção, a biblioteca enfrenta problemas de alagamento e infiltração. Ao longo dos anos, boa parte dos livros da biblioteca foi perdida, a instalação elétrica queimada, telhas danificadas, estantes enferrujadas e materiais de madeira apodrecidos, mesmo com o cuidado de lideranças comunitárias e zeladoras do espaço.
Além da revitalização, o projeto proposto pela produtora, advogada e pedagoga Andressa Mendes, contemplado em seleção pública da Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer (Secel-MT), irá viabilizar o registro audiovisual da história da biblioteca. Também prevê a realização de uma série de oficinas e atividades artísticas; ações que pretendem reviver memórias do local.
O edital, no entanto, não permite a compra de livros e outros bens materiais necessários para uma reforma completa do espaço. E para que a biblioteca retome de fato seu funcionamento regular, toda a estrutura que a envolve também merece atenção. Trata-se de um Centro de Cultura Popular, que além do espaço de leitura, já abrigou cozinha coletiva, rádio comunitária e até um espaço para reciclagem de resíduos.
Campanha de arrecadação
Por isso, os colaboradores do projeto deram início a uma campanha de arrecadação de livros para reabastecer a biblioteca. Pelo mesmo motivo, também aceitam doações de materiais de construção. “Com o recurso da Lei emergencial, vamos fazer a revitalização de todo o interior da biblioteca, com a restauração dos móveis que já existem ali, para receber os livros que já estão sendo arrecadados”, explica a arquiteta Ana Flávia Martins, responsável pela reforma.
A colaboradora se sensibilizou pela demanda do projeto e também quer trabalhar na reforma de todo o Centro de Cultura Popular.
“O espaço é bem legal para suprir as necessidades da comunidade, mas tem muitos problemas estruturais. Falta piso na parte interna dos ambientes que não têm forro, o que facilita a entrada de insetos e animais noturnos. Existe um problema de drenagem no terreno e a porta principal de acesso à biblioteca não tem contrapiso, ocasionando em alagamentos e riscos para os materiais. Portas e janelas estão muito antigas”, elenca a arquiteta.
“Enfim, a verba não supre todas essas necessidades e não prevê compra de materiais permanentes. Então também estamos buscando auxílios e doações para também entrar no campo estrutural da reforma”, complementa.
Para colaborar, basta entrar em contato pelo (65) 99680-1911 (WhatsApp). “Os apoiadores e apoiadoras contam pra gente quais livros e materiais querem doar e vamos buscar”, explica Andressa Mendes.
Centro de Cultura Popular
A Biblioteca Comunitária (BC) do Parque Geórgia está ativa no local que será revitalizado desde 2006, mas já (r)existe desde 2002. Primeiro, foi “instalada” junto a uma estrutura da caixa d’água da praça central do bairro, à época abandonada. Lá ficou durante cinco anos, mas precisou ser retirada por ordens do município.
Mas, antes disso, o Centro de Cultura Popular, que passou então a abrigar a biblioteca, já nascia de encontros entre movimentos comunitário e estudantil para atividades culturais, que começaram sem ter local fixo.
“A iniciativa nasce de um movimento conjunto entre um grupo de estudantes, que queriam realizar um trabalho de extensão de cunho popular, e moradores, que viam a necessidade de melhorar o seu bairro. A primeira atividade foi realizada embaixo de uma árvore onde hoje é avenida asfaltada. Limpamos o terreno, puxamos uma lona e fizemos ali uma comemoração do Dia das Crianças, todos juntos, estudantes e moradores”, relembra Cláudio, um dos responsáveis pelo Centro de Cultura Popular.
À época, os laços foram estreitados em oficinas de vídeo, vídeo-debate e na parceria entre a Associação de Moradores do Parque Geórgia e o coletivo Resistência Popular. Com o tempo, o CCP ganhou seus primeiros “contornos” em um barracão que sediava atividades aos domingos, dentre elas: café da manhã comunitário, aulas de música, atividades de arte-educação, leitura e outras práticas culturais.
Nos últimos anos, o centro cultural também abrigou projeto de capoeira e celebrações como o Dia da Consciência Negra. Em março do ano passado, passou a funcionar como posto de um comitê de solidariedade contra a covid-19 para recolhimento e doação de cestas básicas.
Arte-educação e desenvolvimento social
Em breve, o projeto também pretende retomar a tradição de arte-educação do Centro de Cultura Popular. A ideia é realizar cerca de 20 oficinas artísticas e itinerantes para crianças, adolescentes, jovens, mães e idosos, público majoritário do espaço. Ao fim, o registro da história do local será entregue em forma de documentário.
Para a proponente Andressa Mendes, a manutenção do local e a realização das atividades é a garantia de memória e continuidade da luta pelo acesso a bens culturais em Mato Grosso, especialmente em comunidades carentes.
“As bibliotecas comunitárias têm uma importância inquestionável para inclusão social, com a formação de leitores, espaço de estudo independente, criação de pertencimento social. A biblioteca do Centro de Cultura Popular faz parte da história de Cuiabá, uma iniciativa pioneira que se mantém mesmo contra todas as adversidades”, destaca ela.