O dinheiro fora enviado legalmente para o banco Clariden, em Zurique, e aparecia no balanço do Schahin.
A conta foi zerada pelos suíços, mas o Schahin não tomou nenhuma medida legal contra o banco para reaver o valor, segundo o relatório.
Ao ser questionado pelo BC sobre a omissão, o Schahin respondeu que se absteve de "tomar medidas formais de cobrança contra o Clariden".
À Folha o Schahin não negou o sumiço do dinheiro.
Uma das hipóteses investigadas pela polícia é que o recurso foi usado para pagar débitos do grupo no exterior ou empréstimo com o Clariden. Em qualquer caso, não há dúvida de que houve desvio, segundo três especialistas em crimes financeiros ouvidos pela reportagem.
O valor que evaporou equivalia a 68% do lucro fictício que o Banco Schahin registrou em 2010. Em abril do ano seguinte, o Schahin estava quebrado quando foi vendido para o BMG por R$ 230 milhões. Em 2012, o BMG descobriu que o rombo chegara a R$ 1,1 bilhão.
ONZE CRIMES
O sumiço dos R$ 156 milhões é um dos 11 possíveis crimes que o departamento de fiscalização do BC diz ter encontrado no Schahin.
Há maquiagem de balanço, transferência de créditos podres para empresa dos Schahin, empréstimos para outros negócios do grupo, o que é proibido pelo Banco Central, e geração de lucros artificiais em operações cruzadas com cinco bancos.
Todos os negócios supostamente irregulares visavam passar a impressão de que o banco estava saudável, e não quebrado, de acordo com os técnicos do BC.
A elevação artificial de resultado, de acordo com os documentos do BC, foi de R$ 325 milhões em 2009 e 2010.
Desde 2004, pelo menos, o BC tinha uma série de indícios de que o Schahin violava as normas de funcionamento dos bancos, como os empréstimos para empresas do próprio grupo.
O Banco Schahin foi criado em 1989 pelo grupo que atua nas áreas imobiliária, de engenharia e petróleo. Seu foco era o crédito para empresas médias e o financiamento de carros usados. Com a queda dos juros, carro usado tornou-se um péssimo negócio e arruinou o banco.
SIMULAÇÃO
Entre as simulações que o Schahin teria feito, o BC cita operações "de cessão de créditos cruzados" com outros bancos para aparentar que dava lucro -um simula emprestar para o outro, para dar a impressão de que tem mais recursos a receber. É o que se chama no mercado de "troca de chumbo".
O Schahin usou esse artifício em negócios com os bancos Panamericano, Mercantil do Brasil, ABC, Ficsa e Semear. Conseguiu com essas operações simular resultados positivos de R$ 99,5 milhões.
Com uma securitizadora da família, a Continental, o banco vendeu R$ 172 milhões em créditos difíceis de receber para evitar que tivesse que provisionar esse valor, "visando elevar artificialmente o resultado".
A operação era tão grosseira que o banco não repassava à securitizadora os valores que recebia.
OUTRO LADO
O grupo Schahin declarou em nota que o caso investigado pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal se tratava de uma operação de hedge [espécie de proteção de ativos contra possíveis perdas em flutuações cambiais] que foi liquidada com documentos que não eram do banco.
Assim, o Schahin afirma que continua contestando o suposto desaparecimento dos recursos, mas não informou em que órgão ou instância.
A operação, afirma a nota, havia sido contratada em 2006. De acordo com o banco, a operação não foi liquidada em seu vencimento, "tendo sido apresentados ao Banco Schahin, como justificativa para tanto, documentos que não haviam sido contratados pelo Banco Schahin e que foram consequentemente por ele contestados".
Os recursos da operação, de acordo com a nota, não foram pagos ao Schahin nem a nenhuma outra empresa do grupo.
O banco ABC diz que desconhece qualquer inquérito da PF sobre a instituição e que realiza a compra de carteiras de créditos seguindo a legislação. A assessoria do banco afirma que não poderia comentar a operação citada pelo BC por questões de sigilo bancário.
O Banco Bracce, nome atual do Lemon, diz que o BC solicita informações sobre suas operações com carteiras de crédito e "nada de irregular foi apurado, por tratar-se de operações tradicionais e muito comuns".
O Banco Ficsa afirmou que toda operação realizada pela instituição "é feita de forma legal e estritamente dentro da legislação vigente".
Disse também que não pode comentar a operação para não violar o sigilo bancário.
O Mercantil do Brasil (e sua financiadora) e o Banco Semear não se pronunciaram.
O advogado Antonio Claudio Mariz de Oliveira, que defende Rafael Paladino, ex-presidente do Panamericano, diz que não pode comentar a suspeita do BC porque defende ex-executivos do Schahin em outro processo.
Fonte: Folha de São Paulo