Como todo mundo essa semana, deixei para depois. Se os deputados e senadores podem, se Ministro da Agricultura pode, por que não poderia eu?
Ao contrário deles tenho algumas desvantagens. Um exemplo? Não tenho o povo para bancar minhas férias, feriados e dias enforcados. Também não rola quem garanta meu décimo terceiro, transporte, habitação, alimentação, viagens, diárias e aquele cartão corporativo básico. Fazer o quê? Fiz uma escolha e não me arrependo.
O que não me isenta de também querer deixar para depois em alguma hora. Não me sinto bem em não cumprir meu compromisso semanal pontualmente. Coisa que parece não incomodar outros elementos que, nesse momento, usufruem nababescamente da riqueza do pobre povo brasileiro.
Por ter algum senso de responsabilidade com meus leitores, na véspera do feriado rumei para a praia de Ipanema. Um belo dia do sol antecipava o clima e a lotação da (pouca) praia no dia seguinte.
No entardecer estendi a canga, puxei da bolsa a caneta e o sempre amigo caderninho. Respirei fundo, olhei o horizonte e… desviei a atenção para um plano que ainda não estava no meu arquivo de registros praianos. Um ponto de vista bem baixo, com muito contraluz, o recorte dos banhistas, suas atividades na areia, o vai e vem dos ambulantes. Fotos para testar o plano exato já que o sol de frente não deixa ver muito do que está na tela. Acerto no apoio da bolsa encaixada no caderninho fazendo a base para firmar o mais possível a imagem do vídeo e… voilá.
Está garantida a atualização das redes sociais até o fim da folga da Proclamação da República. Só falta… O básico. Cadê a crônica?
Momento meditação. Respirar fundo e jogar a isca. Pulando o lado lúdico, o alvo era a incrível história do professor de Duque de Caxias com meses de salário atrasado que está pedindo ajuda no sinal de trânsito para pagar as contas e… continuar ensinado! Parem o mundo, que eu quero descer. E comecei a escrever:
“Estamos nos últimos dias de Pompéia, sem direito a baile de despedida na corte…”
E aí acredite, caro leitor, a tinta da caneta a-ca-bou. Bateu aquela paz. Uma certeza que era melhor parar por ali para não fazer das páginas ainda virgens um mar de lamentações.
Larguei de mão. Me dediquei a fiscalizar o mar revolto e respirar a maresia de fim de tarde me despedindo da areia. Feliz em poder ceder o espaço, que – diga-se de passagem – anda reduzido. O movimento das marés “rapou” toda a areia do Arpoador e “mordeu” boa parte do areal de Ipanema. Nada me faria aparecer por ali no dia seguinte, pensava voltando pra casa e fazendo planos de encarar uma maratona criativa na frente do computador. No caminho agradeci o lindo cair da tarde, prenúncio que estava em sintonia com o universo.
Doce ilusão… Proclamei a República em 2017 sobre os, cá entre nós, pouco animadores sinais emanados pelo inusitado evento que me fez quebrar a palavra dada. Havia uma baleia encalhada em pleno feriado na praia de Ipanema!
Cogitei ignorar o fato, mas não deu. A baleia jubarte com mais de 20 toneladas já chegou morta. Trazida pelas correntes encalhou na altura da Teixeira de Melo. E ali passou o dia como uma atração plus (size). Num suave balanço sem achar o caminho do mar a cada leva de ondas que a alcançava. Havia mau cheiro, o corpo foi inchando. Para que não estourasse, fizeram alguns furos, liberando os gases. Tudo diante dos banhistas que acompanhavam as manobras do Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Guarda Municipal, Defesa Civil Municipal e Estadual, IMEA, Comlurb e o efetivo da Orla Rio.
Sintomáticas e proféticas as imagens. Prenúncio dos tempos que aí estão? Não fiquei para ver o resgate….
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa matéria faz parte da série “Arpoador” do SEM FIM… delcueto.wordpress.com