Política

Baixo financiamento trava educação em Cuiabá

Os indicadores de ensino evoluíram em Cuiabá nos últimos quatro anos, se considerados os números do Índice do Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no período 2011-2015.  Escolas municipais alcançaram a meta de 5,5 pontos na avaliação do Ministério da Educação (MEC) projetada para 2017, data da próxima rodada de avaliações. No entanto, a área enfrenta problema crônico de baixo financiamento, que pode piorar com a proposta de desvinculação de receita.

Na edição do ano passado, 43 das 49 escolas avaliadas pelo Prova Brasil tiveram aprovação acima da meta, na aprendizagem de português e matemática. A prova serve de base para ponderações do Ideb. Na avaliação de português, 37% dos alunos do 5º ano avaliados (1.093 de 3.004) demonstraram ter aprendizagem adequada da disciplina. A média cai na avaliação de estudantes do 9º ano para 21% (841 de 3.004).

Na avaliação de questões matemáticas, a avaliação de Cuiabá não constatou nem crescimento, nem melhorias animadoras. Somente 28% dos alunos do 5º ano testados demonstraram ter domínio de operações básicas da matemática; dentre os alunos do 9º ano houve o resultado pífio de 7% de aprovados.

Se os números da capital forem comparados com os de outros municípios, há grande distância para Cuiabá alcançar patamar de melhor qualidade. Em Ipiranga do Norte (470 km de Cuiabá), o Ideb identificou nível de excelência na educação municipal, proporcionalmente às médias – considerando que a quantidade de alunos avaliados é bem menor. A cidade teve aprovação de 59% dos 84 alunos que fizeram a Prova Brasil.

Os dados de Cuiabá são sintomáticos de um problema que o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública em Cuiabá (Sintep Cuiabá), João Custódio da Silva, chama de falta de percepção administrativa. Segundo ele, o ensino está na base estrutura social, passando por vários pontos, que vão de educação ambiental à consciência política.

“Quando você melhora a educação, você melhora todos os ambientes. Evitar jogar lixo na rua, saber se prevenir contra o mosquito da dengue; tudo passa pela educação, e é isso que nossos gestores ainda não entenderam”, comenta.

Apesar dos avanços na educação municipal, o professor afirma que o status de Cuiabá está atrasado por falta de investimentos, que dificulta o trabalho diário em escolas, de dispositivos de trabalho dentro da sala de aula, a atividades extracurriculares. “Se houve avanço no Ideb, isso foi por causa do esforço grande dos professores em contribuir para a mudança. O investimento que hoje é feito na educação de Cuiabá é muito baixo, cumpre a meta estabelecida pela Constituição, de 25% do orçamento, mas não dá conta do que é necessário fazer”, explica.

Custódio critica a paralisia de reajuste orçamentário que começa a afetar Cuiabá devido à crise econômica e que vai gerar efeitos por estagnação de financiamento e aumento da demanda. “Hoje, 28,5% do orçamento de Cuiabá são destinados para a educação, mas deveria ser 29,5%, isso porque em 2012 foi promulgada uma lei que aumenta anualmente o percentual orçamentário destinado à educação. Mas devido à crise econômica, esse reajuste foi suspenso. Entendemos que existem outras demandas do município, mas é preciso dizer que isso é questão de prioridade. Falta investimento. Você não melhora educação se não tiver investimento”, ressalta.

Atendimento em creche e em período integral estão em lentidão

 A reforma de infraestrutura das escolas é um dos pontos nos quais é necessária a aplicação de recursos. Segundo a Secretaria Municipal de Educação 15 de 91 escolas, urbanas e rurais, foram reformadas nos últimos três anos.

“São escolas que tiveram reforma de tudo, do telhado à parte elétrica; de encanamento sanitário à troca de mobiliário em sala de aula, diretoria, etc. Nós percebemos que, além de um prédio novo, os alunos precisam de um ambiente novo para ficarem, com condição de trabalharem atividades lúdicas para o desenvolvimento intelectual”, diz a secretária Marioneide  Angélica Kliemaschwesk.

A secretária diz que algumas escolas também passaram por reformas parciais, como  manutenção em telhados, rede sanitária e ampliação das atividades curriculares. Diz ainda que Cuiabá também ampliou a rede de atendimento infantil com a construção de 14 Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs).

“Na ampliação de atendimento em creche tivemos um incremento e passamos a atender 36,8% da população nessa faixa etária, de 0 a 5 anos. Um grande programa de modernização e infraestrutura foi realizado com pauta em três eixos: ampliação da rede de atendimento, reformas e transformação das redes educacionais. Isso nos fez cumprir duas grandes metas para  a universalização do atendimento infantil de 4 e 5 anos”.

No entanto, essa proporção deve encolher a partir do próximo ano com a aprovação de novo limite de idade para aceitação de crianças em creches e instituições de atividades infantis públicas. Em julho deste ano, a idade limite para matrícula de crianças passou a integrar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O documento ainda estabelecia a idade de 6 anos para esta etapa do ensino.  Antes disso, em janeiro, o MEC tornou obrigatória a matrícula de crianças seria obrigatória a partir dos 4 anos.

Cuiabá deverá aumentar a proporção de cobertura de crianças em faixa etária de pré-escolaridade para 50% até 2022.

Já o presidente do Sintep Cuiabá vê demora na aplicação de medidas para impulsionar a educação pública na capital. “Em Cuiabá houve evolução, se você olhar os resultados do Ideb de 2011, 2013 e 2015, você vai observar que as escolas, com um esforço grande dos profissionais, conseguiram melhorar. Mas nossas escolas, salvo raras exceções, continuam com a mesma estrutura. Há no mínimo 50 escolas que precisam ser melhoradas, reformadas em seu conjunto”.

Secretária reconhece que baixo orçamento impossibilita investimentos

A secretária Marioneide Angélica Kliemaschwesk reconhece que o baixo orçamento impossibilita a efetivação de trabalho em educação em Cuiabá. Segundo ela, o orçamento disponível para este ano é de R$ 176 milhões, montante que deve ser distribuído para a construção de novas escolas, folha de pagamento e serviços de manutenção da secretaria. Ela cita como exemplo a aplicação de recursos próprios do município para a construção de escolas e CMEI.

“Além dos 14 CMEIs, nós construímos seis escolas em Cuiabá em três anos de gestão, e uma delas foi totalmente construída com recurso próprio do Tesouro Municipal. Imagina você que só com servidores em escolas temos hoje um quadro de 9.205 funcionários, entre técnicos e professores. A manutenção de um CMEI é de R$ 2,2 milhões por ano, a folha de pagamento é de R$ 27 milhões por mês. Não sobra dinheiro para implementar a educação”.

As atividades de educação em tempo integral estão dentre as afetadas com a insuficiência da receita. O projeto era executado em Cuiabá por meio do programa Mais Educação do governo federal. No entanto, os repasses foram suspensos em 2014, como ação para contenção de gastos devido à crise econômica. No ano passado, algumas atividades do projeto ainda foram executadas com resíduos de receita de anos anteriores e com contrapartida do município. Atualmente, porém, apenas as creches fazem atendimento em dois turnos.

“Trabalhamos agora apenas com atividades contra turno, o aluno com aula pela manhã vem à tarde para participar de oficinas de música, esportes, informática. Aqueles que estudam pela tarde vêm de manhã para participar das ações. É o que o município consegue fazer com o orçamento de hoje. Mas não é educação integral porque o aluno vai para casa almoçar”, diz a secretaria.

O presidente do Sintep Cuiabá, João Custódio da Silva, diz que a aplicação de grade curricular em tempo integral é o caminho mais promissor para o desenvolvimento escolar do País. No entanto, o projeto precisa ser trabalhado com a administração escolar e professores e pensado para explorar o desenvolvimento intelectual de crianças e adolescentes.

 “A escola integral é nossa defesa, uma escola organizada para manter os alunos na escola. Hoje, nós não temos nenhuma escola de tempo integral. Havia o projeto Mais Escola, do governo federal, que foi cortado por causa da crise, da contenção de despesas. Isso passa pela valorização, pela prioridade de cada governo”.

“Nós temos em Cuiabá duas escolas que estão se planejando para o ensino fundamental – a escola Antônio Epaminondas e a José de Mesquita – mas não teve planejamento adequado, junto com os profissionais, com o objetivo de preparar os profissionais para lidar com o trabalho de tempo integral. Um preparativo para um novo ambiente, mas foi mudado em 10, 15 dias.”

Creche faz rearranjo de verba para cobrir gastos

O aperto orçamentário aparece, por exemplo, na administração da creche São Sebastião, em Cuiabá. A auxiliar administrativa Solange de Andrea diz que a creche é gerenciada por meio de redirecionamento de verbas, por causa de atrasos em repasses e o baixo valor recebido.

“Nós temos quatro repasses de verbas, que chegam a atrasar até três meses. Para não deixar faltar os materiais necessários na creche, trabalhamos com redirecionamento de dinheiro, pegamos dinheiro de algum lugar para colocar em outro, e quando o dinheiro que estava faltando chega, fazemos a reposição. É como na administração de casa mesmo; é preciso controlar de perto a situação, senão se passa dificuldades”, conta.

Isso significa que o enfoque para aplicação dos recursos passa pela avaliação da prioridade de atendimento da instituição. “Se nos limitássemos ao recurso que recebemos para as áreas específicas, teríamos falta de material de limpeza a material usado em sala de aula pelos professores. Vivemos com orçamento apertado, porque o dinheiro já chega comprometido para cobrir um buraco. Temos uma sala aqui cujo teto cedeu e temos medo de que a qualquer hora caia, então a gente tira as crianças de lá”, diz Solange.

Leia também: Mendes terminará mandato sem cumprir plano de governo

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Reinaldo Fernandes

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