Auditoria realizada pela 5ª Secretaria de Controle Externo (Secex) do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT) nos equipamentos eletrônicos de fiscalização de trânsito de Cuiabá indicou que a Prefeitura pagou pelo serviço mesmo quando os equipamentos ficaram sem funcionar por vários meses. Com isso, o possível prejuízo aos cofres públicos foi calculado pela equipe técnica da Corte de Contas em mais de R$ 42,6 mil referentes ao pagamento indevido à Serget Construções e Serviços de Trânsito Ltda, do Consórcio CMT – Cuiabá Monitoramento de Trânsito, responsável pelo fornecimento, instalação, manutenção, operação e apoio para todos os equipamentos eletrônicos instalados na Capital.
Segundo o secretário da 5ª Secex, Francisney Liberato, o relatório da auditoria, com a defesa da Secretaria de Mobilidade Urbana (Semob), conforme prevê a Lei de Acesso à Informação (LAI). O processo foi encaminhado para parecer do Ministério Público de Contas (MPC) e, na sequência, será incluído na pauta de julgamentos do Tribunal Pleno do Tribunal de Contas. A 5ª Secex está sob a responsabilidade do conselheiro interino João Batista Camargo.
A auditoria apontou que entre os dias 1º de março de 2016 e 3 de junho de 2016, 125 dias no total, o radar localizado na Avenida Rubens de Mendonca (CPA), próximo ao Ibama, ficou fora de operação. Outro equipamento que deixou de registrar infrações, por 144 dias, foi o radar localizado na Avenida Miguel Sutil, próximo ao Viaduto do Verdão – em frente ao posto BR Pensilvânia (nos dois sentidos). Ainda assim, não houve desconto por parte da Semob no momento de efetuar o pagamento à empresa.
A apuração também percebeu inconsistências nos registros contábeis da Semob e do Fiplan sobre os valores arrecadados com as multas. A diferença chega a R$ 627.398,25 a menor no sistema contábil da Semob, de janeiro a agosto de 2016, o que sugere risco quanto à confiabilidade dos dados. No período analisado foram consideradas cinco infrações, sendo elas: parar sobre a faixa de pedestres na mudanca de sinal, avançar o sinal vermelho do semáforo, transitar em velocidade superior à máxima permitida em até 20%, transitar em velocidade superior à máxima em mais de 20% até 50%, e transitar em velocidade superior à maxima permitida em mais de 50%.
O contrato entre a Semob, o Fundo Municipal de Trânsito e Transporte Urbano (FMTTUR) e a empresa prestadora de serviço, começou a ser auditado ano passado, após denúncia de uma suposta 'indústria da multa' na Capital. O contrato tem duração de 48 meses e valor previsto de R$ 39,8 milhões.
Além de ser o mais relevante da Semob em termos de custo, o contrato também é a principal fonte de receita do FMTTUR. Até agosto de 2016, dos R$ 27.237.687,13 arrecadados, R$ 17.117.166,21 foram provenientes de multas de fiscalização eletrônica, o equivalente a 70,62% da receita do Fundo. Até a data de recorte da auditoria, foram pagos para o Consórcio CMT – Cuiaba Monitoramento de Trânsito Ltda R$ 4.697.417,90.
A auditoria foi realizada por amostragem e apenas nos equipamentos responsáveis por gerar as multas eletrônicas de trânsito, como lombadas eletrônicas, radares fixos e os semáforos que registram velocidade e avanço dos veículos no sinal luminoso. O objetivo foi verificar se a execução do contrato estava sendo acompanhada pelo Executivo. Após nova denúncia, o escopo da auditoria foi ampliado e passaram a ser analisados também os serviços prestados pela Junta Administrativa de Recursos de Infração (Jari).
Julgamento dos Recursos
Quanto aos recursos, foram analisados casos com maior número de recursos na Junta e, entre as irregularidades verificadas pelos auditores do TCE-MT, estava a falta de fundamento para deferir ou indeferir as defesas de autuações do trânsito, como prevê o Código de Trânsito Brasileiro e as resoluções do Contran. De acordo com os autos, tanto nos deferimentos quanto nos indeferimentos dos recursos, entre 2014 e 2016, não há um relatório, ainda que sintético, das razões que levaram àquela decisão, e nem identificação de quem, em tese, analisou o processo.
Outras irregularidades graves foram a falta de distribuição alternada dos recursos entre os membros da Jari, demanda reprimida de recursos e não observação da ordem cronológica para julgamento das defesas das autuações.
Consta dos autos que muitas vezes os recursos eram agrupados por placa e entregues a determinado membro para atuar como relator, o que na avaliação dos auditores pode resultar em pessoalidade na hora de decidir.
Quanto à demanda reprimida, o problema é que a Semob conta com apenas uma Jari, o que tem provocado um alto número de recursos pendentes de análise, totalizando 18.036, sendo 4.792 de 2015 e 13.244 de 2016, o que impede o cumprimento do que prevê o CTB, que estabelece prazo de 30 dias para a Jari julgar recursos interpostos.
Sobre a ordem cronológica, alguns números chamaram a atenção dos auditores. Dos recursos analisados em prazo inferior a 10 dias, oito foram deferidos, sendo que quatro eram de um membro da Jari e quatro de um ex-vereador por Cuiabá, de vários mandatos. Inclusive um dos recursos foi julgado no mesmo dia em que deu entrada. Entre os recursos analisados em prazo inferior a 30 dias, tanto em 2015 quanto em 2016, sete são de um ex-secretário municipal e foram todos deferidos.
“Isso pode gerar descrédito ao sistema de autuações de trânsito de Cuiabá, em face de não observar o princípio da impessoalidade, princípio norteador da administração pública, previsto na Constituição da República”, descreve trecho do relatório.