Cidades

Alta vulnerabilidade social em Mato Grosso

O Índice de Vulnerabilidade Social (IVS), construído a partir de indicadores do Atlas do Desenvolvimento Humano (ADH) no Brasil, procura destacar diferentes situações indicativas de exclusão e vulnerabilidade social no território brasileiro, numa perspectiva que vai além da identificação da pobreza entendida apenas como insuficiência de recursos monetários. Mato Grosso, unidade federativa considerada “o celeiro do mundo”, ainda apresenta cidades que detêm “alta vulnerabilidade social”.

Publicado em 2015, a metodologia do Atlas de Vulnerabilidade Social, produzida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), estabelece cinco indicadores para denominar a situação econômica e social dos municípios brasileiros: muito baixa vulnerabilidade – onde encontram-se regiões que apresentam bons índices de desenvolvimento -, baixa, média, alta e muito alta, utilizada nos casos em que as pessoas residentes possuem uma qualidade de vida ameaçada por serviços básicos deficientes, como o saneamento, além de trabalharem em subempregos.

Apesar de a região Centro-Oeste apresentar 48,5% de seus municípios no grupo de baixa vulnerabilidade social – apenas um degrau abaixo da classificação muito baixa, segundo o IPEA – nove municípios mato-grossenses encontram-se em alta vulnerabilidade social. O caso mais grave, entretanto, é de Santo Antônio do Leverger, na baixada cuiabana, um dos únicos entre os três municípios de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal que ostenta a classificação muito alta vulnerabilidade social.

Nas demais faixas, vinte e dois municípios apresentam muito baixa vulnerabilidade social, sendo dezesseis deles do estado de Goiás, quatro de Mato Grosso e dois em Mato Grosso do Sul, que também possui em seu território as duas outras cidades que, ao lado de Santo Antônio do Leverger, encontram-se em muito alta vulnerabilidade social: Japorã e Tacuru. Os outros 181 municípios, ou 38,8% da região Centro-Oeste, estão na faixa de média vulnerabilidade social.

As capitais de todas as unidades federativas regionais – Cuiabá, Campo Grande, Goiânia e Brasília -, incluem-se na categoria baixa vulnerabilidade social, de acordo com o estudo do IPEA.

No restante do Brasil, a região Sul é a que apresenta a maior quantidade de municípios na faixa de muito baixa vulnerabilidade social, com 341 localidades, ou 28,7%. Santa Catarina tem 44,4% dos municípios nessa classificação, o Rio Grande do Sul tem 30,2%, e o Paraná 15,3%. Na região Nordeste, 80,1% das cidades se encontram entre alta ou muito alta vulnerabilidade social. Os estados de Alagoas e Maranhão são os campeões nessas duas faixas, com 96,1% e 95,4%, respectivamente.

“Mato Grosso é um Estado rico com saúde pública precária”

Para o professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), e tutor do Programa “Mais Médicos” no Estado, Reinaldo Gaspar da Mota, a questão da desigualdade e vulnerabilidade social mato-grossense “é bastante acirrada com muitas implicações para a saúde pública”. Segundo ele, as dificuldades estruturais enfrentadas pelo poder público, com consequências inevitáveis à população mais carente, ocorrem tanto na capital quanto no interior, e que o poder executivo segue uma “lógica privatizante” inclusive em relação à saúde.

“Possuímos altos índices de mortalidade infantil e uma série de patologias, como tuberculose e hanseníase, que já deveriam estar superadas e que ainda atingem a população menos favorecida. Mato Grosso enfrenta a privatização da saúde pública”, conta. Nesse sentido, as Organizações Sociais de Saúde (OSS’s), modelo de gestão onde empresas privadas controlam parte da saúde pública no Estado, sempre estiveram no alvo dessa polêmica.

Criada pelo então secretário de saúde Pedro Henry, na gestão Silval Barbosa (PMDB), em 2011, as OSS’s sempre foram percebidas com desconfiança pela população e pelos prefeitos das cidades mato-grossenses, que se queixam de que o Governo do Estado repassa subsídios para as empresas que gerem as unidades assistenciais, numa espécie de serviço terceirizado, mas que não transferem os recursos para os gestores utilizarem, sobretudo na atenção básica, responsabilidade dos municípios.

Para o docente da UFMT, o sucateamento do Sistema Único de Saúde (SUS) deve-se também a interesses privados dos gestores públicos.

“Mato Grosso é um Estado rico com saúde pública precária. O SUS é conduzido pelo gestor público que tem interesses privados, perpetuando a desigualdade social”.

Trabalho escravo persiste em Mato Grosso

O trabalho em regime análogo ao da escravidão, que mantém sob um regime desumano trabalhadores endividados com o próprio empregador, vivendo e exercendo sua profissão sem condições adequadas de saneamento ou moradia, é uma mancha difícil de ser limpa em Mato Grosso.

Dados da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (DETRAE), do Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS), revelam que Mato Grosso foi o campeão de operações de fiscalização do grupo em 2015, com 28 ocorrências. Segundo o levantamento, 45 estabelecimentos foram inspecionados no Estado e 44 trabalhadores em regime análogo ao da escravidão foram encontrados, gerando uma indenização de R$ 122.275,75 no ano passado.

Em segundo lugar, Rio de Janeiro e Minas Gerais contaram com 21 operações cada em 2015, quando foram inspecionados 80 estabelecimentos nas duas unidades federativas. Acre e Roraima foram os Estados com menos ocorrências, com uma operação cada.

O Procurador do Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso (MPT-MT), Thiago Gurjão Alves Ribeiro, afirma que o Estado está “tanto na origem quanto na solução do problema do trabalho escravo contemporâneo”. E que a prática “infelizmente faz parte da nossa história”.

Educação foi vítima de fraude milionária

O Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) continua em diligências dos fatos investigados na "Operação Rêmora". Na última terça-feira (03) foram cumpridos três mandados de prisão preventiva, 08 conduções coercitivas e 19 mandados de busca e apreensão. A ação do grupo culminou no pedido de demissão do ex-secretário de Estado de Educação (SEDUC-MT), Permínio Pinto.

O esquema, que movimentou R$ 56 milhões, contava com informações privilegiadas de licitações envolvendo empresários e agentes públicos.

De acordo com o Gaeco, a organização criminosa era dividida em três núcleos. Até o momento, já foram identificadas 29 pessoas com participação direta no esquema. Os agentes públicos envolvidos são Fábio Frigeri, Wander Luiz dos Reis e Moises Dias da Silva. Já o Núcleo de Operações contava com a participação de Luiz Fernando Costa Rondon, Leonardo Guimarães Rodrigues e Giovane Guizardi.

A corrupção costuma prejudicar os serviços básicos do poder público, como a educação. Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso, Henrique Alves, a principal demanda hoje no Estado é a melhora do ensino médio. Segundo ele, o Estado conta com excesso de profissionais contratados, que não são qualificados para exercer a prática pedagógica.

“A corrupção e a falta de investimentos acarreta um problema crônico na educação pública de Mato G              rosso, sobretudo o ensino médio. A maioria desses profissionais possuem vínculos temporários, e esses contratados não possuem habilitação”.

Mato Grosso é o 5º colocado em violência contra a mulher

No período de 2004 a 2014, 18 estados apresentaram taxa de mortalidade por homicídio de  mulheres acima da média nacional, que é de 4,6 mortes. Dentre todas as unidades federativas, Mato Grosso ocupa a quinta colocação, com sete mortes de mulheres a cada grupo de 100 mil habitantes. As informações são do Atlas da Violência 2016, estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

De acordo com o levantamento, que cruzou os dados obtidos com a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, de um total de 52.957 denunciantes de violência, 77% afirmaram ser vítimas semanais de agressões, e em 80% dos casos o agressor tinha vínculo afetivo com a vítima (marido, namorado, ex-companheiro). O estudo revela que 80% das vítimas tinham filhos, e que 64% deles presenciaram as cenas de violência.

Para o doutor em Sociologia e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Naldson Ramos da Costa, é responsabilidade do Estado garantir os direitos do cidadão, entre eles, a segurança. Segundo ele, quem mais precisa desses serviços são as pessoas que se encontram em vulnerabilidade social, principalmente nas periferias, e que ela só será efetiva se contar com ações integradas de outras políticas públicas.

“Uma política de segurança pública voltada para atender a população que mais precisa deveria se basear na prevenção, num setor de inteligência aparelhado, integrado, ainda, com outras ações e políticas públicas de promoção à cidadania”.

Existe favela em Cuiabá?

O título que também funciona como provocação, me faz lembrar de uma aula na universidade em que discutíamos a pauta da desigualdade social em trabalhos jornalísticos. A certa altura, um dos colegas de classe afirmou: “mas se as casas são feitas de tijolos não é favela”. O professor, ponderando por alguns segundos, retrucou: “Uma favela do ponto de vista arquitetônico e urbanístico ou da perspectiva socioeconômica?”

O ensinamento ainda ressoava a caminho do Parque Georgia, na região do Coxipó, em Cuiabá. O difícil acesso às moradias, com muitas minas de água brotando aqui e ali, dificultava o acesso do carro da empresa, nos obrigando a encarar a lama e alguns pedaços de pau improvisados que serviam como apoio para os pés, sobre a água. Mais à frente, na ensolarada tarde cuiabana, crianças brincavam descalças, quase sem roupa, na rua de terra ao lado de dezenas de moradias feitas com tapumes e compensados.

 “Uma favela não só do ponto de vista arquitetônico e urbanístico, mas também sob a perspectiva socioeconômica”, diria o colega estudante, ou meu antigo professor.

Logo que a equipe do Circuito Mato Grosso chegou, avistamos uma mulher estendendo roupas no quintal de sua casa. Quitéria da Conceição cria, sozinha, sete filhos e uma neta. Nascida em Pernambuco, passou boa parte da vida em São Paulo, mas teve que se mudar para o Parque Georgia em busca de um espaço próprio para ela e as crianças, pois morava na casa da irmã, na capital paulista.

“Falta bastante água, e quando chove alaga tudo. Assim que anoitece, fica uma escuridão total, pois aqui não tem poste”, afirma, apontando para a rua sem iluminação pública.

A poucos metros dali, encontramos Ana Maria Isidora, de 60 anos. Aposentada, a dona de casa cria, sozinha, oito netos. “As crianças sou eu quem cria. Prefiro trazer para minha casa do que deixar largado”, diz. Morando na casa da filha, em virtude do alagamento da última chuva, que também atingiu sua residência, ela diz com orgulho que foi uma das fundadoras do bairro, contando que no Parque Georgia “é um vizinho pelo outro“.

“Aqui se cai um doente os outros já se ajeitam para levar para o hospital e cuidar das crianças. Queria trabalhar num serviço, mas tenho um problema na perna que não me deixa ficar muito tempo de pé”, diz.

Educação, saúde, trabalho e segurança. Quatro itens indispensáveis para a qualidade de vida de qualquer um na sociedade. Mas quando presenciamos o discurso hipócrita daqueles que nasceram em berço de ouro, e que se recusam a partilhar parte da sua riqueza com o resto das pessoas, seja na política ou na atuação empresarial, conseguimos mensurar o potencial que poderia ser atingido se não tivéssemos nunca mais que conviver com crianças descalças e quase nuas, brincando na lama e em poças de água podre. Initially, empire market links was released only with Litecoin (LTC) given that repayment way, but as of this moment they’ve support that is incorporated Bitcoin together with Monero!

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Diego Fredericci

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