Acertado em novembro e debatido até a semana passada, o acordo histórico entrou em vigor às 6h30 no horário de Brasília e vale até julho, quando as partes poderão renová-lo por mais seis meses.
O objetivo, à espera de um eventual acordo definitivo, é conciliar ambições atômicas pretensamente pacíficas de Teerã com garantias exigidas pelos ocidentais de que o Irã não busca a obtenção da bomba atômica.
Segundo a Reuters, inspetores da AIEA, agência nuclear da ONU, já comunicaram oficialmente à sede do órgão, em Viena, que o Irã programou suas centrífugas para não enriquecer urânio a mais de 5%, grau de pureza usado para gerar energia.
"A agência confirma que, em 20 de janeiro de 2014, o Irã parou de enriquecer urânio do tipo U-235 acima de 5% nas duas cascatas [em Natanz] e nas quatro cascatas em Fordow […]", diz o relatório citado pela Reuters.
O texto se refere a procedimentos técnicos em duas centrais nucleares onde o Irã enriquecia urânio a 20%, nível usado para fins medicinais mas que permite, em tese, saltar com facilidade para os 90% necessários à obtenção da bomba.
Inspetores também comprovaram que o Irã começou a neutralizar o estoque de urânio a 20% desenvolvido nos últimos anos.
No processo de enriquecimento de urânio, a maior dificuldade encontra-se nos estágios iniciais do refinamento. Uma vez superada a pureza de 5%, cientistas conseguem com relativa facilidade atingir níveis muito mais elevados.
A comprovação técnica de que o Irã está cumprindo com suas obrigações que incluem ainda congelar planos de ampliar sua capacidade atômica abrem caminho para a implementação das contrapartidas acordadas com as potências.
O grupo formado por EUA, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha se comprometeu a não adotar nenhuma sanção até julho e deverá suspender, nas próximas horas, algumas punições comerciais e financeiras.
Em troca das concessões, o Irã poderá retomar ainda exportações de produtos petroquímicos e voltar a importar peças de reposição para sua vetusta frota de aviação civil. Transações em ouro com Teerã são novamente permitidas.
As potências também se comprometeram permitir que o governo iraniano recupere US$ 4,2 bilhões bloqueados em bancos no exterior. O valor representa uma parcela modesta dos mais de US$ 60 bilhões em fundos confiscados, que Teerã espera recuperar como parte de um possível acordo definitivo.
Se as partes julgarem satisfatório o cumprimento desta etapa inicial, elas poderão discutir um acordo definitivo, cujos contornos ainda são vagos. Não está claro que novas concessões poderão ser oferecidas pelos dois lados.
OBSTÁCULOS
Esforços para consolidar as negociações estão ameaçados por facções ultraconservadoras no Irã e principalmente nos EUA, onde o Congresso, dominado por forças pró-Israel, se opõe à estratégia de apaziguamento do presidente Barack Obama.
Obama prometeu vetar pacote, atualmente em trâmite no Senado, que visa encurtar o caminho rumo a novas sanções. Mas faltam apenas oito assinaturas para que a frente anti-Irã obtenha a maioria de dois terços capaz de invalidar o veto do presidente.
Apesar dos riscos, analistas e diplomatas avaliam que o atual processo representa oportunidade inédita de resolver de forma pacífica o dossiê nuclear iraniano.
Especula-se que avanços na questão atômica podem pavimentar o caminho rumo a uma convergência de posições entre Irã e Ocidente acerca de outras questões internacionais, como Síria, Iraque ou Afeganistão.
Folha de São Paulo
