O Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso acolheu por maioria neste mês de agosto uma proposição de unificação das entrâncias que organizam as comarcas no estado, o que causou alguma discussão sobre a legalidade e constitucionalidade dessa deliberação entre os seus membros. E agora será encaminhada à Assembleia Legislativa um projeto de lei visando a alteração do código de organização judiciária para sua efetiva implementação.
A constituição federal no seu art. 93 e incisos, define que lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados como básicos os seguintes princípios: que o ingresso e movimentação na carreira que o cargo inicial será o de juiz substituto, que a promoção será de entrância para entrância, alternadamente, por antiguidade e merecimento, e que o acesso aos tribunais de segundo grau far-se-á por antiguidade e merecimento, alternadamente, apurados na última ou única entrância.
O Estatuto da Magistratura até hoje não foi levado a apreciação do Congresso Nacional pelo Supremo Tribunal Federal, estando em pleno vigor a Lei Complementar Federal 35/1979, mais conhecida como Lei Orgânica da Magistratura Nacional, para definir a organização judiciária dos juízos e tribunais do nosso país, com os contornos jurisprudenciais dados pelo Pretório Excelso sobre a constitucionalidade de alguns de seus dispositivos.
Entrância no nosso vernáculo pode ser definida como o fato ou condição de ser entrante, de ingressar ou principiar. Já no caso da organização judiciária, a entrância corresponde ao agrupamento em classificação das comarcas na movimentação horizontal da carreira dos magistrados e a comarca corresponde ao território onde o juiz exerce sua jurisdição (poder de dizer o direito ao caso concreto), onde decida as causas que chegam ao seu conhecimento pelas regras processuais.
Assim, de acordo com o número de habitantes e de eleitores, do movimento forense e da extensão territorial dos municípios do estado, entre outros aspectos, as comarcas podem ter um juiz ou vários juízes, com uma ou mais varas. E podem ser classificadas como de primeira, segunda ou terceira entrância, ou de entrância especial, sendo de se ressalvar que inexiste hierarquia entre as entrâncias, ou seja, uma entrância não está subordinada a outra.
Mas, o que fez o Tribunal de Justiça de Mato Grosso com a sua decisão? Simplesmente entendeu por usar de sua iniciativa legislativa para unificar as entrâncias existentes – inicial, intermediária e final – em única entrância redefinindo a carreira da magistratura. Assim o fazendo, entendeu o sodalício ser a medida mais benéfica para a organização judiciária, fazendo com que todos os juízes de direito estejam agora no mesmo plano de movimentação horizontal da carreira e que recebam o mesmo valor de subsídio. A partir da aprovação da lei magistrados das entrâncias inferiores que foram unificadas vão receber o mesmo valor do subsídio dos seus colegas que estavam na entrância especial ou final.
Por outro lado, a unificação ocorrida também possibilitará o aumento da quinta parte da lista de magistrados que possam concorrer as vagas de desembargadores no Tribunal de Justiça pelo critério de merecimento. Assim sendo, os juízes mais antigos que estiverem dentro dos vinte por cento do número juízes que comporão a entrância única poderão se candidatar a concorrer ao acesso ao Tribunal de Justiça por merecimento, aumentando o plantel de candidatos.
Finalizando, registra-se que a unificação ocorrida parece ser uma nova tendência de organização judiciária, pois no Estado do Rio de Janeiro a unificação das entrâncias ocorreu no ano passado, quando o governador Cláudio Castro sancionou a Lei 9.842/2022, ressalvando que não haverá aumento de despesas com a medida, e a partir da publicação da citada lei as 81 comarcas fluminenses foram classificadas como comarcas de entrância única, sendo a carreira da magistratura, em primeiro grau de jurisdição, composta por juízes substitutos, na classe inicial, e juízes de Direito, na classe final.