O Supremo Tribunal Federal vai analisar uma questão de ordem no processo que ficou alcunhado de “revisão da vida toda”, onde é discutida no recurso extraordinário a possibilidade de considerar todas as contribuições previdenciárias que o segurado tenha feito em sua vida profissional, incluindo as anteriores a julho de 1994, conforme a Lei 9.876/1999.
O ministro Nunes Marques, que substituiu o ministro Marco Aurélio na Corte, pediu destaque com base na Resolução/STF nº 642, de 14 de junho de 2019, que traz no art. 4º., inciso I, a hipótese de não serem julgados em ambiente virtual as listas ou os processos com pedido de destaque feito por qualquer ministro, reiniciando-se novamente o julgamento.
Houve a apresentação de uma questão de ordem, pedindo que o voto do ministro aposentado Marco Aurélio, então relator, fosse mantido no julgamento e agora a questão será resolvida durante sessão de julgamento que ainda não tem data definida.
O questionamento sobre esse pedido de destaque, afirmando sua impossibilidade, tem fundamento no § 1º, do art. 941, do CPC. Por esse artigo e parágrafo, nas sessões de julgamento nos tribunais os votos somente poderiam ser alterados até o momento da proclamação do resultado pelo presidente do colegiado, 'salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído'.
Assim sendo, entendem alguns que, se um ministro já proferiu seu voto no colegiado virtual ou no colegiado presencial, vindo a se aposentar posteriormente, o seu voto, por força do § 1º, do art. 941, do CPC, não pode mais ser alterado se o julgamento for reiniciado por pedido de destaque. Em outras palavras, ocorreria a perpetuação da jurisdição, do direito dito, do magistrado anterior no colegado.
Isso porque o § 2º, do art. 4º, da Resolução/STF nº 642, de 14 de junho de 2019, não tem força de lei, porque não faria parte do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, apesar de tratar de matéria processual, razão pela qual deve ser interpretado em estrita observância ao § 1º, do art. 941, do CPC. Essa a defesa jurídica sintética da impossibilidade.
O raciocínio é bastante razoável, no entanto, como ficaria a situação plenamente possível de acontecer, relativa ao art. 493, do CPC? Por esse artigo está definido no Código de Ritos Civis que, se depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. E então? Não se cumpre essa regra? Que tem igual peso e hierarquia como lei ordinária tanto quanto a do § 1º, do art. 941, do CPC.
E por fim. Como interpretar essa limitação do julgador substituto, se a decisão colegiada ainda não se findou? Como ficaria essa regra? Se afastaria simplesmente o substituto legal de apreciar o fato com base no art. 493, do CPC? Se perpetuaria a jurisdição do magistrado substituído? Pode não ser esse o caso da “revisão da vida toda”, mas é uma outra situação jurídico-processual que eventualmente poderá chegar a consideração dos ministros, porquanto é bem plausível que ocorra em razão da fenomenologia dos processos.
Agora é esperar para ver como se posicionará o Supremo Tribunal Federal sobre a temática, lembrando-se sempre que, no nosso sistema jurídico, aprecie-se, ou não, ocorre o fenômeno contramajoritário, e a Corte Excelsa, de forma certa ou errada na opinião de alguns, terá sempre a última palavra.
Antonio Horácio da Silva Neto é advogado, iniciou sua carreira jurídica como promotor de justiça do Ministério Público do Estado de Rondônia. Ingressou na magistratura no estado de Mato Grosso, onde exerceu cargos como juiz de direito substituto de segundo grau no Tribunal de Justiça, juiz membro do Tribunal Regional Eleitoral, diretor da Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso e presidente da Associação Mato-grossense de Magistrados.