Política

A porta dos fundos para aliviar um crime

A alta temperatura política, que acompanha o cotidiano da sociedade brasileira já há algum tempo, produziu um tipo de personagem que sempre existiu na história da humanidade, mas que apenas recentemente ganhou legitimidade judicial, e os holofotes da imprensa, nas incontáveis operações dos órgãos de controle nacionais, como a Polícia Federal, o Ministério Público e o próprio poder judiciário: o delator, popularmente conhecido como “dedo-duro” ou ainda “x-9”.

Os delatores nada mais são do que pessoas que colaboraram durante certo período de tempo com práticas criminosas e que, com a estrutura do Estado em seus calcanhares, não encontraram outra saída senão “entregar” o esquema ilícito do qual fez parte as autoridades. Dessa forma, com a colaboração de informações privilegiadas, eles são capazes de poupar boa parte do trabalho da justiça, ou mesmo viabilizar uma investigação que, sem esse norte, não seria possível.

O Circuito Mato Grosso preparou uma lista com alguns nomes que apelaram para o instituto da “colaboração premiada” (também conhecida como “delação premiada”) das principais operações que vêm atingindo em cheio certas figuras políticas poderosas no Estado. Os homens abaixo, todos com passagens pelas últimas administrações do Palácio Paiaguás, foram ex-secretários e pessoas de confiança dos respectivos governadores que se revezaram  no comando do Palácio Paiaguás, sede do poder executivo de Mato Grosso.

Pedro Jamil Nadaf

Ex-secretário de Estado de Mato Grosso de Indústria, Comércio, Minas e Energia no governo Blairo Maggi e ex-secretário chefe da Casa Civil do governo Silval Barbosa. Foi citado em delação de João Batista Rosa, proprietário da Tractor Parts e presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Cuiabá (CDL). O empresário havia pagado propina para ter acesso ao programa de incentivos fiscais no Estado e revelou ter sofrido “assédio” por parte de Nadaf que o questionava sobre possíveis delações feitas à justiça. Recentemente, um boato na imprensa afirmava que o próprio Nadaf teria entrado com pedido de delação premiada. Em contato com o Circuito Mato Grosso, no entanto, seu advogado, Alexandre Abreu, afirmou que se  trata de “especulação”, explicando que assim que um réu colabora com a justiça “renuncia a todos os recursos inerentes ao seu processo”. Ele afirmou que um habeas corpus, sob responsabilidade do ministro Edson Fachin, aguarda análise no STF.

César Roberto Zílio

Ex-secretário de administração do governo Silval Barbosa, Zílio foi preso em março de 2016 na segunda fase da Operação “Sodoma”, desencadeada pela delegacia fazendária da Polícia Judiciária Civil (DEFAZ). Após fazer um “rascunho”, ainda na cadeia, do esquema que levou à prisão o ex-governador Silval Barbosa, Zílio teve sua delação premiada homologada pela justiça. O antigo chefe da pasta da administração estadual afirma que, ao assumir o cargo em janeiro de 2010, foi procurado por Silval para exigir propinas de empresários. Esse  esquema teria movimentado R$ 13 milhões.

 

Pedro Elias

Ex-secretário adjunto de administração do governo Silval Barbosa, preso no dia 22 de março de 2016 durante a terceira fase da operação “Sodoma”, que investiga fraudes e pagamento de propina na concessão de incentivos fiscais para empresas se instalarem no Estado. Mello fez um acordo de delação premiada homologada parcialmente pela juíza Selma Rosane Santos Arruda, e se comprometeu a devolver R$ 2 milhões.

 

Afonso Dalberto

Ex-presidente do Instituto de Terra de Mato Grosso (INTERMAT, à direita na foto), firmou acordo de delação premiada com o Ministério Público Estadual (MPE) que investiga supostas fraudes envolvendo compras de terras no Jardim Liberdade, na capital. Segundo o MPE, ele também pode auxiliar no esclarecimento de irregularidade no Jardim Renascer, também em Cuiabá. Afonso está preso desde o dia 1º de fevereiro de 2016 em decorrência da operação “Seven”, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (GAECO), que investiga fraudes no Instituto.

Eder Moraes

Ex-secretário de fazenda do governo Blairo Maggi, ex-secretário chefe da Casa Civil do governo Silval Barbosa, ex-secretário da Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo (SECOPA). Preso em 2014 pela “Operação Ararath”, da polícia federal, Eder é um dos denunciados na delação premiada feita pelo empresário Gércio Marcelino Mendonça Júnior, o Júnior Mendonça. Ele chegou a realizar uma delação premiada sobre os incentivos fiscais concedidos de maneira irregular às empresas pelo poder público mato-grossense, mas recuou da iniciativa. A CPI da Assembleia legislativa de Mato Grosso (AL-MT), que vem investigando o processo de concessão de incentivos nos últimos anos no Estado, solicitou as informações prestadas por Eder, e logo em seguida negadas por ele mesmo, para compor os trabalhos dos deputados estaduais.

Delação deve comprovar se informação é realmente útil

Para combater a prática de organizações criminosas, o direito brasileiro criou o instituto da “delação premiada”, um dispositivo legal que, desde que atenda certos critérios, pode trazer benefícios ao interesse público. A opinião é do presidente da Comissão de Direito Carcerário da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Mato Grosso (OAB-MT), Waldir Caldas Rodrigues, que recebeu a equipe do Circuito Mato Grosso no seu escritório em Cuiabá.

Para o especialista jurídico, a Lei 12.850/2013, decretada em agosto de 2013, “tornou o instituto jurídico mais robusto”. O referido texto legal, além de definir organização criminosa, “dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado”. Waldir exaltou a possibilidade de integrantes desses grupos ajudarem a justiça, no entanto, disse que esse recurso deve seguir regras.

“Alguém que é comprometido com o interesse público em detrimento do particular, deve ser recompensado. No entanto, é preciso comprovar se a informação é realmente útil para as investigações”, diz ele. Waldir Sublinha ainda que, dependendo da importância da ajuda e do crime cometido, os delatores podem receber o “perdão judicial”, dispensando-o do cumprimento da pena, ou a redução da mesma em até dois terços do tempo total.

OAB vai promover debate sobre delação

Uma das principais protagonistas dos recentes escândalos no cenário político brasileiro é, sem dúvida, a delação premiada. Previsto em diversas leis, o termo de colaboração premiada é um benefício legal concedido àqueles que optam por colaborar com a investigação fornecendo informações em troca de diminuição da pena ou até perdão judicial. Desde que ganhou notoriedade a partir da divulgação de grandes casos de corrupção, o instituto vem sendo questionado e gerando posicionamentos diferentes.

Em meio a essa polêmica, a Delação Premiada será o tema da segunda edição do projeto Direito em Debate, realizado pela Escola Superior de Advocacia de Mato Grosso (ESA-MT) e a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT). Aberto a toda a sociedade, o debate acontece no dia 14 de junho, a partir das 18h30, no auditório da OAB-MT e será mediado pelo advogado e professor de Processo Penal, Ricardo Oliveira.

Os pontos favoráveis à aplicabilidade prática do instituto da delação premiada serão defendidos pelos advogados Laila Allemand, professora universitária e especialista em Direito Penal e Processo Penal, e Saulo Gahyva, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Já os fatores desfavoráveis serão explanados pelos advogados Ricardo Spinelli, professor de Direito Penal, Processo Penal e Atualidades em Direito Penal e

Processo Penal, militante na área criminal, e Helio Nishiyama, professor e especialista em Direito Penal e Processo Penal. Para participar, a taxa de inscrição é de R$ 15 mais 1kg de alimento não perecível ou taxa de leite. O debate conta com carga horária de 5 horas aula e são disponibilizadas 250 vagas.

 

 

 

Diego Fredericci

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