O Brasil construiu sua reputação no futebol mundial muito além dos títulos: foi também a terra dos grandes centroavantes. De Careca a Romário, de Ronaldo Fenômeno a Adriano Imperador, a camisa 9 canarinho sempre foi sinônimo de protagonismo e gols decisivos. Por décadas, o país exportou artilheiros que marcaram época, cada um com um estilo único, mas todos com a mesma vocação: decidir partidas e carregar o peso da responsabilidade ofensiva.
Nos últimos anos, porém, essa tradição parece ter se perdido. A Seleção Brasileira vive uma busca constante por um centroavante que una talento, regularidade e liderança dentro de campo. Muitos torcedores acompanham essa transição com curiosidade e expectativa — e, assim como procuram novas formas de se conectar ao futebol, também exploram experiências como o Código Stake, que reflete a paixão por analisar quem será o próximo nome capaz de devolver ao Brasil o brilho que essa posição um dia teve.
A carência de um “camisa 9” consolidado se transformou em uma espécie de dilema geracional. Entre tentativas frustradas, jovens promessas e ídolos que não conseguiram se firmar, a Seleção ainda busca um atacante que represente o equilíbrio entre a tradição e as exigências do futebol moderno.
O fim da era dos grandes centroavantes
Por muitos anos, o ataque brasileiro foi a linha de frente mais temida do planeta. Romário foi o símbolo da eficiência, Ronaldo o da genialidade, e Adriano o da força e da técnica combinadas. Essa sequência de talentos criou um padrão quase inatingível.
Mas o futebol mudou — e com ele, o papel do centroavante também. Hoje, as equipes priorizam movimentação, troca de posições e jogadores que participem da construção ofensiva, em vez do finalizador fixo que vive para o gol.
A Seleção acompanhou essa transformação, mas talvez sem encontrar o equilíbrio. Desde a aposentadoria dos grandes 9, o Brasil se apoia em atacantes de lado, como Vinícius Júnior e Rodrygo, e busca um homem de referência que consiga dialogar com esse estilo de jogo mais dinâmico. A ausência desse perfil fez a camisa 9 perder seu antigo prestígio — e talvez até um pouco do respeito que inspirava nos adversários.
Decepções recentes e o peso da camisa
As duas últimas Copas do Mundo deixaram cicatrizes quando o assunto é centroavante. Em 2014, jogando em casa, o Brasil apostou em Fred, que vinha de boas temporadas, mas sucumbiu à pressão e virou símbolo do fracasso ofensivo. Sua falta de mobilidade e as poucas finalizações certeiras lhe renderam o apelido cruel de “cone”, e até hoje sua participação é lembrada como um dos pontos mais frágeis daquele elenco.
Quatro anos depois, a aposta em Gabriel Jesus representava a juventude e a intensidade de um atacante moderno, mas o resultado foi semelhante: o camisa 9 terminou o Mundial sem marcar gols. Já em 2022, Richarlison viveu o auge técnico de sua carreira, marcando dois belos gols na fase de grupos — incluindo uma pintura contra a Sérvia —, mas a irregularidade voltou a aparecer nas fases decisivas.
Hoje, em 2025, o atacante do Tottenham continua sendo uma incógnita: oscila entre bons momentos e longas fases sem brilho, e sua presença na próxima Copa é tudo menos garantida.
Essa sequência de decepções criou um vácuo emocional na posição. A camisa 9, antes desejada por todos, virou um fardo que poucos conseguem carregar. Cada convocação reacende o debate: quem realmente merece essa função?
Promessas e realidades: entre esperança e frustração
A nova geração de atacantes brasileiros surge com talento, mas ainda sem consistência. Endrick, que chegou ao Real Madrid com status de fenômeno, está em sua segunda temporada no clube e luta por espaço entre tantas estrelas. Mesmo com lampejos de brilho, a falta de sequência tem limitado sua evolução e, por consequência, seu protagonismo na Seleção.
Vitor Roque e Marcos Leonardo, antes apontados como sucessores naturais de grandes nomes, vivem momentos discretos em seus clubes e estão distantes das listas de convocação.
Nesse contexto, Pedro, do Flamengo, continua sendo o nome mais citado pela torcida quando o assunto é “quem deveria ser o 9 da Seleção”. Com técnica apurada, presença de área e faro de gol, ele é talvez o atacante mais completo atuando no país. Porém, a sequência de lesões e a irregularidade física dificultam sua consolidação no cenário internacional. Entre expectativa e frustração, ele simboliza o dilema de uma geração que tem talento, mas ainda não encontrou estabilidade.
Os nomes do presente: Richarlison, Cunha e Igor Jesus
Se há dúvidas sobre quem será o camisa 9 do futuro, o presente da seleção também vive um momento de avaliação constante. Carlo Ancelotti tem apostado em Richarlison, Matheus Cunha e Igor Jesus como principais alternativas para o comando de ataque — três perfis distintos, que refletem tanto a diversidade quanto a indefinição da posição.
Richarlison, ainda no Tottenham, segue sendo o nome mais experiente entre eles. Mesmo convivendo com oscilações e problemas físicos, mantém prestígio com o técnico por sua entrega tática e versatilidade. Está longe de viver sua melhor fase, mas soma rodagem internacional e experiência de Copa do Mundo, algo que ainda pesa em um elenco que mescla juventude e reconstrução. Seu desafio é retomar o protagonismo que mostrou em 2021 e 2022, quando parecia o herdeiro natural da camisa 9.
Matheus Cunha, agora no Manchester United, tenta transformar potencial em constância. Depois de boas passagens pelo Atlético de Madrid e Wolverhampton, o atacante chegou ao maior clube de sua carreira com a missão de se firmar. É um jogador moderno, capaz de atuar como centroavante ou segundo atacante, com movimentação inteligente e técnica refinada, mas ainda precisa de números — gols e regularidade — para se tornar uma opção indiscutível na Seleção.
Já Igor Jesus representa a novidade mais empolgante. Depois de uma excelente temporada com o Botafogo, em que foi decisivo em torneios nacionais e internacionais, o atacante foi transferido para o Nottingham Forest, da Premier League, em julho de 2025. Sua estreia no futebol inglês vem sendo positiva: físico imponente, boa leitura de área e presença constante nas finalizações. É um nome em ascensão, talvez o mais próximo do estilo clássico que o torcedor brasileiro aprendeu a admirar — o 9 de presença, oportunista e letal.
Esses três formam a base mais realista da Seleção hoje. Nenhum é unanimidade, mas todos estão no radar e representam as apostas mais sólidas de Ancelotti a menos de um ano da Copa. Entre experiência, versatilidade e juventude, o técnico tenta encontrar o equilíbrio que devolva ao Brasil o centroavante de confiança que há tanto tempo faz falta.
Um desafio de formação e identidade
A dificuldade em revelar novos centroavantes não é apenas uma questão de azar — é estrutural. As categorias de base no Brasil priorizam a formação de pontas rápidos e meias habilidosos, enquanto a figura do finalizador nato foi sendo deixada de lado. É raro ver jovens aprendendo o ofício de jogar de costas para o gol, dominar em um toque e finalizar com precisão.
Essa lacuna técnica reflete diretamente na Seleção: os atacantes chegam ao profissional mais completos em movimentação e repertório, mas menos letais dentro da área.
Enquanto isso, países como Inglaterra e Argentina conseguiram equilibrar modernidade e tradição. Harry Kane e Julián Álvarez são exemplos de atacantes modernos que mantêm o instinto matador. O Brasil, por outro lado, tenta reencontrar esse ponto de equilíbrio. Sob o comando de Carlo Ancelotti, há um esforço em construir um ataque fluido, mas sem abrir mão de alguém que saiba decidir — algo que, até agora, nenhum jogador conseguiu entregar de forma consistente.
Entre a tradição e o futuro
Ser o “9 do Brasil” é mais do que uma posição: é carregar o peso de uma história. Cada nova geração de atacantes cresce ouvindo comparações com Romário e Ronaldo, e talvez aí esteja o maior obstáculo — a camisa ficou maior do que os próprios candidatos.
O próximo grande artilheiro brasileiro pode não ter o perfil clássico do passado, mas precisará unir técnica, mentalidade e regularidade para resgatar o prestígio dessa função.
Enquanto isso, a Seleção segue sua busca. Endrick, Igor Jesus, Richarlison, Pedro ou algum nome que ainda nem despontou — não importa quem seja, o desafio será o mesmo: devolver ao Brasil o centroavante que o mundo aprendeu a temer.
Fonte: Unsplash