O voto impresso neste momento é desnecessário, inoportuno e escandalosamente perdulário. Desnecessário porque pretende corrigir um problema que não existe; inoportuno, diante da falta de tempo para ser aprovado neste ano, e perdulário, posto que desperdiça um dinheiro do povo com algo absolutamente inútil.
Mas isso virou uma obsessão para o Presidente, da qual ele não vai desistir, mesmo porque é um traço de sua personalidade encucar com fantasias que ele mesmo cria.
Para entender o tamanho da paranoia do Presidente – aqui no sentido de ver problema onde não há – é bom lembrar como funcionam as eleições no Brasil. Elas são comandadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, pelos Tribunais Regionais Eleitorais e pelos Juízes de primeira instancia nos municípios. O primeiro tem, a cada mandato, sete ministros, sendo três do STF, dois do STJ e dois juristas de notável saber, além do Presidente. Os tribunais estaduais tem dois desembargadores, dois juízes estaduais, um juiz federal e dois advogados de reputação ilibada.
A Urna Eletrônica funciona no Brasil há 25 anos. Durante este período o TSE teve 15 diferentes ministros do Supremo como presidentes. Do STF ainda vieram, como membros, o dobro destes e outros tantos do STJ. Nos Tribunais Regionais, atuaram dezenas de desembargadores e juízes em cada estado, além de milhares de magistrados de primeira instância em todo o País.
Assim, neste ¼ de século de funcionamento da Urna, dezenas de milhares de profissionais do mais alto nível participaram das eleições no Brasil, sem nunca terem notado qualquer fraude no processo.
Entretanto, como o Presidente Bolsonaro afirma que houve tramoia nas eleições passadas, concluímos que os participantes (juízes, desembargadores ministros, advogados) agiram desonestamente no processo, fazendo vista grossa, ou são incrivelmente ingênuos e despreparados.
Sendo impossível que tantos desconhecidos se unam para cometer uma fraude e que, pela própria formação, é impensável que estes operadores do direito sejam incapazes ou néscios, resta uma terceira opção que é a leviandade ou má fé de quem põe em dúvida a probidade e a competência dos que comandam as eleições no País.
Fico com a má fé. Como já estamos no mês de agosto e não há mais tempo de aprovar o voto impresso e que existe uma clara rejeição dos parlamentares contra a proposta, tudo indica que estão preparando um golpe para contestar o resultado eleitoral de 2022, se for desfavorável ao atual presidente.
Na fábula de Esopo a Montanha prenhe, contrariando a expectativa geral, após gemidos e gritos medonhos, pariu um mísero rato. Aplica-se esta história à pessoas que prometem muito e nada entregam. Foi o caso do Presidente Bolsonaro que anunciara provas contra o sistema eleitoral brasileiro, que seriam reveladas na Live desta última quinta-feira. Ao final de duas horas de embromação, absolutamente nenhum fato novo foi apresentado. Aliás, admitiu, ao contrário do que sempre disse, não ter provas das denúncias. Mas, para tentar sair do vexame, ele agora inverte o ônus da prova: não cabe mais ao acusador demonstrar a culpa, mas ao acusado comprovar a inocência.
Pior que a Montanha de Esopo, nem um rato ele pariu; sua prenhez é psicológica.
Renato de Paiva Pereira – empresário e escritor