Opinião

A MODA

Dez anos atrás, escrevi este artigo. Infelizmente, está mais atual do que nunca.

A idolatria da fé é o calvário da humanidade. Por conta de esperar uma intervenção divina, esperamos que os imperadores não fossem tão romanos. Que a igreja não acreditasse em indulgências. Esperamos que a peste se interrompesse. Esperamos que o pensamento burguês fosse apenas uma moda, e que a igualdade prevalecesse.

Mas desde que as mãos mágicas e a inteligência brilhante do homem instalaram as regras da tão saudada Revolução Industrial, a burguesia nunca esteve tão na moda. E se disseminou por todas as latitudes. Dinheiro pelo dinheiro, dente por dente, doa a quem doer. A visão horizontal ofusca o crescimento vertical. Não podemos mais esperar. Tempo é dinheiro. Tudo na vida tem um preço. E tem mesmo.

Somos cria de uma geração que, movida à sagaz fórmula do capital gerando capital, destruiu, no último século, mais que o restante de toda a humanidade. Os fins justificam os meios. Em vez de resguardar, podemos desfrutar, em vez de apreensão podemos amortizar. Só que nos chega uma conta alta demais. Um cálculo que chelpa nenhuma poderá abrandar. Não me livro da culpa.

Aliás, a gente tem é muita culpa no cartório. Minha profissão é criar sonhos impossíveis ao alcance da sua mão, é tornar um objeto em símbolo, é simplesmente vender pra fazer você comprar, comprar e comprar. E vendemos tudo. Até a alma. Agora meio sem querer, meio porque é bonitinho, meio querendo dar uma de bom-moço, começamos a vender o mais precioso dos produtos: o planeta. Nunca se falou tanto em aquecimento global, em preservação, em ano do planeta. É a nova moda. É a nova moda para sustentar aquela antiga e perpétua moda. Mais uma ação num planejamento de marketing, mais um alvitre a ser oferecido.

Compre aqui e salve o planeta em 10 vezes sem juros. Estamos criando uma maneira inconsciente de esperar um milagre, enquanto deveríamos colocar em nossas propagandas bonitinhas que isso não passa da gota levada pelo passarinho para apagar o incêndio na floresta. Mas não vamos. Não vamos expor que estamos tratando um câncer maligno com doses de homeopáticas, não vamos desvendar que o capitalismo nunca deixará de ser selvagem. Estamos apenas criando uma espera para o que não tem como esperar. Estamos criando uma idolatria da fé em prol da salvação pelo consumo. Infelizmente estamos criando o último e derradeiro calvário da humanidade. Que Deus tenha piedade de nós.

João Manteufel Jr.

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Mais conhecido como João Gordo, ele é um dos publicitários mais premiados de Cuiabá e escreve semanalmente a coluna Caldo Cultural no Circuito Mato Grosso.

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