Opinião

A maquina de costura de minha mãe (II)

O tão sonhado tecido chegou às minhas mãos! Isso aconteceu após eu passar pela avaliação de todas as instruções disciplinadas por minha mãe, com vistas a mostrar minha aprendizagem – passar a linha pelas partes da máquina até chegar à agulha, coordenar movimentos de pernas, pés e mãos a direcionar corretamente a direção da costura.

Percorri os pretéritos labirintos recônditos de minha memória para trazer a imagem da estampa do tecido a este tempo. Frustrado esforço! Também, em vão, tentei lembrar da primeira peça que fiz. Pelo modo professoral de minha mãe, deve ter sido alguma peça que só exigisse uma bainha. Possivelmente, um pano de prato. Mas, qualquer que fosse a peça, da mais simples a mais complexa, deveria externar capricho, principalmente no avesso. “Uma costureira se conhece pelo avesso da peça”, frase que mais ouvia de mamãe ao lhe mostrar o resultado.

A máquina de costura de minha mãe passou a viajar com destino a tantas cidades em que moramos depois de Juiz de Fora: Rio de Janeiro, Brasília, Rio de Janeiro. E, após herdá-la de minha mãe, Cuiabá, Sítio Monte Aruna, em Água Fria, distrito de Chapada dos Guimarães, onde se encontra atualmente. Foi em 1978, em Brasília, o ano que mais costurei. Passei a fazer grande parte de minhas blusas e vestidos.

Meus olhos percorriam vitrines de lojas onde exibiam peças de acordo com meu estilo e com meus limites de dotes de coser. Ao entrar na loja, escolhia a roupa desejada e entrava na cabine. Experimentava a peça para sentir o efeito em meu macérrimo corpo. Se me encantasse, de posse de lápis e caderno, rapidamente despia-me para conhecer a peça em seus detalhes, seus cortes. Desenhar a peça era uma tarefa que me deixava muito tensa, pois levava tempo e logo a atendente faria alguma pergunta, incomodada com a demora em que eu permanecia na cabine. Algumas vezes, chamava minha irmã Tetê para me acompanhar nessa façanha. Ganharia tempo ao fazê-la de manequim, enquanto passava para o caderno o molde da roupa que experimentava. Mas, ela não gostava muito de desempenhar essa tarefa.

Lembro-me que fiz uma blusa de cor amarelada, de gola drapeada. Usei malha fria, tecido que permite um excelente caimento para esse modelo. E lá estava eu na noite do vernissage de uma exposição em Brasília, onde havia participado com “Mendigo”, desenho à tinta nanquim sobre cartolina branca, premiado com o terceiro lugar, medalha de prata no Salão de Pintura, em 1978.

Na década de 1980, ao deixar a cidade do Rio de Janeiro para ir morar na aldeia Nambiquara, troquei a Singer pela Olivetti. Da máquina de costura à máquina portátil de escrever, de cor verde. Presente de papai que conservo até hoje como um relicário. Foi adquirida após o consentimento da professora de datilografia, Isaura Braga, criadora do método “O aperfeiçoamento da técnica datilográfica” (1974) que aprendi no Ensino Médio, curso técnico da Fundação Getúlio Vargas.

Assim, cheguei ao Mato Grosso com uma máquina de escrever entre livros, roupas, mosquiteiro e muita expectativa…

(continua na próxima semana)

Redação

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