Opinião

A gente também fala Tupi

Diariamente, a peça publicitária ‘A gente também fala Tupi’ é apresentada na Rádio Senado. Elaborada por uma locução mista de duas vozes, encontra-se na Etapa 4, todas com música de fundo interpretada pelo coral de crianças Tupi-Guarani reunidas na aldeia Jaexaá |Porã, município de Ubatuba, São Paulo, uma das faixas do CD de áudio ‘Ñande reko arandu – cânticos indígenas da nação Guarani’.

Foi neste ano, em 19 de abril, Dia dos Povos Indígenas, que a Rádio Senado deu início à programação. Com duração aproximada de 30 segundos cada uma, a proposta é levar aos ouvintes 70 peças publicitárias que contemplam palavras originárias do Tupi, um dos troncos linguísticos das línguas faladas no Brasil. Junto à variedade de palavras, o informativo disponibiliza seus significados, enriquecidos com mitologias e curiosidades.

Tarefa nada fácil é a de calcular a contribuição linguística dos povos indígenas do tronco Tupi na língua portuguesa falada do Brasil. Contudo, estima-se que a língua oficial conta com aproximadamente 10.000 palavras Tupi, sem contar as não Tupi que também foram incorporadas na língua portuguesa. 

Iracema, piracema, cajá, taperebá, sapecar, pará, paraíba, açu, guaçu, mirim, uberaba, abaporu, guanabara, caatinga, mandacaru, maranhão, araguaia, pernambuco, sergipe, piracicaba, camboriú, jururu, jericoacoara, tatu, moqueca, paçoca, pamonha, tapioca, ita, itamaraty, itaipu, abacaxi, ananás, aracaju, arara, butantan, mingau, paca, paquerar, pacaembu, paquetá, mutirão, pipoca, futucar, cutucar, araripe, tiba, tiva, tuba, tuva, mandioca, maniva, aipim, macaxeira, lengalenga, nhenhenhém, buriti, aracy, iguaçu, caubi, açaí, caju, maracujá, jabuticaba, capixaba, abacaxi, ananás, pipoca, tutucar, cutucar, araripe, peteca e tantas outras.

Em território brasileiro, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a língua do povo indígena Ticuna, Amazonas, é a mais usada, com 34 mil falantes, seguida da Guarani Kaiowá, Mato Grosso do Sul, com 26.500, Kaingang, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo, com 22.000, Xavante, Mato Grosso, com 13.000 e Yanomani, Amazonas e Roraima, com 12.700.

Desde 2002, Amazonas, Pará, Roraima, Tocantins, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Ceará possuem línguas indígenas cooficializadas, com mesma situação jurídica do português, porém adotadas apenas em nível municipal. São elas: Akwê-Xerente, Apurinã, Baniwa, Desana, Guarani, Kanamari, Makuxi, Marubo, Matis, Matses, Mawe, Mebengôkre/Kayapó, Mura, Nheengatu, Tariana, Tenetehara/Guajajara, Terena, Ticuna, Tukano, Waimiri, Waiwai, Wapichana e Yanomami.

A cooficialização de línguas indígenas possibilita maior visibilidade aos povos indígenas, garantia do ensino bilíngue e direitos linguísticos aos seus falantes. Sem dúvida, ainda que tardio, um reconhecimento de que o Brasil é um país plurilinguístico.

Certamente, com a posse do escritor, filósofo e ambientalista Ailton Krenak, rompe-se o silêncio de 127 anos dos povos indígenas na Academia Brasileira de Letras, e ao declarar que se comprometerá na promoção de uma sinfonia com a diversidade das mais de 180 línguas indígenas faladas no país.

Para esticar a conversa, vale a leitura dos livros ‘Leis e línguas no Brasil: o processo de cooficialização e suas potencialidades’ (2015), organizado por Rosângela Morello, e ‘O tupi na cultura brasileira’ (1944), de Adaucto Fernandes, da Academia Cearense de Letras, resultado de sua conferência na Academia Fluminense de Letras, em 1943. Para a criançada, ‘O nome dos peixes na língua Karajá’ (2013), escrito pelo indígena Maidoré Karajá, ‘Memória das palavras indígenas’ (2015), de Luís Donisete Benzi Grupioni, e ‘Aldeias, palavras e mundos indígenas’ (2025), de Valéria Macedo, ainda que não abordem exclusivamente o universo linguístico Tupi.

Anna Maria Ribeiro Costa

About Author

Anna é doutora em História, etnógrafa e filatelista e semanalmente escreve a coluna Terra Brasilis no Circuito Mato Grosso.

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