No Rio, a Livraria da Travessa prestou homenagem a Manoel de Barros, que completaria 100 anos no próximo dia 19. Os cariocas puderam assistir e também ouvir em transmissão ao vivo pela rádio Antena MEC FM “100 anos do poeta Manoel de Barros”. A primorosa programação contou com as participações de Bianca Ramoneda na peça “Inutilezas”, de Elton Luiz, autor de “Manoel de Barros: a poética do deslimite” e de Isabela Baracat e Artur Gouvêa, voz e violino, respectivamente.
Manoel de Barros (1916-2014), “o menino que carregava água na peneira”, nasceu em Cuiabá, próximo de suas águas barrentas repletas de histórias de gentes e de seres encantados. Escreveu, não só com palavras, mas com assovios, água, terra e tantos outros materias sobre o percurso das águas sobre-sob a fauna-homem-flora.
Em “Gramática do Povo Guató” escreveu sobre o índio Guató. […] “Uma hora me falou que não sabia ler nem escrever. Mas seu avô era o Chamã daquele povo lhe ensinara uma Gramática do Povo Guató. Era a Gramática mais pobre em extensão e mais rica em essência. Constava de uma só frase: Os verbos servem para emendar os nomes. E botava exemplos: Bentevi cuspiu no chão. O verbo cuspir emendava o bentevi com o chão. E mais: o cachorro comeu o osso. O verbo comer emendou o cachorro no osso. Foi o que me explicou Rogaciano sobre a Gramática do seu povo. Falou mais dois exemplos: Mariano perguntou: – Conhece fazer canoa pessoa? – Periga Albano fazer. Respondeu. Rogaciano, ele mesmo, não sabia nada, mais ensina essa fala sem conectivos, sem bengala, sem adereços para a gurizada. Acho que eu gostasse de ouvir os nadas de Rogaciano não sabia. E aquele não saber me mandou de curioso para estudar linguística. Ao fim me pareceu tão sábio o Chamã dos Guatós quanto Sapir”.
Que o “menino do mato”, com suas “memórias inventadas”, dono de um “quintal maior do que o mundo”, que escreveu “livro sobre nada” e “livro das ignorãnças” e outros tantos sobre as “grandezas do ínfimo”, tudo “concebido sem pecado”, possa inspirar o viver em 2017, logo aí para nascer.