O número de assassinatos no campo de janeiro a novembro de 2016 no país já supera a quantidade de casos ocorridos durante todo o ano de 2015, de acordo com levantamento da CPT (Comissão Pastoral da Terra), vinculada à Igreja Católica. Foram 54 homicídios nos primeiros 11 meses deste ano, quatro a mais que o ano passado inteiro.
Esta marca já faz de 2016 o ano mais violento no campo desde 2003, quando 71 pessoas foram assassinadas. Só em Rondônia, o Estado mais violento em números absolutos, foram 17 homicídios de janeiro a novembro. O Maranhão ficou na posição seguinte, com 12; seguido do Pará, com seis.
A Pastoral da Terra também registrou assassinatos na Bahia (4), em Tocantins (3), Alagoas (2), Amazonas (2), Paraná (2), Mato Grosso (1), Mato Grosso do Sul (1), Paraíba (1), Pernambuco (1), Rio de Janeiro (1) e Rio Grande do Sul (1).
Há casos de conflitos por terra e por água. Entre as vítimas, estão camponeses, posseiros, indígenas, líderes quilombolas, um pequeno proprietário de terra, um sindicalista e um funcionário público.
A Pastoral destaca três casos como emblemáticos: os assassinatos da ativista Nilce de Souza Magalhães, em Porto Velho (RO), em 7 de janeiro; do quilombola conhecido como Zé Sapo, em Palmeirândia (MA), em 31 de março; e do indígena Clodioli Aquileu de Souza, em Caarapó (MS), em 14 de junho.
Nilce, conhecida como Nicinha, denunciava violações de direitos atribuídas ao consórcio responsável pela usina hidrelétrica de Jirau, em Rondônia. Ela despareceu em 7 de janeiro, mas seu corpo só foi encontrado cinco meses depois, dentro do lago de Jirau e amarrado a pedras.
Zé Sapo foi assassinado, segundo a Pastoral, em decorrência de um conflito de terra que já dura sete anos. Ele pertencia à comunidade Cruzeiro/Triângulo, que luta pelo reconhecimento de seu território, no Maranhão.
Aquileu, um jovem de 23 anos, foi vítima de um ataque promovido por fazendeiros e pistoleiros. Outros seis indígenas ficaram feridos na ação, incluindo uma criança. Os indígenas haviam ocupado uma fazenda situada em uma área reivindicada por eles em Mato Grosso do Sul.
Causas da violência
A Pastoral da Terra diz que vários fatores explicam a violência no campo, inclusive a instabilidade política no país. A impunidade é apontada como uma das principais causas das ações violentas. A comissão vinculada à Igreja Católica classifica como "vergonhosa" a baixa quantidade de mandantes e pistoleiros condenados nas últimas três décadas.
"A grilagem de terra avança em todo território nacional, principalmente na Amazônia, promovendo perseguições, ameaças de morte, assassinatos às lideranças camponesas", alerta a Pastoral em nota.
A comissão também critica o fato de o governo Temer ter extinto o Ministério do Desenvolvimento Agrário. A pasta foi transformada na Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, vinculada à Casa Civil.
Ouvidoria extinta
Na sexta-feira (2), a Pastoral emitiu uma nota para criticar outra medida do governo Temer: a extinção da Ouvidoria Agrária Nacional, encarregada justamente de prevenir e mediar os conflitos no campo.
"Sabemos que a Ouvidoria Agrária tinha limites, carecia de melhor estruturação, metodologia e efetividade nos seus encaminhamentos, mas a sua extinção é um assalto aos direitos básicos do sofrido povo do campo", diz a comissão.
A Ouvidoria Agrária foi extinta em 25 de novembro. Com 11 funcionários e 12 profissionais terceirizados, ela havia firmado parcerias que resultaram na formação de uma rede de órgãos especializados em questões agrárias no país.
Outro lado
De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Agrário, a Ouvidoria será recriada dentro do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), também vinculado à Casa Civil atualmente.
Não há data definida para a recriação. A assessoria de imprensa da secretaria diz que a iniciativa deve acontecer ainda neste ano.
Quanto aos casos de violência no campo, a secretaria contabiliza 53 assassinatos em 2016, ou seja, um a menos que o levantamento da Pastoral da Terra. Além disso, diz que seis homicídios já podem ser confirmados como decorrentes de conflitos agrários, mas que outros 12 não são decorrentes. De acordo com a secretaria, 35 casos ainda estão sob investigação. Segundo os dados da secretaria, foram 34 assassinatos em 2015: 16 já confirmados como decorrentes de conflitos e 18 ainda sob investigação.
Fonte: UOL