Cidades

Pacientes obesos vivem drama em Mato Grosso; assista

Fotos: Ahmad Jarrah e Sandra Carvalho

Apesar da decisão da juíza da Vara de Ação Civil Pública e Ação Popular da capital, Célia Regina Vidotti, ter estabelecido prazo de 120 dias, em 2015, para a Secretaria Estadual de Saúde (SES) realizar cirurgia bariátrica em cerca de 200 pacientes que aguardavam na lista da Central de Regulação, a fila continua grande.

E pior: esta semana a SES suspendeu a realização de endoscopia e ultrassonografia nos pacientes em tratamento para a realização da cirurgia e para os que se encontram em pós-operatório no Hospital Metropolitano, em Várzea Grande, principal referência no estado para este tipo de procedimento.

“O que está acontecendo no Hospital Metropolitano é que há dois anos o governo vem excluindo alguns serviços. Tínhamos psiquiatras, não temos mais. Tínhamos pneumologista, não temos mais, e por fim tiraram a endoscopia e a ultrassonografia. Hoje eu vi paciente saindo deste hospital chorando. Você pode falar que esses exames são baratos, mas barato para quem tem dinheiro”, reclama Zenaide Lopes Novaes, que já passou pela cirurgia há três anos e desde então montou um grupo de apoio àqueles que ainda estão aguardando.

Segundo Zenaide, muitos pacientes não têm dinheiro para pagar uma passagem de ônibus. “E nós estamos reunidos aqui para pedir para o governador que olhe para nós, que ele seja o nosso pai cuidando desses pacientes. Nosso objetivo é salvar vidas, porque tem gente aqui que não vive, vegeta”, apela.

A voluntária defende que o governador Pedro Taques deve entender que investindo na cirurgia bariátrica ele estará investindo na promoção da saúde pública. “Esses pacientes são diabéticos, têm problemas cardiovasculares, problema circulatório, doenças que deixam de existir após a cirurgia. Então, governador, olhe pra nós, nós não temos padrinhos, não temos deputados vestindo a camisa, não temos vereadores, nós temos apenas nós, um a um nos ajudamos”.

Nessa corrente, Zenaide Novaes relata, por meio de um grupo de WhatsApp, ocorre ajuda mútua na doação de medicamentos e roupas. E ela segue pedindo para que o governador vista a camisa dos obesos.

“Não estou aqui pedindo nada impossível pro senhor não, só que olhe para nós com um olhar de humanidade é isso que nós precisamos. Nós estamos sozinhos. Se não é a nossa equipe médica do Hospital Metropolitano vestir nossa camisa, lutar por nós, o que seria de nós?”, questiona a voluntária, enaltecendo a estrutura do hospital.

Neste sentido, ela reconhece: “A equipe médica aqui é excepcional, a direção também, as meninas que nos atendem também, mas nós estamos precisando de quô? Do Governador olhar pra nós, vestir nossa camisa pra que nos dê uma nova chance nesta vida”.

A doença

Obesidade é uma doença crônica que tende a piorar com o passar dos anos, caso o paciente não seja submetido a um tratamento adequado e contínuo. No Brasil (2013), quase 60% da população tem excesso de peso – na faixa de sobrepeso e obesidade.

Além de reduzir a qualidade de vida, a obesidade pode predispor a doenças como diabetes, doenças cardiovasculares, asma, gordura no fígado e alguns tipos de câncer. A Organização Mundial da Saúde (OMS), inclusive, aponta a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública no mundo.

Cozinheira engordou 110 quilos após parto

Dolores da Costa Correa tem 40 anos e 163 quilos, é cozinha especializada em comidas para buffets. Ela conta que começou a engordar após ter seu único filho, hoje com 14 anos. Sofreu de depressão pós-parto. Ela ficou deprimida porque os pais, muito rígidos, não aceitaram a gravidez. “O pai do meu filho não assumiu a criança e eu fiquei como a única mãe solteira da família”.

Desempregada há dois anos, Dolores sofre com a pressão alta. “Eles recebem meu currículo, me chamam, mas quando me veem não me contratam por causa do peso”, relata, reclamando ainda de bullyng por onde passa. “Dentro dos ônibus, o motorista pediu para a passageira sair do banco e ela disse: mais pra quem? Pra ela? Ela é gorda por que ela quer”, conta.

Com lágrimas nos olhos, a cozinheira conta que está vivendo da ajuda dos outros, porque já nem está tendo condições de trabalhar,  que muitas vezes não tem dinheiro nem para pagar uma passagem e que várias vezes precisa ‘catar’ moedas na sua casa pra comprar comida para seu filho.

“Vou à escola dele, os colegas riem de mim e ele fica com vergonha. Então é isso que nós queremos, uma nova vida, uma nova chance, porque nós não somos gordos porque queremos. Somos gordos porque temos algum problema”.

“Estou tão doente que não sei se vou aguentar até a cirurgia”

“Tenho problema com a higiene pessoal, para banhar… dificuldade para andar… Todos os problemas que possa imaginar. É muito difícil. Estou esperando há um ano para fazer a cirurgia. Estou com dificuldade para fazer os exames. Minha esperança é essa cirurgia. Não sei nem se vou aguentar esperar de tão mal que eu passo”. 

Este depoimento dramático é de Marilza Tolentin Olilveira Barbosa, de 46 anos e com 157 quilos. Ela mal consegue falar e caminhar. Seu esposo, Pedro Lazeri Barbosa, de 62 anos, completa o relato do drama vivido em família.

Ele conta que moram em Alto Taquari e esperou durante um ano esta oportunidade de vir até o Hospital Metropolitano. “E chegamos aqui e não estão fazendo exames. Há dois anos eu venho cuidando dela, não tenho condições de trabalhar. Nós elegemos o governador e agora precisamos dele”, apela Pedro Barbosa, pedindo ainda o apoio dos deputados para dar condições para realizar gratuitamente os exames e as cirurgias.

“Eu tenho vindo aqui certinho e agora surgiu esse negócio ai que não vai sair nada e que o hospital vai parar. Sem este hospital não somos nada. Tem muitos que já foram, já morreram, não aguentaram chegar até aqui. Então nós precisamos do governo aqui e qualquer um dos deputados que ganham bem que tem poder lá em cima eles podem fazer isso aqui”.

O outro lado

O Circuito Mato Grosso entrou em contato com a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Saúde (SES) para saber os motivos da suspensão dos exames de endoscopia e ultrassonografia no Hospital Metropolitano e sobre a fila de espera por cirurgias, por telefone e via e-mail, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.

 

Jovem diz que vai renascer após bariátrica

Estou esperando há dois anos pela cirurgia. Vai representar uma nova chance, uma nova vida né? Eu não aguento mais, eu tenho pressão alta, problema no joelho, problema nas costas, apneia do sono e a cirurgia vai salvar minha vida literalmente. Já é difícil a gente conseguir uma vaga na fila e se eles suspendem qualquer coisinha aí complica mais. Eu estou enrolado por causa disso, porque muitos exames que eu poderia fazer aqui não têm mais. Eu tive que correr atrás e ai fora é caro um exame. Você acha que desembolsar R$ 300, R$ 600 ‘contos’ é fácil?. A gente está preocupado é com isso, porque se tira mais um [exame] ai vai ser mais R$ 800, R$ 900 e alguns aqui não vão conseguir fazer. Eu vou renascer depois da cirurgia, vou poder ser igual a todos. É isso que ela representa pra mim. Luciano Benedito de Araújo, 26 anos, 251 quilo, aguarda a cirurgia há dois anos.

 

Quem já foi operado também precisa de exames

As pessoas que já passaram pela cirurgia bariátrica comemoram a nova vida. Se sentem mais dispostos e estão vendo sumir alguns problemas de saúde, como pressão alta e dores na coluna. No entanto, continuam necessitando de exames de acompanhamento, como ultrassonografias e endoscopias, justamente os exames que estão suspensos no Hospital Metropolitano.

PAULO DA SILVA FREITAS, TANGARÁ DA SERRA-MT

Esperei um ano e há 28 dias e passei pela cirurgia. Estou sentindo muitas melhoras, desempenho, a expectativa, muitas melhoras. E aí quando retornamos aqui, vindo de tão longe, o hospital fala que não está mais fazendo endoscopia. Como nós vamos ficar? Nós não trabalhamos porque ninguém quer dar emprego pra gente. Queremos que olhem para o hospital aqui. É muito triste isso tudo.

ELIZANDRA VIEIRA, SINOP-MT

Sou enfermeira e estou cirurgiada há 14 dias e estou maravilhosamente bem. Não sinto dores, não sinto fraqueza. Não sinto incômodo nenhum, estou andando normalmente e apta a trabalhar. Eu tinha uma canseira insuportável e taquicardia. E nesse meio tempo da cirurgia acabei sendo demitida. E por isso eu acompanho voluntariamente pessoas obesas há muito tempo. Então eu peço encarecidamente para o governo que nos ajude. Nosso voto vale tanto quanto o de uma pessoa normal.  É através do nosso voto que ele também se elegeu.  Eu estou operada e poderia nem estar aqui acompanhando os que ainda não conseguiram. Só que a vida dos outros vale tanto quanto a minha. Eu batalhei pela minha, e estou batalhando pela dos outros também.

 

Sandra Carvalho

About Author

Você também pode se interessar

Cidades

Fifa confirma e Valcke não vem ao Brasil no dia 12

 Na visita, Valcke iria a três estádios da Copa: Arena Pernambuco, na segunda-feira, Estádio Nacional Mané Garrincha, na terça, e
Cidades

Brasileiros usam 15 bi de sacolas plásticas por ano

Dar uma destinação adequada a essas sacolas e incentivar o uso das chamadas ecobags tem sido prioridade em muitos países.