O sistema do Instituto de Defesa Agrícola de Mato Grosso (Indea-MT) não emite o Certificado de Identificação de Madeira (CIM) para o transporte interestadual do produto, como obriga a Lei Estadual 235 de dezembro de 2005. O serviço atesta se o laudo emitido pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado (Sema) confere com a carga no transporte. Assim, é possível identificar se a carga destinada a outros estados é regular, inibindo o desmatamento ilegal.
O Indea não emite o documento desde 2013, por conta de medida aprovada na Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Após algumas ações na justiça, a autarquia conseguiu decisão favorável para a volta do CIM em setembro de 2015. Com isso o Posto de Identificação que funcionava há 18 anos no Distrito Industrial foi repassado, pelo governo, para o Sindicato de Transportadores de Carga (Sindimat), que até o momento não retomou essa área para que a fiscalização voltasse a ocorrer.
Segundo a denúncia do engenheiro florestal e diretor do Sintap, Filogênio da Rocha Neto, os últimos dados recolhidos pelo Indea, de dezembro de 2012, apontam a fiscalização de cerca de 1,5 milhão de m³ de madeira.
“Naquele ano foram arrecadados R$5,9 milhões. Usando os mesmo dados de volumetria de 2012 para 2015, podemos apontar que deixamos de arrecadar aproximadamente R$20 milhões. Atualmente, com o novo valor da URV, o governo está deixando de arrecadar R$27 milhões por ano. Talvez, maior que o orçamento do próprio órgão”, aponta Filogênio.
A taxa para que o certificado seja emitido é baseada na Unidade Real de Valor (URV). Para o engenheiro ambiental, a não implementação do serviço é “falta de vontade política de reestabelecer a atividade que é lei”.
A ausência do serviço favorece a venda de madeiras ilegais, fruto de desmatamento, roubo e até obtida de forma ilícita em terras indígenas. “Essa é uma atividade que mostra o que está errado, não só no papel. Aqueles que querem andar no caminho da ilegalidade fazem pressão política para que a atividade não retome. A cada dia que a atividade não é retomada, são milhares de cargas de madeira ilegal que vão para outros estados”, afirma.
Em Mato Grosso o desmatamento na área da Amazônia Legal aumentou 190% nos meses de fevereiro e março de 2016, em comparação com o mesmo período do ano passado. Foram derrubados 172 km², e em 2015, 60 km². Esses são dados do Sistema de Alerta do Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
O engenheiro florestal explica que, para transportar o material, o madeireiro contrata um engenheiro florestal para fazer o inventário e registrar o laudo na Sema, atestando o tipo e quantidade em m³ do carregamento. Portanto, o próprio madeireiro é quem emite a guia florestal para transporte.
Quando há a intenção de usar uma carga ilegal, esse serviço é feito, a carga retorna a madeireira, e a madeira licenciada é trocada por outra advinda ilegalmente. Assim, o condutor do veículo consegue passar pelas barreiras sem prejuízos. “O documento é verdadeiro, mas a carga é falsa”, explica o engenheiro.
Serviço impede saída de madeira ilegal
Com o serviço de identificação, as cargas ilegais não conseguem sair do Estado. Isso porque, nos postos de identificação do Indea, é coletada uma pequena mostra da madeira, feito um polimento e o profissional do instituto consegue comprovar ou não se aquele tipo de madeira é o atestado no laudo da Sema.
Se verificado a irregularidade, a carga é apreendida e o veículo, caso esteja com os documentos em dia, liberado. Caso provada a regularidade, o CIM é emitido e a carga liberada.
“A cada dia que a atividade não é retomada são milhares de cargas de madeira ilegal que vão para outros estados”.
“Apenas essa técnica atesta a identificação da madeira. A Polícia Rodoviária Federal, a Polícia Militar e a própria Sema não conseguem fazer esse tipo de trabalho. Quando eles se deparam com um caminhão de madeira no trajeto, eles verificam o documento da carga, como a nota fiscal e o guia florestal, e o profissional avalia a validade do documento, mas não o tipo da madeira”, explica o engenheiro.
Atualmente, a fiscalização seria feita ocasionalmente por meio de barreiras volantes. “Nós já pegamos castanheiras em forma de porta e forro. Porque o madeireiro pensa: como não vou passar para fazer a identificação, ninguém vai me pegar na fiscalização. Recentemente, prendemos seis caminhões em uma barreira, 11 em outro e assim vai… No ano passado totalizou, de abril a outubro 140 caminhões com carga irregular”.
Conflito Indea X Madeireiras
O deputado estadual Dilmar Dal’Bosco (DEM) foi quem liderou o movimento em favor do setor de base florestal para que a Lei Complementar fosse revogada. À época, o presidente do Sindicato Indústrias Madeireiras (Sindusmad), José Eduardo Pinto, afirmou que dentre os prejuízos causados, havia a depreciação da imagem do Estado perante a sociedade quando se apreende cargas, pois, segundo ele trata-se de menos de 1% do volume identificado pelo órgão.
Ele declarou, ainda, divergências entre profissionais classificadores; habilitação, por parte do Indea, para identificar somente 23 das 101 essências cadastradas pela Sema; e perda de competitividade de Mato Grosso em relação a outros estados devido aos custos embutidos neste serviço. Alega, também, que a falta de estrutura das unidades de identificação afetou, por muitas vezes, o comércio de madeira por diversos fatores.
Para o engenheiro, a alegação de falta de estrutura é pequena frente às benfeitorias que o CIM promove. “A questão de estrutura é dada pelo estado, a gente trabalha com as condições que a gente tem. Por exemplo, a polícia militar e os prontos-socorros não têm estrutura e é por isso que devemos acabar com tudo isso? Não é por ai… O correto é que o seguimento que estão cientes neste setor cobrem do governo investimento”.
Filogênio rechaça os argumentos do Sindicato apontando que o maior prejuízo pela falta da emissão do CIM é o ambiental. “A cada dia que a atividade não é retomada são milhares de cargas de madeira ilegal que vão para outros estados. O cerco se fecha para a questão do desmatamento com a identificação de madeira, a fiscalização na saída funcionando, e com a Sema verificando a origem da madeira”.
Ele ainda explica que a alegação de divergência por parte dos profissionais do Indea não se confirma, já que nas cargas apreendidas nas quais foram refeitos testes por outros institutos, comprovam a veracidade do laudo feito emitido pelo Indea.
A identificação de madeira, apesar de encarecer o processo, também funciona para valoriza o produto. De acordo com o engenheiro florestal, o produto que chega ao Estado São Paulo, por exemplo, com o CIM não é necessário passar por mais fiscalizações, devido a um programa chamado “Madeira Legal”.
“A identificação seleciona o joio do trigo, diminui a concorrência desleal daquele que usa desmatamento, para o que anda na legalidade, agrega valor ao produto. Porque quem compra sabe que está levando um material de qualidade com nota fiscal, via florestal e que tem certificado de identificação. Ou seja, ele sabe que está comprando uma madeira legal”, completa.
Indea quer reativar posto no Distrito Industrial
Para que o Indea possa cumprir o que prevê a legislação de identificação da madeira, um dos pontos é ter de volta o imóvel localizado no Distrito Industrial para que, ali, conforme já planejado pelo instituto, seja instalado um posto de identificação.
Segundo o Indea, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) ajuizou ação de reintegração de posse (Ação n. 1013048-44.2016.8.11.0041), com pedido de liminar, para reaver o imóvel ocupado pelo Sindicato das Empresas Transportadoras de Carga do Estado de Mato Grosso. Com o sindicato foi firmado um contrato de comodato há três anos, e nele tem uma cláusula que possibilita ao Estado, que é o dono do imóvel, reaver o bem a qualquer momento.
Caso volte a funcionar, o posto do Distrito Industrial atenderá a rota de caminhões que vêm de vários municípios do Estado e funcionará em regime de plantão, 24 horas, incluindo sábados, domingos e feriados.