O rombo deixado pela gestão de Silval Barbosa (PMDB) nos cofres do Estado somado às revisões de plano de carreiras e a crise econômica são apontados pela Secretaria de Estado Fazenda (Sefaz) como os principais fatores para atual escassez de dinheiro, que já atrasa repasses do duodécimo a outros Poderes e pode complicar a partir de setembro, por causa do volume de dívidas em aberto.
O governo apresentou nesta quarta-feira (17) um plano para tentar aumentar a quantidade de dinheiro que entrará no caixa a partir deste mês, mas a situação depende de repasses da União – que somente do FEX (Auxílio Financeiro para Fomento às Exportações) tem dívida de R$ 420 milhões –, da aprovação de projetos de lei para alterar normas tributárias e de acordo com os contribuintes com maior volume de dívidas. O cenário é descrito como o pico mais alto da crise econômica iniciada em 2010, mas que apenas agora Mato Grosso sente os efeitos colaterais.
Balanço apresentado pelo secretário Seneri Paludo (Fazenda) mostra que até o fim do primeiro semestre deste ano Mato Grosso acumulou receita de R$ 8,05 bilhões, montante abaixo daquilo que o governo já empenhou para pagar as dívidas. Elas estão na casa de R$ 8,63 bilhões.
A receita está distribuída por cinco categorias de recolhimento fiscal, e o governo tem controle direto na maior parcela, referente às entradas de recursos via taxas e impostos, o ICMS é maior deles. Essa quinta parte está contabilizada em R$ 3,226 bilhões equivalentes 40% de tudo o que o governo recebe. As outras partes são de R$ 324 milhões de operação de crédito, R$ 1,77 bilhões da receita do contribuinte e R$ 2,06 bilhões de transferências correntes. Um agregado de pequenos recolhimentos somam R$ 711 milhões.
As contas a pagar, no entanto, extrapolam esse quadro. Somente as folhas de pagamento dos servidores estão hoje em patamar de R$ 5,25 bilhões, valor que não pode ser coberto pela maior parcela de entrada dinheiro.
O montante recolhido via impostos corresponde a 40%, isso considerando que as receitas desse item subiram 3% em relação ao primeiro semestre de 2015- em miúdos, os cidadãos estão pagamento mais por serviços. Juros e amortização das dívidas abocanham juntos R$ 765 milhões; investimentos e inversões levam outros 884; e outras despesas correntes estão hoje em R$ 1,72 bilhão.
Situação pode forçar aplicação de medidas impopulares
Para o secretário adjunto do Tesouro, Carlos Rocha, a situação pode ser explicada por vários diversos, os três que mais pesam na nessa ordem – a crise econômica, a herança maldita deixada pelo ex-governador Silval Barbosa e os planos de carreiras e salários dos servidores públicos. O cenário leva a medidas impopulares, como o pagamento pela metade da RGA. Silval Barbosa está preso no Centro de Custódia de Cuiabá acusado de ter montado um grande esquema de corrupção no Governo.
Sobre a crise, o secretário diz que Mato Grosso começou a sentir os danos da recessão do país apenas em 2015, apesar de a quebra econômica ter iniciado fora do Brasil em tempo mais distante, em 2010. A dependência do Estado dos repasses da União seria o fator mais forte, pois o governo federal suspendeu os repasses, obrigando o Estado a lidar com as contas por recurso próprio.
“Para se ter uma ideia, o Fundo de Participação Estadual recuou 3,5% neste ano, quando deveria ter aumentado perto de 13%, era a estimativa do grupo econômico antes do cenário da crise; e os Estados dependem de recursos da União para lidar com as dívidas”, explica.
Ele aponta outras complicações advindas da crise, como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que está 20% menor que o registrado no ano passado. O financiamento de serviços na rede pública de saúde também cai em 20%, mas os gastos estão no sentido inverso.
“O governo já determinou que todas as secretarias façam contingenciamento até o fim do ano para fechar as contas, porque o Estado não tem direito de déficit. Tem que fechar as contas. Somente as pastas de Educação, Saúde e Segurança não terão corte orçamentário e são despesas que crescem correntemente”, diz Paludo.
Os planos de carreira e salários dos servidores são apontados como o segundo fator que mais pesa na hora de fechar as contas. Segundo o secretário Carlos Rocha, várias categorias tiveram aumento em torno de até 20% nos últimos anos, em altas graduais desde 2001.
“O Indea (Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso) e a Segurança tiveram aumento de 20%, além da RGA (Revisão Geral Anual), que foi aplicada, por esta gestão [de Pedro Taques], no ano passado e neste ano. Isso força o orçamento do Estado”, diz.
Conforme Carlos Rocha, as despesas com a folha de servidores comprometem mais de 60% da receita do Executivo, e o ideal é abaixo de 44%.
Pouco dinheiro
A situação financeira do caixa do governo piora a tentativa de fechar as contas, devido ao baixo nível de dinheiro disponível para movimentação e o volume de contas em aberto. Somente em meados de dezembro de 2014, o ex-governador, hoje preso por fraudes em serviços de concessão de incentivo fiscal e recebimento de propina, teria movimentado cerca de R$ 1 bilhão.
Rocha diz que em gastos de gaveta, os reconhecidos pelo governo, mas não estão oficialmente nas contas, havia um montante de R$ 1 bilhão. Disso, as auditorias do governo, realizadas no primeiro ano da gestão, conseguiram reduzir para R$ 600 milhões como dívidas reconhecidas. Outros R$ 400 milhões, de dívidas sem lastro, estão sendo quitados gradualmente.
Empréstimo para VLT corre em paralelo com fluxo de caixa
Paralelo ao fluxo de caixa imediato, o governo tem uma dívida acima de R$ 1,4 bilhão de empréstimo para execução de obras do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). O montante cresceu em junho deste ano, quando o governador Pedro Taques (PSDB) fez empréstimo de R$ 400 milhões junto a Caixa Econômica Federal (CEF) para a continuidade dos serviços.
O modal foi outra dívida herdada pela gestão de Taques do ex-governador Silval Barbosa. Durante esses anos de mandado, Barbosa aprovou o projeto para circulação do veículo em Cuiabá, em ligação direta entre o aeroporto Marechal Rondon e a região do CPA, e da avenida Tenente Coronel Duarte (Prainha) e a região do Coxipó até trevo de entrada para o bairro Tijucal.
A obra foi orçada em R$ 1,47 bilhão e já sugou R$ 1,06 bilhão do governo, e a previsão é que os gastos ultrapassem os R$ 2 bilhões, contando a revisão de contrato de serviços e outros ajustes financeiros até a entrega ao governo. O Consórcio VLT, o conjunto das empresas responsáveis pela execução, pede aditivo de R$ 1,3 bilhão para concluir os serviços, que, hoje, não tem data para começar a ser utilizado pelo público.
Governo planeja cortar gastos e aumentar arrocho fiscal
O secretário Seneri Paludo afirma que o governo montou atividades para tentar sanar os problemas de caixa em quatro frentes. Uma delas é acelerar o pagamento de dívidas de contribuintes com maiores valores.
Segundo ele, hoje 185 mil processos tributários estão em análise pela Secretaria de Fazenda de grandes empresários, que contestam as cobranças de tributo. Hoje, a dívida está em torno de R$ 1,2 bilhão, mas o governo espera receber R$ 110 milhões até o fim deste ano – menos de 10% do total. O plano de emergência é arrecadar dinheiro para cobrir R$ 600 milhões já empenhados pelo governo e que estão acima da receita disponível.
“Nós temos hoje um volume grande de processos impugnados por contribuintes, que não concordam com o valor cobrado pelo Fisco estadual. O que vamos fazer é selecionar aqueles com valores mais altos e propor condição de quanto mais à vista for pago, mas desconto o contribuinte receberá dos juros e outras para conseguir quitar essa dívida”.
Outra alternativa que será aplicada é o acompanhamento tributário de empresas para fiscalizar a movimentação financeira. Paludo afirma que o objetivo é barrar sonegações fiscais. Dentro desse campo, a Sefaz também montará uma equipe de monitoramento nas áreas de fronteira em Mato Grosso, para evitar que notas de mercadorias que entram em Mato Grosso sejam adulteradas.
O governo também trabalha projeto de lei, que deverá ser enviado para a Assembleia Legislativa nas próximas semanas, para autorização de parcelamento de créditos tributários. Além disso, um corte orçamentário de 20% deverá ser realizado para gerar economia de R$ 200 milhões.
“Se juntar R$ 200 milhões de contenção, o recebimento do FEX da União, as dívidas renegociadas de contribuintes e o resultado de outras medidas que estão sendo implantadas pelo governo, vamos conseguir fechar a conta. Portanto, não é possível falar que estamos em crise. Contas precisam ser reequilibradas e estamos trabalhando para isso”.