Os incentivos fiscais têm o potencial de transformar a dinâmica econômica de um Estado. Mas também podem significar prejuízos expressivos às contas públicas se o desenvolvimento econômico e social proporcionado pelo seu estabelecimento numa determinada região não justificar os altos valores que deixam de ser arrecadados. Se, além disso, uma empresa ainda possui problemas na justiça e é suspeita de sonegar impostos, o sinal amarelo deve ser ativado nos órgãos fiscalizadores. Este parece ser o caso do Grupo Petrópolis, em Mato Grosso.
Inaugurada em 2008, durante o governo Blairo Maggi (PR), a Cervejaria Petrópolis – fabricante das marcas de cerveja Crystal, Petra, Lokal, Black Princess e outras – trouxe expectativa de desenvolvimento para a segunda maior economia de Mato Grosso segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cidade de Rondonópolis (216 km de Cuiabá). No entanto, nos anos seguintes a sua instalação, denúncias de irregularidades na renúncia fiscal concedida pelo poder executivo estadual colocaram em cheque essa esperança.
Considerada a maior beneficiada no Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso (Prodeic), a cervejaria Petrópolis deixou de repassar aos cofres públicos R$ 136 milhões em 2012, segundo levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Essa é última informação oficial disponível sobre a “anistia” ao grupo. O Circuito Mato Grosso solicitou à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sedec-MT) o montante dos dois últimos exercícios, mas o dado não pode ser compartilhado em virtude da lei de sigilo fiscal das empresas.
Mesmo assim o fato chama a atenção. O investimento necessário para o funcionamento da planta industrial do Grupo Petrópolis em Rondonópolis foi de R$ 200 milhões, como aponta o relatório do TCE-MT. Quando deduzimos a renúncia fiscal concedida à empresa apenas em 2012 – ou seja, desconsiderando o “perdão fiscal” do governo do Estado desde 2008, quando a unidade começou a operar -, a organização conseguiu “recuperar” 68,01% do capital empregado em sua instalação num único ano.
O TCE-MT ainda estabelece uma relação interessante entre a renúncia fiscal do grupo Petrópolis em 2012 com o número de empregos gerados pela organização. De acordo com o estudo do Tribunal de Contas do Estado, a empresa “conta atualmente com 421 colaboradores”. Ao dividirmos os incentivos concedidos pelo poder público estadual de Mato Grosso (R$ 136 milhões) com a quantidade de trabalhadores, cada posto de trabalho “custou” aos cofres públicos R$ 323 mil, por ano.
Embora a renúncia de impostos por empresas não seja de domínio público, o valor do qual o governo de Mato Grosso abriu mão por meio desses incentivos pode ser verificado na lei de diretrizes orçamentárias de 2016. Segundo o documento, formulado pela Sefaz-MT, a renúncia fiscal para o setor de bebidas neste ano está prevista em R$ 175,2 milhões, perdendo apenas para os frigoríficos (R$ 190 milhões) e para os derivados da soja na indústria (R$ 184 milhões).
Grupo Petrópolis é investigado em CPI na AL-MT
Em contato com o Circuito Mato Grosso, o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Renúncia e sonegação Fiscal, deputado José Carlos do Pátio (SD), confirmou que a cervejaria Petrópolis é uma das empresas investigadas pelo grupo na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT).
“De fato o Grupo Petrópolis é uma das empresas investigadas na CPI. Contudo, não podemos passar mais detalhes sobre o caso por uma questão de ética”, disse.
A CPI da Renúncia Fiscal da AL-MT, além de realizar a convocação de representantes de empresas investigadas em esquemas fraudulentos de sonegação de impostos, também entregou ao governo do Estado um anteprojeto do novo modelo fiscal de Mato Grosso no último dia 06 de abril. O modelo tem a proposta de total renovação do programa de desenvolvimento econômico e a criação do Programa MT Produtivo e Sustentável com Arranjos Produtivos Locais que contemplem toda a cadeia produtiva.
Empresa foi a maior doadora na campanha de Pedro Taques
A relação entre políticos e empresas é necessária para garantir um eficaz desenvolvimento econômico à sociedade. O limite entre o legal e o moral, entretanto, pode ser coberto por um véu que mascara interesses que passam longe do bem-estar da população, sobretudo quando essa associação é realizada entre atores suspeitos, investigados pelos órgãos de controle brasileiros. Nesse caso, chama a atenção que o Grupo Petrópolis foi o maior doador da campanha do candidato Pedro Taques, hoje no PSDB, em 2014.
Dados do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), órgão responsável, entre outras coisas, pelo julgamento de contas de campanha dos políticos brasileiros, revelam que a Cervejaria Petrópolis doou R$ 3 milhões ao hoje governador do Estado – algo em torno de 11% de todos os recursos arrecadados pelo comitê de Taques, que foi R$ 27,1 milhões. Mesmo com o expressivo aporte o Secretário de Fazenda, Paulo Brustolin, revogou o decreto 110/2014, dando fim a renúncia fiscal da cervejaria.
A reportagem de Bruna Fantti, do jornal carioca O Dia, aponta um esquema envolvendo doações ilegais entre a Odebrecht e o Grupo Petrópolis. A matéria de 26 de março de 2016 afirma que a Polícia Federal encontrou planilhas apreendidas na 23ª fase da Operação Lava Jato em posse de Benedicto Barbosa Silva Junior, presidente da Odebrecht infraestrutura. A empreiteira teria usado distribuidoras de cerveja, ligadas à Itaipava, carro chefe da cervejaria, na contribuição de campanhas eleitorais. As doações podem ter superado R$ 30 milhões.
Walter Faria, proprietário do Grupo Petrópolis, é um dos homens mais ricos do Brasil, com fortuna estimada em R$ 3,4 bilhões. Ele já foi preso pela Polícia Federal em 2015 por sonegar R$ 1 bilhão em impostos.
Grupo Petrópolis é alvo da Zelotes
Na última terça-feira (09) o Ministério da Fazenda instaurou procedimento administrativo para apurar irregularidades que beneficiaram o empresário Walter Faria, dono da Cervejaria Petrópolis, que é investigada pela Polícia Federal na “Operação Zelotes”.
A operação Zelotes, da Polícia Federal, investiga fraudes de grandes organizações que lançam mão de métodos ilegais para sonegar impostos em esquemas de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), responsável por avaliar as contas dos maiores contribuintes da Receita Federal.
De acordo com nota do Ministério, “irregularidades cometidas por um grupo de advogados, conselheiros, e ex-conselheiros do CARF” podem ter resultado num perdão milionário ao empresário Walter Faria. A força-tarefa da operação é composta por membros do Ministério Público Federal, da Receita e da Polícia Federal.
“As apurações promovidas pela força-tarefa permitiram revelar irregularidades cometidas por um grupo integrado por advogados, conselheiros e ex-conselheiros do Carf que resultaram na exoneração de crédito tributário da ordem de R$ 8,6 milhões constituído em face do empresário Walter Faria”, diz a nota.
Em nota, o empresário se defendeu, afirmando que não conhece nem realizou qualquer tipo de pagamento a conselheiros do Carf. Ele é investigado por uma suposta propina de R$ 46 mil.
Confira mais detalhes na reportagem do Jornal Circuito Mato Grosso