Devido ao medo e insegurança de muitas mulheres que dependem do transporte coletivo na capital, em junho de 2015, foi sancionada a lei que estabelece a “Parada Segura” para as mulheres. A poucos meses de completar um ano, a lei ainda é desconhecida. As próprias mulheres não sabem que agora possuem o direito de solicitar ao motorista que pare, dentro da linha do ônibus, em locais iluminados ou próximos a suas casas.
Essa medida visa diminuir o índice de violência sofrida pelas mulheres que acabam vítimas de conhecidos ou desconhecidos enquanto voltam para casa. De autoria da vereadora Lueci Ramos (PSDB) e do vereador Chico 2000 (PR), a nova lei permite que após as 22h, os motoristas dos coletivos parem em qualquer local solicitado por mulheres.
Em entrevista ao jornal Circuito Mato Grosso, a vereadora, pontuou que 80% das mulheres que utilizam os coletivos em Cuiabá e Várzea Grande, têm medo de descer e de estar nos pontos de ônibus depois das nove horas da noite. “Quando fui procurada por mulheres para criar a lei, todas elas me relataram o medo que elas tinham em andarem sozinhas do ponto de ônibus até as suas casas. Não podemos permitir que essas mulheres fiquem reféns da insegurança, quando medidas simples podem ser tomadas”.
Lueci criticou o fato de que a lei fará um ano, mas que, infelizmente, não vem sendo cumprida como deveria e que cita a gravidade da situação. “As empresas de transporte urbano precisam entender que isso é uma Lei e que leis foram feitas para serem cumpridas”.
Um dos problemas do desuso da lei é a falta de informação. “Não vejo nenhum cartaz dentro dos coletivos e isso é importantíssimo, tanto para as mulheres quanto os motoristas. Temos que pensar na rotatividade de motoristas nessas empresas e pensar também que a maioria das mulheres não sabe da lei”, lamentou.
PESQUISA
Em uma pesquisa realizada durante a noite em alguns pontos de ônibus da capital, a reportagem apurou que de dezesseis mulheres abordadas, nove disseram ter algum conhecimento sobre a lei que permite a parada em qualquer lugar depois das 22 horas. Sete delas não sabiam e pelo menos uma já precisou que o motorista parasse em um local menos escuro quando voltava para casa, mas não foi atendida, alegando que o motorista chegou a ser “estupido” com ela.
As idades das mulheres entrevistadas variam entre 19 a 43 anos e a maioria delas estava indo para casa depois de uma jornada de trabalho e estudo. As 16 entrevistadas alegaram sentir medo quando estão nos pontos de ônibus e que preferem esperar o transporte quando outras mulheres estão na parada. Cinco mulheres afirmaram já terem sido assaltadas enquanto esperavam no ponto.
Todas as entrevistadas pontuaram que gostariam que houvesse informativos pelos ônibus e mais propagandas na mídia. “As informações são importantes para que nós e os motoristas saibamos que existe uma Lei que garante mais segurança”, disse uma dela.
DADOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
Ocupando a 14ª posição no ranking de Capitais que possuem casos de violência contra a mulher, Cuiabá possui 6,6% casos registrados em 2013, segundo o Mapa de Violência, que abordou o Feminicídio, nome dado ao crime de violência contra a mulher, divulgado em 2015.
Conforme dados disponibilizados para o Jornal Circuito Mato Grosso, pela Secretaria de Estado de Segurança (Sesp), 179 mulheres sofreram lesão corporal em 2015, 8 sofreram estupro e 12 mulheres foram mortas. Segundo os dados de janeiro a março de 2016 o número de mulheres que sofreram lesão corporal já somam 37. Três mulheres já foram estupradas e duas já sofreram tentativas. Até março apenas uma mulher havia sido morta na capital.
No ano passado, 27% das mulheres sofreram agressões por desconhecidos e as principais vítimas têm idades entre 18 e 30 anos. Além disso, 15,9% da violência sofrida por essas mulheres acontecem na rua.
FORMAS DE VIOLÊNCIA
Ainda no Mapa de Violência, são apontados os principais instrumentos utilizados na prática de agressão contra mulheres e traz também os lugares onde acontecem e o tipo mais comum de violência.
Instrumentos mais comuns
Sufocamento
6,1 %
Arma de fogo
48,8 %
Por armas cortantes
25,3%
Agressões físicas
8,0%
Outros
11,8%
Locais
Estabelecimentos de saúde
25,2 %
Domicílio
27,1 %
Vias públicas
31,2%
Ignorados
15,7%
Outros
0,5%
Tipos de violência
FÍSICA
48,7 %
SEXUAL
11,9%
MEDIDAS EMERGENCIAIS
No dia 4 de abril de 2016, representantes do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-MT), Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) e representantes das três empresas de transporte urbano da Capital, se reuniram para discutir a aplicação da Lei Municipal nº 5944/2015, que institui a “Parada Segura.
Durante a reunião foi acordado que as empresas de ônibus teriam até o dia 15 de abril, para entregar ao Procon, uma agenda com datas disponíveis para a realização de uma série de palestras que o órgão e as entidades, presentes durante a reunião, realizaram para conscientizar os motoristas sobre o cumprimento da lei. Procurada pela nossa reportagem, a fiscal do Procon, Eliziane Guibor, garantiu que as agendas estão sendo entregues pelas empresas e que os cronogramas estão sendo montados.
Além disso, o órgão disponibilizará nos coletivos informativos sobre a Lei, os direitos e deveres e como agir em caso de descumprimento. A fiscal do Procon explicou que as mulheres que não forem atendidas pelos motoristas devem registar denúncia. “Não tivemos nenhum caso registrado ainda e acreditamos que isso seja pela falta de informação sobre como realizar a queixa”, disse Eliziane.
Ela explica que para registrar denúncia contra a empresa de ônibus basta ir até o Procon. “É importante que a mulher chegue aqui com o número da linha do ônibus, o nome da empresa, o horário e local onde aconteceu o fato. Com esses dados, podemos checar com a Semob para saber se houve ou não o descumprimento da Lei e assim abrir um processo contra a empresa”.
A Secretaria de Mobilidade Urbana (Semob) e vários parceiros estão preparando uma campanha educativa para fazer valer a lei “Parada Segura”. A campanha será feita através de banners e cartazes, explicando a lei e também contendo números de telefones para que as usuárias reclamem caso tenham seus direitos desrespeitados. Vão participar a Defensoria Pública, MTU (Associação Mato-grossense dos Transportadores Urbanos), Delegacia da Mulher, os conselhos Estadual e Municipal dos Direitos da Mulher, e também os Procons estadual e municipal.
AS EMPRESAS
Em resposta às recentes queixas, a assessoria de imprensa da Associação Mato-Grossense dos Transportes Urbanos (AMTU), que responde pelas empresas de Transporte Coletivo de Cuiabá, disse que as mulheres muitas vezes pedem para que os motoristas parem em lugares proibidos de estacionar, como por exemplo, as rotatórias. Isso acaba gerando discussões entre a passageira e o condutor. A assessoria assegurou que as empresas estão sendo notificadas para atender a lei e que a situação deve melhorar a partir de agora.
Procurados pela nossa equipe de reportagem, a empresa Pantanal Transporte informou que já começou a se reunir com os motoristas para explicar e discutir sobre a Lei Parada Segura.