A ‘bomba-relógio’ da previdência de Mato Grosso já explodiu e seu poder de fogo já levou quase R$ 700 milhões dos cofres públicos para tapar o rombo do MT Prev, em 2015. O dinheiro saiu direto da Fonte 100, verba que poderia ter sido convertida em obras, construção de hospitais e investimentos públicos suficientes para construir 20 mil casas populares. Os dados, contendo as informações contábeis da previdência, foram publicados no Diário Oficial do Estado (Iomat), no dia 28 de janeiro de 2016 e revelam que a saúde financeira do MT Prev já está na UTI.
Segundo os dados publicados no documento, a gestão do Governador Pedro Taques (PSDB), recebeu Mato Grosso com o saldo positivo na previdência de R$ 15,3 bilhões, no início de 2015. Contudo as informações, que constam no mesmo documento (publicado em 2016), aponta um saldo negativo (déficit) de R$ 694 milhões no ano passado.
O valor da dívida saltou de R$ 305 milhões, em 2013, para R$ 694 em 2015. Isso representou um acréscimo de 56% em menos de dois anos – as informações podem ser conferidas nos diários oficiais dos dias 30 de janeiro de 2014 e 30 de janeiro de 2015. O dado é de interesse público, previsto em lei e pode ser visto por qualquer cidadão que acesse o site do Iomat (www.iomat.mt.gov.br).
Estudo aponta que previdência de MT está dando ‘últimos suspiros’
Para complicar ainda mais a situação, os dados encontrados pela equipe do Jornal Circuito Mato Grosso, no estudo atuarial (balanço que faz previsões entre receita e despesas do fundo previdenciário e que é o ‘raio x’ da previdência que analisa a saúde dos fundos; além de mostrar as saídas para equalização das contas previdenciárias) apontou que Mato Grosso não tem saldo, nem investimentos para quitar essa dívida pelos próximos 75 anos.
O déficit alarmante vai crescendo com o tempo, até chegar à cifra absurda de R$ 23 bilhões. Com essa previsão apocalíptica que os pesquisadores apontaram no documento oficial apresentado pelo gestor estadual, os aposentados e pensionistas não estarão recebendo os benefícios pelos quais pagaram durante toda sua vida de trabalho.
Após a análise dos documentos publicados no Diário Oficial do Estado dos anos anteriores, o estudo atuarial não previa déficit na previdência e, ao contrário, apontava uma rentabilidade que iria crescendo gradativamente. (Veja a imagem).
Em 2013 a previdência possuía um saldo positivo de R$ 655 milhões; em 2014 o saldo, também positivo, era de R$ 373 milhões; por fim em 2015, o resultado previdenciário (receitas menos despesas), teve – ao inverso dos anos anteriores – déficit de R$ 661 milhões.
Ativos e inativos – quando a previdência começa a ficar insustentável
De acordo com a última pesquisa disponível do Ministério da Previdência, o estado de Mato Grosso possui 39.310 servidores na ativa, 21.661 servidores inativos e 6.110 pensionistas. O valor assusta, pois os inativos e pensionistas representam 41% dos ativos (os dados são de 2013). O aumento de funcionários subiu 6,58% (nos últimos dois anos) e na gestão Taques ultrapassou a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que estipula um percentual máximo 49% com despesas de pessoal.
Em 2015 foram gastos com pessoal o montante de R$ 5,84 bilhões; em 2014 o gasto foi de R$ 5,07 bilhões (46,43% da receita) e em 2013 foram gastos R$4,25 bilhões (43,62%). Assim como a LRF foi ultrapassada, os gastos com a previdência própria, também subiram de R$ 1,72 bilhão em 2014, para R$ 1,92 bilhão em 2015.
Para conter essa crescente dívida com a previdência, algumas medidas precisam ser tomadas imediatamente, diz a especialista e coordenadora jurídica Ruth Cardoso – que está há 22 anos no mercado e faz cálculos atuariais em mais de 300 municípios do Brasil.
Mudanças que os gestores sabem que não são bem vistas pelos servidores públicos, pois inclui aumento dos descontos com a previdência, pagamento de uma previdência complementar, aumento no tempo de contribuição, entre outras medidas pouco populares.
Segundo ela entre os possíveis motivos para os problemas previdenciários estão o número considerável de aposentados do ano passado, a crise financeira que o país sofreu, servidores entrando na administração por meio de concurso público e a morte de servidores – o que gerariam pensões e mais despesas para os cofres previdenciários.
Criação do conselho
Com a missão de gerir, investir e fiscalizar os recursos da previdência de Mato Grosso, a lei 560, de dezembro de 2014 criou uma comissão. Foram 12 meses até o que o Conselho Previdenciário – órgão máximo que vai gerir os rumos do MT Prev – fosse finalmente nomeado na gestão Taques.
A ativação do Conselho, previsto na lei, é fundamental para que o Estado consiga o Certificado de Regularização Previdenciário, sem o qual o MT Prev fica impedido de receber recursos federais.
Um ano depois da criação da lei, os conselheiros tomaram posse e fizeram sua primeira assembleia no dia 21 de janeiro de 2016.
Enquanto os meses passaram pouco se viu sendo debatido sobre a situação do Regime Próprio da Previdência de Mato Grosso (MT Prev). O presidente do órgão, Ronaldo Taveira justifica a demora com o “acontecimento de muitas coisas” e a nomeação dos membros teria esbarrado na burocracia das entidades públicas.
O servidor Umbelino Cordeiro Neves, que integra a coordenação do MT Prev, juntamente com o presidente – disse que houve burocracia e que isso teria atrasado a nomeação do Conselho fiscal.
‘Cadê os R$ 15 bilhões que estavam aqui?’
Com um patrimônio de quase R$ 15 bilhões em imóveis, a Previdência de Mato Grosso esteve durante dois anos (2013 e 2014) com superávit em suas contas previdenciárias. Contudo no balanço publicado em 2016, contendo os investimentos do MT Prev, esses imóveis não foram arrolados ao órgão. Segundo o presidente do MT Prev, Ronaldo Taveira, a divulgação dos dados – foi uma ‘maquiagem’ que o ex-governador passou na previdência para ocultar a verdadeira situação do Estado.
Taveira disse que não arrolou os imóveis, pois não sabe onde cada uma dessas matrículas estão. Ou seja, um ano após a gestão Taques receber o Estado, os responsáveis pela pasta ainda não sabem onde estão, ou se existem esses R$ 15 bilhões em imóveis. Questionado sobre a negligência, Taveira disse que não recebeu um estado em condições normais.
“Nós chegamos aqui, no final de maio. Muitas coisas deveriam ter sido feitas, mas infelizmente o atual governador pegou o estado da maneira que a imprensa sabe. Um estado com o VLT parado, obras da Copa inacabadas, com as finanças totalmente irregulares, com déficit. Quer dizer, nós não encontramos um Estado normal. Encontramos tudo alterado e para pior. Então, por isso, diversas coisas não foram feitas”, argumentou o representante de Taques no MT Prev.
Taveira explicou que não recebeu nenhum centavo nas contas da previdência e que estes imóveis arrolados ao órgão nunca foram catalogados. “O que você precisa entender é que nesse estudo o patrimônio da previdência em imóveis foi considerado no cálculo atuarial. Nós não consideramos esse patrimônio como sendo integralizado ao MT Prev, o que na realidade não está. O que nós temos é uma doação, que foi feita por meio de certidões, que dizem termos imóveis no estado inteiro. Por isso fizemos um convênio com o Intermat (Instituto de Terras de Mato Grosso) para localizar essas matrículas. Primeiro nós precisamos saber onde estão, para depois nós avaliarmos quanto vale cada um desses imóveis. Não foi feito nada nesse ano, nada foi considerado ainda”, pontuou.
Após um ano, gestores alegam desconhecimento
Apesar do suposto indício de fraude e crimes de improbidade administrativa, o presidente do MT Prev não fez nenhuma denúncia aos órgãos competentes como a Controladoria Geral do Estado (CGE) e nem para o Ministério Público Estadual (MPE). Contudo o que mais assusta é que um ano depois que ele assumiu, ainda não há informações precisas sobre os dados previdenciários. Ambas as informações foram confirmadas pelo próprio Taveira, durante a entrevista ao Jornal Circuito Mato Grosso.
“Até o final de 2016 queremos fazer os dados previdenciários serem os mais confiáveis possíveis. Realizaremos um senso que deverá fazer um ‘raio x’ do MT Prev. Ai teremos um dado real, que poderá diminuir aquele déficit ou até aumentá-lo”, confirmou o coordenador do MT prev, Umbelino Cordeiro Neves, na presença do presidente do MT Prev.
Umbelino confirmou que os R$ 15 bilhões em imóveis não existem e que não havia patrimônio algum no nome da previdência. “Quando nós fizermos o estudo atuarial, vamos considerar o dado atual que foi feito no ano passado: esses R$ 23 bilhões é o que eu deveria ter em poupança para a previdência ser sustentável por 75 anos. Por isso que se fala no déficit, pois nós não temos o dinheiro. Por que o estudo de 2015 não apontou o déficit? Por que ele considerou como se os R$ 15 bilhões em imóveis estivessem no nome da previdência e se estivessem isso daria um caixa positivo”, apontou.
Em termos gerais, segundo Umbelino, esses R$ 15 bilhões, renderiam no mínimo – considerando a taxa Selic, em torno de 10 a 12% ao ano – R$ 17 milhões. “O déficit da previdência hoje é de aproximadamente R$ 700 milhões. Então o que acontece? Com o rendimento você paga o déficit e ainda sobra dinheiro para investir. O que o governo passado fez? Ele pegou 360 matriculas de imóveis e passou para a previdência. Só que dentro dessas matriculas, não sabemos nem onde estão os imóveis, não temos escritura definitiva. O Governo fez só uma destinação”, concluiu.
Para o presidente do MT prev, a ‘maquiagem’ nos dados é uma irresponsabilidade muito grande dos ex-gestores. “A primeira coisa que eu falei quando cheguei aqui foi que nós não poderíamos mentir para nós mesmos. Pois estamos cuidando de vidas e patrimônios. Como que eu vou dizer que esse patrimônio está integralizado, se nem matriculado no nosso nome eles estão e nem sabemos onde é estão? É uma irresponsabilidade”, comentou Taveira.
Questionado pela equipe do jornal do motivo pelo qual, tanto tempo havia se passado e nada havia sido feito, Taveira desviou: “tudo tem uma ordem cronológica a ser seguida. Começou com a nossa nomeação, em maio de 2015; formação do grupo de trabalho – que são as nomeações da nossa assessoria- em outubro nós ainda estávamos nomeando nossa diretora administrativa – isso foi o Executivo que fez, não fomos nós aqui; E enquanto isso nós estávamos fazendo o estudo atuarial e só recebemos em dezembro, pois esse ano foi atípico para os especialistas atuariais”, concluiu.
‘Apagando fogo’
Durante entrevista com o presidente o MT Prev, Ronaldo Taveira, o dirigente disse que o governo encontrou tanta coisa em desordem no Estado, que algumas coisas – como a criação do conselho e as denúncias de irregularidades – foram sendo deixadas de lado. “O governo tinha tanto incêndio para apagar, que foi deixando de fazer algumas coisas. Para você ver no que resultou isso ai?”, resumiu Taveira.
As justificativas para os ‘deslizes’ vieram em seguida: “Nós não poderíamos mandar a lei para Assembleia, nem ter criado o conselho – pois não estavam nomeados os membros. O cálculo também não estava pronto. Mesmo assim, nós enviamos o projeto de lei complementar sem ouvir o conselho. Contudo, mais tarde decidimos retirá-lo da pauta de votação, pois seria algo ‘goela abaixo’ e nós não queremos fazer isso nesta gestão. Se isso não foi feito no passado não é problema nosso, se consideraram os imóveis como patrimônio, nós não poderíamos cometer o mesmo erro”, concluiu Ronaldo Taveira.