Ana, a caçula de três irmãos, era uma menina que estava sempre atrás dos meninos. Jogava bola, era a melhor na bolita, vivia de joelho raspado por causa do skate. Não gostava de Xuxa, achava Angélica uma chata, sempre preferiu Família Adams ao pequeno Príncipe. Estudou até os 13 anos, quando precisou sair da escola para ajudar em casa. Fazia o serviço doméstico para sua mãe trabalhar como faxineira em uma casa no Santa Rosa. Full time como eles diziam. Às vezes nem vinha pra casa. Ana era filha de uma mulher que veio do sul, e o pai um cafuzo do sertão nordestino. A mistura exótica funcionou. Não muito alta, cintura fina, seios salientes, lábios carnudos.
Foi quando os meninos começaram a correr atrás de Ana.
Logo aos 14, Ana conseguiu um primeiro namorado. Era Luiz. Filho da patroa de sua mãe. O menino, dois anos mais novo, era completamente apaixonado por Ana. Não precisou mais trabalhar em casa, voltou pra escola, começou a frequentar as melhores casas da noite cuiabana. A paixão fez que Luiz a tornasse imaculada, mas Ana era muito bonita pra isso. Luiz parte para umas férias com seus pais. Ana parte para sua primeira balada sozinha.
Foi quando os homens começaram a correr atrás de Ana.
Ana nunca mais procurou Luiz. Seu sucesso foi estrondoso. Conheceu algumas meninas que sabiam como descolar drinques, convites, roupas. Vodca e suco de uva, cigarro, um peguinha num baseado.
Logo Ana já adorava e exigia os presentes.
Um presente pra sair sábado, um presente pra ir ao cinema, um presente pra ir ao motel. Para Ana, a sua primeira gozada foi como um renascimento. Adorou. Queria foder todo dia. As amigas começaram a apresentar uns amigos com lancha em Manso, fazenda em Bom Jardim, jantares em Sampa. Ana já não parava em casa. Não ia à escola. Sua mãe, inclusive, perdera o Bolsa Estudo. Mas Ana não se importava. Fez uma tatoo de lacinho de presente nas costas, logo acima da marquinha sensual de biquíni. Ela agora era o presentinho.
Seu telefone não parava de tocar. Ana agora trepava com qualquer um. Homem, mulher, casal. R$ 400 a hora. Cocaína de segunda a domingo. Não cheirava às segundas porque ficava com sua mãe, que já não trabalhava mais. A casa estava toda pintada, móveis novos, seu pai de carro novo. E dá-lhe programa. E dá-lhe pó. E dá-lhe mais programa. E dá-lhe mais pó.
Na festa de 18 anos resolveu levar a família pra restaurante chique. Ana não comeu. Aliás, Ana não comia mais. Ana não tinha mais peitos salientes. Reflexo das noites mal dormidas e do excesso de cocaína. Em meio àquela ocasião que deveria ser de festa Ana dispara:
– Gente, não aguento mais fazer programa. Vou morrer de tanto cheirar cocaína. Odeio ser puta. Quero voltar pra casa, senão vou fazer uma besteira.
Silêncio absoluto. Os poucos segundos parecem uma eternidade.
– Mas, filha, como vamos pagar as contas? – pergunta desolada a mãe.
– Para de besteira maninha, daqui a pouco isso passa. – concorda o irmão mais velho.
Ana levanta e vai ao banheiro cheirar mais uma carreira.