Fotos Ahmad Jarrah
Yuri Ramires / Especial para o Circuito Mato Grosso
De segunda a sexta-feira, Leocádia Santana, 58 anos, faz uso de dois ônibus para ir ao trabalho e voltar, ou seja, quatro coletivos por dia. Ela, que mora no Bairro Parque Cuiabá e trabalha no Bairro Dom Aquino, sente os problemas do transporte público da Capital e não acredita em melhorias repentinas do sistema.
“Todo dia é a mesma coisa, um ônibus até o centro, e outro até o bairro onde trabalho. Na volta, tudo de novo. São veículos velhos, como meu marido diz, só está a carcaça. Não tem nenhuma qualidade para o usuário, fora o valor de R$ 3,10, que é caro para nenhum benefício em troca. Passo raiva, muito calor e me sinto desrespeitada”, lembrou.
Dentre os principais problemas que ela destacou, todos estão ligados à estrutura do veículo. “Portas com problemas, bancos que não comportam os passageiros e que estão bem degradados, fora a falta de climatização – precisamos de qualidade nisso. Não sei mais no que acreditar, já fomos iludidos com a promessa de melhorias e mais melhorias e nada, ao contrário, está cada vez pior”, reclamou a doméstica.
Hoje, Cuiabá conta com mais ou menos 372 ônibus destinados ao transporte público, administrado por três empresas: Pantanal Transportes (192 veículos); Norte-Sul (103) e Integração Transportes (77 ônibus). A frota é grande, no entanto, poucos veículos apresentam uma qualidade respeitosa ao usuário.
Exemplo disso foi a auditoria feita pela Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) nos ônibus da cidade, reprovando 100% dos veículos da empresa Expresso Norte-Sul. No entanto, mesmo sabendo disso, os ônibus continuam circulando pela cidade.
Na época, o secretário da Semob, Thiago França, explicou que a vistoria começou a ser feita em março, e só confirmou o que já se percebia na rotina de trabalho. “100% da frota desta empresa foi reprovada, por não atender as especificações. Ela é a que tem apresentado os maiores problemas para nós”, lembrou.
No começo deste mês, 32 ônibus seminovos
Fabricados entre 2010 e 2012 – da empresa Norte Sul começaram a circular na cidade. Eles estariam substituindo os reprovados. “Para melhorar o sistema do transporte coletivo será realizado um ajuste operacional e o usuário não será prejudicado. É uma medida em caráter emergencial, até que um novo edital para o transporte público seja publicado até o final do ano”, disse Thiago.
Colocar veículos seminovos para circular não foi uma boa solução para a presidente de, ao menos, dez bairros de Cuiabá que, liderados por Marcos Baiano, protocolaram no Ministério Público Estadual (MPE), uma denúncia contra a Expresso Norte-Sul, alegando que a vida dos moradores é afetada por conta das constantes falhas que a frota apresenta.
“Os moradores é que estão sendo punidos. Todo dia algum ônibus que faz a rota na região dos bairros do Coxipó apresenta problemas, não é possível que isso não seja resolvido pelo poder público”, disse.
Assinaram o documento lideranças dos bairros Nova Esperança I, II, III e IV; Industriário I, II, III e IV; Pedra 90; Pascoal Ramos e outros da mesma região.
Contrato vem sendo descumprido
A reportagem entrou em contato com o secretário Thiago França, para pedir o contrato de concessão do serviço, mas o gestor explicou que seria difícil consegui-lo, uma vez que o documento está sendo contestado pelo Ministério Público do Estado e, por isso, estaria em posse da Procuradoria e não poderia ser disponibilizado.
No entanto, em fevereiro deste ano, o Circuito Mato Grosso divulgou alguns pontos do contrato que não estavam sendo cumpridos, principalmente no que diz respeito à faixa etária máxima de quatro anos e meio dos veículos. “50 veículos têm entre nove e dez anos, sendo usados diariamente por diversos usuários cuiabanos”, lembrou a reportagem na época.
Em março o jornal realizou outra reportagem quando a Prefeitura de Cuiabá, através da Secretaria de Mobilidade Urbana (SMU), começou uma vistoria em toda a frota de ônibus das empresas Norte e Sul, Pantanal e Integração. A frota da Norte e Sul foi reprovada por motivos diversos.
Os veículos colocados esse mês para rodar na Capital seriam dos anos de 2010 a 2012 e ganharam uma nova pintura, além de passar por outras reformas.
Nesta semana, a reportagem fez um levantamento com as placas aleatórias de alguns ônibus da cidade e constatou que muitos estão com a idade de frota muito além do permitido em contrato, incluindo as unidades que foram ‘reformadas’ e colocadas nas ruas este mês, como é o caso do ônibus da empresa Expresso Norte e Sul, que têm unidades de 2008.
Pior ainda é a situação dos veículos da Integração Transportes, que têm em sua frota diversas unidades com ano 2005/2006, ou seja, já possuem nove anos.
A Pantanal Transportes também apresentou unidades de 2005, 2006 e 2008, ou seja, todos fora da faixa etária correta.
Os veículos consultados da Norte-Sul estão com impedimento judicial, por conta de ações trabalhistas registradas na Justiça.
Más condições
A climatização, que deveria acontecer em 80% da frota; abrigos em todos os pontos de ônibus da cidade; e a acessibilidade que deveria constar em 95% dos veículos são pontos que também estão no contrato e não estão sendo cumpridos.
Uma nova licitação do transporte público de Cuiabá está sendo esperada desde janeiro deste ano, quando o prefeito Mauro Mendes assinou o decreto do aumento da tarifa. A última licitação foi realizada em 2004, venceu em 2012, mas foi prorrogada até 2019. A previsão é que até o final do ano, o novo processo seja realizado.
Em outras cidades
O transporte coletivo dos municípios, que deveria ser prestado com qualidade diante da grande demanda da população que ainda usa o ônibus como o único meio de transporte, deixa a desejar. Além da precariedade em Cuiabá, a situação é parecida em outras cidades, como Rondonópolis e Sinop. Por outro lado, no que diz respeito ao transporte interestadual, a qualidade parece ter melhorado, com algumas exceções.
Em Rondonópolis, a cidade com o segundo maior Produto Interno Bruto (PIB) do Estado, apenas uma empresa detém a concessão do transporte, a Transporte Coletivo Cidade de Pedra (TCCP). Já a tarifa, um pouco salgada para o bolso dos rondonopolitanos, é fixada hoje em R$ 3,10.
Tereza da Silva, Terezinha como é conhecida, é uma das que dependem do transporte. Para ela o valor é alto tendo em vista que a cidade não é tão grande. “Eu acho caro, sim. A cidade não é tão grande e o valor deveria ser menor, até porque o serviço ainda deixa a desejar”, lembrou a trabalhadora.
Vale ressaltar que, para os usuários que possuem o cartão transporte, a tarifa é 0,10 centavos mais barata, R$3. A novidade neste ano foi que o prefeito Percival Muniz sancionou a Lei do Passe Livre aos estudantes.
Já em Sinop a tarifa normal custa R$ 3 e os estudantes pagam R$ 2,50. Atualmente, 18 ônibus andam pela cidade, todos adquiridos de 2010 em diante.
Em Cáceres, o número de ônibus é bem reduzido, apenas três veículos para toda a cidade. Segundo a Prefeitura local, a quantidade atende bem a demanda da cidade, uma vez que moradores utilizam de outros meios de transportes para se locomover, como bicicletas.
Apesar de o serviço ser ofertado, aparentemente, de forma reduzida, o valor da tarifa é de R$ 3.
Por outro lado, qualidade nas rodovias
Atualmente, o Sistema de Transporte Coletivo Rodoviário Intermunicipal de Passageiros é composto pelo Sistema Convencional, Sistema Alternativo e Sistema Semiurbano. Conforme a Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Mato Grosso (Ager-MT), no primeiro sistema, 15 empresas atuam com a frota de 442 veículos cadastrados junto ao órgão, cada uma com a capacidade média de 40 passageiros sentados.
O Sistema Alternativo é aquele operado com veículos tipo van ou micro-ônibus com capacidade para até 20 passageiros sentados. “O diferencial é o fato de buscar e levar o passageiro em local previamente definido por este. Operam no serviço atualmente 18 empresas, com 127 veículos”, lembrou a presidência da Ager.
Já no Semiurbano, operado por veículos com característica urbana, cujo atendimento é para o município num raio de até 75 km da Capital, operam 4 empresas com 56 veículos, cuja idade média da frota é de 8,78 anos.
“A renovação da frota é uma ação individual de cada empresa para manter os padrões mínimos exigidos de segurança, higiene e conforto ao usuário”, explicou a Ager.
Em conjunto com a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), uma fiscalização está sendo realizada dentro de um cronograma estabelecido e deve se encerrar no dia 06 de outubro. Depois disso será elaborado um relatório sobre a situação do serviço ofertado à população, cabendo multa às infrações detectadas.
Confira mais detalhes da reportagem na edição número 555 do Jornal Circuito Mato grosso