Fotos: Ahmad Jarrah / Circuito MT
Na tarde desta sexta-feira (4) irão para as ruas do Centro de Cuiabá gays, lésbicas, travestis, transexuais, bissexuais, heterossexuais, pais, mães, crianças, idosos reivindicar os direitos e dar visibilidade à luta LGBT. O fundador do movimento LGBT em Mato Grosso, secretário de comunicação da ONG Livre Mente e membro da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Clóvis Arantes, afirma que o evento é para todos que são a favor da igualdade de direitos e contra o preconceito.
O evento está na sua 13ª edição. Este ano, a concentração será na Praça Ipiranga, às 14h, e deve acabar em frente a Câmara dos Vereadores de Cuiabá. Para Clóvis Arantes, o evento é marcado pela alegria e expontaniedade, mas sem esquecer do viés político. "A Parada é um ato político e assim será, mas não deixaremos de lado a alegria", comenta.
O Circuito Mato Grosso conversou com o ativista sobre o principal evento da comunidade LGBT, política e ativismo.
Confira entrevista na íntegra:
Circuito Mato Grosso – A parada é vista por muitos como uma festa, e não como ato político. Como vocês veem isso e como pretendem quebrar o paradigma de festa.
Clóvis Arantes – Nós não quebraremos paradigmas de pessoas que são preconceituosas, nós temos que construir novos paradigmas. Até por que os fundamentalistas religiosos não querem ser convencidos que os LGBTs tem direitos. Nós não precisamos que as pessoas aceitem isso, nós precisamos que as pessoas respeitem. Nós devemos construir novos paradigmas revelando uma nova humanidade, e essa cabe todas as diversidades. Não tem por que excluir ninguém e a diversidade tem que ser respeitada.
A Parada é um ato político e assim será, mas não deixaremos de lado a alegria. A marca da parada é dar visibilidade, e não tem jeito de você dar visibilidade para uma população que é tão invisibilidade. Só é lembrada no noticiário policial, sem dar para essa parada um cunho de festa. Um cunho de alegria. As pessoas que falam que “A parada é uma micareta fora de época”, elas não fazem críticas ao carnaval à outras micaretas. Se eles quiserem chamar de micareta até podem, mas a nossa “micareta” é uma micareta da cidadania, para além da festa da alegria, a reinvindicação pelo nosso direito e dizer que nós existimos dá visibilidade à população LGBT é um ato político. Essa população muitas vezes não pode ir ao shopping, não pode estar na rua, não pode demonstrar afeto… Impedir que as pessoas façam isso é impedir que as pessoas existam.
Por exemplo, em 13 anos de parada, nós nunca tivemos um B.O., nem das pessoas que estão na parada, nem da população com a parada. Então, não dá para dizer que não é uma parada da paz, da alegria, da diversidade, do respeito… E para além de tudo isso é a reafirmação dos direitos. Quem diz que não, é por que não quer reconhecer nossos direitos.
C.M.T.: O que as pessoas podem esperar da programação da Parada neste ano?
C.A.: Este ano nós teremos além das atrações comuns. Nós teremos cantores sertanejos, cantores de MPB.. Teremos uma diversidade de atores na cena cultural. Apresentação de dança, rappers, DJ, cantores de MPB, cantores de MPB, então é a parada da diversidade, MESMO. Tanto na proposta política quanto na proposta cultural.
C.M.T. – Na Parada da Diversidade Sexual de São Paulo, em Junho deste ano, uma travesti saiu em um trio elétrico simulando a crucificação, em alusão aos julgamentos que sofre diariamente por parte de todos os setores da sociedade. O secretario de Estado de Segurança Pública, Mauro Zaque, em entrevista para um site de notícias da região afirmou que caso os participantes da Parada da Diversidade de Cuiabá façam atos parecidos, podem ser presos por cometer o crime de intolerância religiosa. Como você avalia essa declaração?
C.A.: Eu acho que foi uma infelicidade dele dar essa entrevista. Nem ele pensou no que ele estava dizendo. Por que a manifestação que aconteceu na parada de São Paulo não foi uma manifestação da organização e sim de pessoas que estavam na Parada. A nossa parada é da diversidade, é livre. Nós, enquanto organização, não incitamos as pessoas contra a religião, até por que a maioria dos LGBTs são cristãos.
A Segurança Pública está para todos os cidadãos e cidadãs como protetores, e assumir esse papel. Nós não podemos impedir as pessoas de se manifestarem. Nós tivemos manifestações nos últimos dias de desrespeito as pessoas, de desrespeito às mulheres, de desrespeito aos políticos, e ai? Nós vamos dizer que essas pessoas não podem se manifestar? Ela podem se manifestar por que são livres para isso.
A comissão sempre presa pelo respeito. Não incitamos a violência, desrespeito. A parada é um espaço não só da população LGBT, deve ser um espaço de todas as pessoas que lutam por respeito e por direitos humanos.
C.M.T.: Como primeiro militante da causa LGBT no Estado, como você enxerga essa nova cara dos militantes em Mato Grosso.
C.A.: Essa juventude é muito forte na organização da Parada. Nós temos quase três meses em que nós nos reunimos toda segunda-feira, e essas reuniões contam com 20 a 30 jovens participando da organização da parada. Essa juventude entende que o momento é de protagonismo, de eles assumiram o movimento LGBT – que está no movimento estudantil, no movimento político, de mulheres, nos sindicatos. Não dá mais para restringir o movimento LGBT à grupos, ele é muito maior.
Hoje, nós temos um Conselho Municipal, e nós temos a representação de 15 instituições: sociedade civil, governo e instituições públicas. A nova cara, é uma cara jovem, politizada, e de pessoas que não aceitam mais retrocesso. É para frente que nós queremos caminhar.
C.M.T.: Qual importância da criação e atuação do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual no segundo estado mais violento do país?
C.A.: O Conselho é um espaço de criação de políticas públicas. E é ele quem faz a cobrança efetiva do Executivo e Legislativo na implementação de políticas públicas. Então, esse espaço para nós é de fundamental importância.
C.M.T.: O grupo LGBT tem um histórico de lutas políticas em busca de direitos sociais, onde se destacaram grandes nomes, como o deputado federal Jean Willys (Psol-RJ). Porém, muitos ainda não fazem parte ou não se interessam pelo ativismo. Como você analisa esse cenário e como chamar essa parte da população para o movimento.
C.A.: Nós queremos chamar toda a população LGBT para o movimento, porém, existir como gay, lésbica, travesti e transexual já uma militância. Em uma sociedade preconceituosa – racista, machista, homofóbica como a nossa, faz da nossa existência uma militância. Mesmo a pessoa que não vem para a Parada, já milita no trabalho , na família… Existir enquanto LGBT é uma militância.
C.M.T.: Clóvis, você acredita que a Câmara está tomada por fundamentalistas?
C.A.: Como as Câmaras do Brasil inteiro, não só pelos religiosos, mas por todos os fundamentalistas. Políticos de visão estreita, que não conseguem se abrir pro novo, pra diversidade.
C.M.T.: Os LGBTs se sentem representados lá dentro?
C.A.: Nós exigimos ser representados dentro da câmera, como parte da sociedade cuiabana. Essa sociedade tem heterossexuais e homossexuais. Os vereadores tem que representar o povo cuiabano, o povo que mora, que paga imposto, que contribui efetivamente em todos os espaços dessa cidade. Nós queremos estar representados, e não só por um vereador, e sim por todos. Pois todos devem ter o compromisso de lutar pelos direitos humanos. E nós, só lutamos por direitos humanos, não lutamos por privilégios.
Quando nós cobramos dos vereadores a aprovação de uma lei que puna os estabelecimentos comerciais que discriminarem por conta de orientação sexual, nós não estamos querendo privilégios. Nós estamos dizendo que todo o comércio de Cuiabá tem que está preparado para receber o gay, a lésbica, a transexual, a travesti. Por que o nosso dinheiro não é diferente do dinheiro do heterossexual.
Ninguém pergunta se sou gay ou lésbica no momento de pagar meu imposto, por que irão perguntar quando estão em um bar com meu companheiro ou minha companheira? Por que irão me descriminar?
C.M.T.: Quais os tipos de Políticas Públicas devem ser implantadas emergencialmente no estado?
C.A.: Primeiro a educação. Precisamos que o município de Cuiabá discuta de forma efetiva como é que nós vamos fazer para evitar a evasão escolar dos gays, lésbicas e travestis. A travesti entra na escola, mas não permanece por que sofre muito preconceito. Na saúde, precisamos trabalhar de maneira específica a mulher lésbica e a travesti e transexual.