Marco Aurélio Marrafon, secretário de Estado de Planejamento da gestão Pedro Taques (sem partido), possui uma vida dedicada às leis. Nascido em São Paulo, Marrafon se mudou aos sete anos para Juara, município que fica a 664 km de Cuiabá. Ao concluir o bacharelado em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), outra mudança, dessa vez, para Curitiba (PR), onde cursaria o mestrado na Universidade Federal do Paraná (UFPR) na área de Direito do Estado. O apreço pela academia fez com que o especialista legal fizesse doutorado na Università degli Studi di ROMA TER, na Itália, credenciando-o, entre outras coisas, a ser o presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), além de ser docente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Um curriculum desse nível chamou a atenção do atual governador de Mato Grosso, que o convidou para ser seu assessor jurídico na época em que ainda era senador pelo PDT, mas a relação de ambos é mais antiga, que segundo Marrafon, “começou quando fui aprovado num concurso na Procuradoria da República, quando ainda estava na faculdade. Fui estagiário do Pedro Taques”, lembra ele.
Com a vitória nas eleições majoritárias de 2014, Taques fez o convite para que Marrafon fizesse parte do primeiro escalão de sua gestão. Em entrevista ao Circuito Mato Grosso, ele dá suas primeiras impressões nesse início de governo, sem poupar críticas à gestão passada e apontar possíveis soluções num dos assuntos mais polêmicos do Estado: a continuidade das obras do VLT.
Circuito Mato Grosso: No acordo para desenvolvimento “Brasil Central”, seis áreas prioritárias foram escolhidas para serem os eixos que nortearam as ações do projeto: agropecuária, logística, industrialização, educação, empreendedorismo e inovação. Já existe algum projeto específico, ou ao menos que tenha conversas adiantadas, de alguma dessas áreas?
Marco Marrafon: Havia um estudo na Secretaria de Assuntos Estratégicos afirmando que Mato Grosso possuía uma base econômica e social que se vincula com a perspectiva de futuro do Brasil. Os Estados do Centro-Oeste, mais Tocantins e Rondônia, podem se tornar o fiel da balança comercial e não têm as mesmas amarras históricas do processo de industrialização da década de 1950, nem as da colonização da região Nordeste. Nas reuniões, avançando um pouco nas pautas, percebemos que era necessário propor uma entidade federativa nova, que não existia ainda no país, que é a Agência Interestadual de Desenvolvimento. Essa agência deveria receber alguns produtos delegados, ter autonomia financeira e promover a união política em torno das demandas que a região possui perante a União. Temos também a ideia de formarmos uma nova classe média rural, transformar o agricultor familiar num pequeno empreendedor rural. Promover um novo modelo de industrialização baseado na inovação tecnológica. Queremos também fomentar o crescimento de cidades ao longo do corredor logístico. Não adianta investir num modelo do século passado, pois temos problemas de logística e de oferta de energia. O cluster de startups é interessante, e não faríamos isso sem um conhecimento teórico que também concilie a prática, como ocorre no Sistema S. Estudando as opções, percebemos que o melhor caminho seria a criação de uma agência de desenvolvimento não a partir da União, e sim dos Estados Federados.
C.M.T.: Há outros concursos públicos previstos para 2015 ou 2016?
M.M.: A Lei de Diretrizes Orçamentárias que está na Assembleia Legislativa para aprovação prevê alguns concursos públicos. Além do Detran, tem a Procuradoria do Estado, na área da saúde e educação. No que chamamos de núcleo duro (Segurança, Saúde e Educação), vai ter chamamento, vai ter concurso. Agora, o que temos que levar em conta é que a folha de pagamento de pessoal está crescendo muito. Ainda estamos pagando o aumento salarial feito na gestão passada. Isso elevou muito a despesa de pessoal. E a gente precisa adequar isso à Lei de Responsabilidade Fiscal. Como estamos tomando uma série de medidas para nos adequar à Lei de Responsabilidade Fiscal naquelas áreas que são de reposição e prioridades governamentais, então há previsão de concurso. Deve haver concurso na área de segurança (delegados e agentes), Procuradoria do Estado, educação (professor), e agentes de saúde, tanto analistas quanto técnicos. Esses seriam os priorizados. Tem outros concursos previstos na LDO, mas isso dependeria desse fluxo de Lei de Responsabilidade Fiscal que é preciso repor pessoas. Na Sinfra, por exemplo, há previsão para 2017 de o quadro de servidores cair para 20 pessoas, em virtude de aposentadorias. Há quadros que precisam ser repostos, então para esses casos é possível que haja concurso.
C.M.T.: A Seplan trabalha com alguma margem de aumento para a LOA 2016 em relação a LOA 2015?
M.M: As receitas totais de 2015 são da R$ 13,6 bilhões, mas estimamos que o gasto efetivo deverá ter R$ 1 bi a mais, o que repres
enta uma certa defasagem em relação ao previsto e realizado. Mas R$ 14,6 bi é o gasto que se realizou em 2014, então estamos mantendo um crescimento médio já esperado. Isso permitiu que fizéssemos uma projeção, uma Lei Orçamentária com base real em 2016, pois já sabíamos que esse valor ficaria em torno de R$ 14,6 bilhões ou R$ 14,7 bilhões neste ano. É melhor fazer uma política orçamentária mais próxima da realidade para que os órgãos se planejem melhor. Então a gente fez um estudo, contando com o apoio da Sefaz e da equipe da Seplan, para fazer uma análise a partir de uma série histórica que projetasse uma LOA real, que em 2016 deve ficar em torno de R$ 16 bilhões.
C.MT.: No relatório da pesquisa sobre o planejamento estratégico no Poder Executivo estadual, disponível no site da Seplan, os órgãos públicos estaduais se queixaram de que não tinham apoio da Seplan nas etapas posteriores ao planejamento estratégico. A Seplan acompanha o desenvolvimento desses planos?
M.M: Essa é uma grande transformação que temos em termos de gestão e planejamento. Não basta planejar, é preciso fazer que esse planejamento se concretize e isso demanda um diálogo intenso com os órgãos. Por isso fizemos a pesquisa para diagnosticar os principais problemas, que são históricos, não exclusivos deste governo. Então avançamos para esse planejamento, desde o plano de governo fizemos uma orientação com todos os órgãos e secretarias das orientações estratégicas, que seria um planejamento estratégico governamental de curto prazo para fecharmos 2015 já dando subsídio à LOA de 2016, e de médio prazo, para dar suporte ao Plano Plurianual. Então já fizemos todo esse diálogo. A partir daí começamos a materializar esse planejamento no chamado acordo de resultados. Mas não adianta cobrar esses acordos de resultados se a Seplan não apoiar com orçamento, que é a grande questão que se coloca. Esses acordos de resultados têm o diferencial de já vir acompanhados de uma previsão orçamentária compatível com o que eles queiram realizar. A partir daí, como já chegamos ao ponto de orçamentação, temos feito o monitoramento dessas ações. A partir de setembro já saberemos o que foi proposto e cumprido, conhecer prazos e índices de execução. Não se trata apenas de exigir. É exigência combinada a condições. A grande mudança é que temos agora a metodologia integrada de ações.
C.M.T.: Boa parte dessas dívidas foram contraídas utilizando o argumento da necessidade de recursos para viabilizar obras de mobilidade urbana, como o VLT. A Seplan tem algum planejamento para retomar essas obras, e os custos que isso irá acarretar?
M.M.: Temos dialogado com os secretários de Assuntos Estratégicos e de Cidades, pastas responsáveis pelo assunto. Acompanhamos o tema para tomar as ações que deverão ser tomadas. O problema é que hoje a matéria está judicializada e não está havendo um acordo sobre seu cumprimento. De um lado o consórcio quer mais recursos, quer readitivar, mas não se aditiva o RDC e eles também não cumpriram a parte deles em relação aos projetos executivo e básico. Não podemos colocar dinheiro público em iniciativas que não tenham projetos. Isso é uma coisa muito séria. Por isso a questão está judicializada, então a justiça irá dizer como ficará esse contrato ou não. Imagino que uma das soluções possíveis é buscar na iniciativa privada – eventualmente até o próprio consórcio – que eles terminem a obra e ganhem uma concessão para operar o serviço de modo que ele pague seus custos. Mas a determinação é terminar em condições contratuais que sejam dignas, pois não podemos admitir que a perda de dinheiro público.
C.M.T.: A dívida pública é estimada em R$ 6,5 bilhões, valor que é quase o dobro do orçamento previsto para as secretarias de Segurança, Saúde e Infraestrutura juntas. Como o governo estuda diminuir esse passivo?
M.M.: Temos alguns gargalos, não se consegue sumir com a dívida de uma hora para outra. A grande estratégia é restabelecer a capacidade de investimento no Estado sem se endividar. Então o problema hoje que temos é em relação a pessoal. Sabemos que os servidores precisam de uma remuneração digna, mas o crescimento de gastos com pessoal é muito maior do que crescimento da receita. Isso significa que num futuro próximo as coisas vão trombar. A máquina precisa ser mais leve e eficiente. O investimento da LDO 2016 está previsto para 9%. Esse percentual, que irá incidir sobre os R$ 16 bilhões, já consegue dar algum poder de resposta. Teremos mais condições de fazer obras com recursos próprios, deixando de contrair dívidas; se não, você entra num ciclo. O que não quer dizer que operações de crédito não possam ser feitas. Há momento em que as operações de crédito são necessárias. Mas a política é cumprir todas as obrigações para evitar que as dívidas se alonguem. Já sabemos que 2015/2016 tivemos uma herança que deixou uma dívida muito grande, da ordem de R$ 1 bilhão a cada ano.
C.M.T.: O governo está preocupado ou mais preocupado com a dolarização da dívida do Estado já que o dólar nunca esteve tão caro? A parcela da dívida pública dolarizada que venceria em setembro já foi quitada?
M.M.: Temos uma previsão da dívida referentes a operações de créditos de R$ 1 bilhão, isso perante o Banco do Brasil e o Bank of America. E tem outra previsão de gastos com operação de crédito de R$ 1 bilhão em 2016 naquilo que chamamos de “serviços da dívida”, que é amortizar a parcela devida e pagar os juros correspondentes. Quando explodiu o dólar se tornou uma coisa dramática porque ele foge das previsões iniciais orçamentárias e aumenta muito a dívida. Estima-se que a parcela de setembro, que girava em torno de R$ 110 milhões ou R$ 115 milhões, pode chegar a R$ 150 milhões dependendo da alta do dólar. Na contratualização não foi feito nenhum mecanismo de blindagem e proteção de um eventual aumento, e isso é muito chocante. Esse contrato existe e é vigente e possui uma série de problemas, pois como ele é internacional, você não consegue renegociar de maneira simples. Tem que fazer uma proposta, chamar o banco para discutir, elaborar uma proposta legislativa, aprovar na Assembleia, aprovar no Senado Federal e ganhar o aval do Ministério da Fazenda. O secretário Paludo tem trabalhado nessa negociação. O Ministério da Fazenda estava muito refratário, pois eles não queriam negociar nem liberar operações de crédito. Agora é que começou a mudar. Então houve avanços mas precisamos melhorar esses processos. Estudamos fazer um seguro dessa dívida, para nos proteger da alta do dólar. Um calote da dívida traria muito mais prejuízos, pois isso rebaixaria nossas notas de investimentos. A determinação governamental hoje é honrar, pagar dívida.