Deputados federais que votaram contra a primeira proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e, depois, se posicionaram a favor argumentaram que o primeiro texto sobre o assunto era muito abrangente.
O G1 procurou os 28 deputados federais que mudaram o voto em relação à proposta anterior e conseguiu ouvir 18.
Para assegurar a aprovação da nova versão, uma manobra regimental excluiu da idade penal de 16 anos os crimes de tráfico de drogas, lesão corporal grave e roubo qualificado. A versão anterior, que incluía esses três crimes, além de crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte, tinha sido rejeitada um dia antes.
Um dos parlamentares que mudaram o voto chegou a informar, por meio de sua assessoria, que errou ao votar. Dois deputados que votaram a favor da primeira versão e se abstiveram na segunda versão afirmaram que mudaram para protestar contra a decisão do presidente da Casa de colocar em votação dois textos semelhantes.
Para virar lei, o texto ainda precisa ser apreciado mais uma vez na Câmara e, depois, ser votado em outros dois turnos no Senado.
Manobra criticada
Durante a sessão, diversos deputados acusaram o presidente da Câmarax, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de “golpe” por colocar em votação um texto parecido com o que já havia sido rejeitado.
O deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), que se declara favorável à redução da maioridade penal, votou "sim" para a primeira proposta e se absteve de votar quando a segunda versão foi colocada em pauta.
"Eu me abstive em protesto contra a manobra que o presidente [da Câmara, Eduardo Cunha,] e o colégio de líderes estão fazendo, que está virando rotina. Isso precisa ter um freio", disse Castro, que é colega de partido de Cunha.
Questionado sobre se o protesto tem relação com o episódio em que Cunha descartou o relatório de Castro e levou direto ao plenário a proposta de reforma política, Castro disse ao G1 que separa problemas pessoais da questão política. "Se fosse birra, eu teria votado contra a redução da primeira vez", disse.
O deputado Júlio Delgado (PSB-MG), que votou contra a redução na primeira oportunidade, decidiu pela abstenção na votação da segunda versão porque não concordou com a forma pela qual Cunha colocou o assunto novamente em votação, segundo informou a assessoria de imprensa do parlamentar.
Nesta quinta-feira, Cunha contestou deputados do PT e de outros partidos que o acusaram de “golpe”. Ele disse que as críticas são “choro de quem não tem voto” e alegou que respeitou o regimento interno da Câmara.
Pedido de voto
Castro afirmou ter conhecimento de que Cunha ligou a parlamentares para tentar convencê-los a votar "sim" ao segundo texto. O deputado disse, entretanto, que não tem conhecimento de um deputado que tenha mudado de voto após ligação de Cunha.
O deputado Marcelo Matos (PDT-RJ), que se absteve na primeira votação e votou "sim" na segunda disse que recebeu ligação de Cunha, mas afirmou que o presidente da Casa "não falou nada demais". "Eu disse a ele que eu votaria sim. Não houve nenhuma interferência", afirmou.
Nesta quinta, Cunha atribuiu a mudança do placar em menos de 24 horas à pressão sofrida pelos deputados nas redes sociais. Diante das afirmações de deputados ouvidos pelo G1 de que Cunha chegou a procurá-los entre uma sessão e outra, Cunha admitiu que ligou para uma parte, mas apenas para organizar a votação.
“Eu liguei para deputados para ver se iam votar, como fiz anteontem e na hora do plenário. Quem vinha, se vinha, se não vinha, se vinha votar para eu encerrar a votação [e não esperar à toa”, disse o presidente da Câmara.
Veja abaixo as justificativas apresentadas por 16 parlamentares que mudaram o voto ouvidos pelo G1.
CONTRA A PEC NA PRIMEIRA VOTAÇÃO E A FAVOR NA SEGUNDA
Celso Maldaner (PMDB-SC)
Segundo a assessoria, o deputado sempre teve posição clara de que só seria favorável à redução se fosse para crimes hediondos. Na terça, achou que projeto era muito abrangente e dava margem a interpretações diferentes. Como a nova proposta restringiu a crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte, votou a favor.
Dr. Jorge Silva (PROS-ES)
“O primeiro texto incluía vários crimes, principalmente aquele que fala sobre tráfico de drogas e entorpecentes, que com certeza nós iríamos implodir um sistema carcerário nosso caótico, já superlotado. […] Como foram retirados alguns tipos de crime […] e diante da demora que teríamos em mudar o ECA, tomei essa decisão de mudar meu voto.”
Dulce Miranda (PMDB-TO)
Segundo a assessoria, a deputada sempre foi a favor da redução para crimes hediondos, mas avaliou que primeiro texto era muito abrangente.
Eros Biondini (PTB-MG)
“Originalmente, meu posicionamento era contrário [à redução], mas não podemos ignorar o clamor da sociedade. […] Concluí, em uma consulta pública nas redes sociais, que era razoável esse limite [da nova emenda].”
João Paulo Papa (PSDB-SP)
"Mudei de posição porque houve alterações importantes no texto, que se restringiu aos crimes hediondos e contra a vida e manteve o regime diferenciado de internação para esses casos. Acredito que a proposta aprovada se aproxima dos anseios da população".
Kaio Maniçoba (PHS-PE)
“Não se trata de mudar de ideia. […] Assim como parcela majoritária da população brasileira, também entendo que a impunidade é um dos grandes males no tocante à violência. Desta forma, sou favorável à redução em um contexto em que esteja restrita a crimes de máxima gravidade.”
Mandetta (DEM-MS)
“O que me pesou [para votar ‘não’ no primeiro texto] foi a abrangência do texto, que era muito vago e só deixava fora, praticamente, o furto. […] O que votei sim é mais delimitado: crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte”
Paulo Foletto (PSB-ES)
“No texto de terça estava incluído o tráfico de drogas, crime cometido em sua maioria por uma geração que tem como característica ser uma população periférica, pobre e negra, que não vê no Estado o suporte necessário. […] Já no texto de quarta, focou-se no crime hediondo, no latrocínio, no estupro. Isso aí merece outra punição.”
Rafael Motta (PROS-RN)
"Entendo que a sociedade clama por essa redução da maioridade penal e este novo texto da PEC, que foi votado na noite desta quarta-feira, contempla apenas crimes hediondos. […] Já o substitutivo discutido na terça continha outros crimes além dos hediondos, como o roubo."
Subtenente Gonzaga (PDT-MG)
“Entendi que o primeiro texto não tinha eficácia e que mudanças no ECA seriam capazes de resolver essa situação. Mas houve reivindicação da minha base eleitoral e me senti mais à vontade para votar sim [no segundo texto].”
Valadares Filho (PSB-SE)
"Mudei meu voto em virtude de terem ficado no novo texto somente os crimes hediondos. No texto de terça tínhamos outros crimes, o que poderia até gerar interpretações. Portanto, com a nova proposta, foi possível votar sim."
Waldir Maranhão (PP-MA)
“Posicionei-me contrariamente à [primeira] proposta por entender que alguns crimes de menor potencial ofensivo. […] Contudo, no momento em que o novo texto suprimiu os crimes menos gravosos, meu posicionamento em relação à PEC não poderia ser outro, que não a favor da matéria.”
O G1 procurou os deputados Abel Mesquita Jr (PDT-RR), Evair de Melo (PV-ES), Expedito Netto (SDD-RO), JHC (SDD-AL), Mara Gabrilli (PSDB-SP), Marcos Abrão (PPS-GO), Marcos Reategui (PSC-AP), Sinval Malheiros (PV-SP) e Tereza Cristina (PSB-MS), mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
ABSTENÇÃO NA PRIMEIRA VOTAÇÃO E A FAVOR DA PEC NA SEGUNDA
Lindomar Garçon (PMDB-RO)
Segundo a assessoria, “o deputado temia” que adolescentes utilizados pelo tráfico de drogas fossem presos”. “Como no segundo não há essa previsão, ele mudou de posição.”
Marcelo Matos (PDT-RJ)
“Desde o primeiro momento, eu votaria sim [a favor da redução]. Como houve determinação do partido de votar não, conversei com pessoal do partido e me abstive. Para não contrariar o partido na primeira votação, me abstive e avisei que voltaria sim se o tema voltasse.”
O G1 procurou o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
A FAVOR DA PEC NA PRIMEIRA VOTAÇÃO E CONTRA NA SEGUNDA
Arnon Bezerra (PTB-CE)
Votei ‘sim’ na primeira vez porque [o texto] envolvia a parte do tráfico de drogas, que foi retirada. Todo jovem que comete um crime, geralmente, está sob efeito de droga. […] Depois, quando foi retirado esse crime, achei desnecessário [reduzir a maioridade] para os outros crimes.”
Penna (PV-SP)
Segundo a assessoria, a posição do deputado sempre foi contrária à redução da maioridade penal, mas, na primeira votação, ele se equivocou e registrou voto "sim" em vez de "não". Na segunda votação, ele votou contra a redução da maioridade.
A FAVOR DA PEC NA PRIMEIRA VOTAÇÃO E ABSTENÇÃO NA SEGUNDA
Marcelo Castro (PMDB-PI)
"Sou a favor da redução da maioridade penal. Eu me abstive em protesto contra a manobra que o presidente [da Câmara, Eduardo Cunha,] e o colégio de líderes estão fazendo, que está virando rotina. Isso precisa ter um freio."
CONTRA A PEC NA PRIMEIRA VOTAÇÃO E ABSTENÇÃO NA SEGUNDA
Júlio Delgado (PSB-MG)
A assessoria de imprensa do deputado informou que o parlamentar não concordou com a forma pela qual o presidente Eduardo Cunha colocou o projeto novamente para votação em plenário. O deputado é contra reduzir a maioridade e pretendia obstruir a votação. Porém, como a orientação do partido foi votar “não”, ele preferiu se abster.
Fonte: G1