Do sonho ao pesadelo. Esse foi o sentimento que muitas noivas experimentaram nesses últimos meses na capital de Mato Grosso. Além das dificuldades em encontrar fornecedores e o elevado preço pelos serviços, o mercado de casamento passou por um momento de turbulência com o golpe da decoradora Emanuely Félix que deixou mais de 80 noivas sem os serviços contratados.
E se o momento é de atenção, nada mais certo que investigar a fundo o mercado que movimenta R$ 15 bilhões por ano no país, segundo dados da Associação dos Profissionais, Serviços para Casamento e Eventos Sociais (Abrafesta).
Foi em meados de outubro que a comerciante Thamyres Andrade recebeu um dos pedidos que mais lhe arrancariam suspiros. Com uma preparação carinhosa e cheia de mistérios, a comemoração de namoro com direito a vista de Chapada dos Guimarães, em um restaurante da região, selaria os planos do casal com o pedido de casamento. “Eu não estava esperando nunca ser pedida em casamento, até porque esperamos quase seis anos. Mas fiquei desnorteada quando de fato percebi a surpresa”, revelou a estudante de medicina. Daí em diante Thamy e Leo se embrenharam na empreitada de preparação do casório.
Dia 19 de março, levaram um golpe duro que talvez mude os planos tão sonhados com a cerimônia do casamento. A decoradora desapareceu e deixou dezenas de clientes e fornecedores sem notícias. Encontrada pela Polícia Civil e arrolada num processo criminal de propaganda enganosa e estelionato, Emanuely pode se condenada a cinco anos de prisão. “Não estávamos esperando um fato desses, nós sustamos todos os cheques que tínhamos adiantado para ela, mas no final ficamos no prejuízo de R$ 5 mil”, disse o noivo e contador Leonardo. Assim como ele, outras dezenas ficaram a ver navios e precisarão fazer manobras econômicas se quiserem realizar a tão sonhada festa de casamento.
Falar de orçamentos nesse setor é delicado, já que cada evento é único. Um arranjo, o número de convidados e até o tipo de iluminação mexe no valor final. Mas só para dar uma ideia de custo, Rafael Koiado, organizador da feira que reúne vários fornecedores do setor no ‘Noiva Show’ faz uma aproximação. Se um casamento para 200 convidados, considerando noivos de classe média, há três anos custava cerca de R$ 50 mil, hoje ultrapassa facilmente a cifra dos R$ 80 mil, diz.
O consultor, que trabalha com vários fornecedores, revela que a área só tende a aumentar os preços. “Querendo ou não, casar é um serviço supérfluo e de luxo. Você pode adiar ou nem mesmo realizá-lo. Então acredito que mesmo com a crise o setor só tende a crescer e se especializar”, explicou. Conforme Koiado, a tendência é que cada dia os fornecedores do setor se especializem em seus serviços e cobrem mais por item.
Pagamento de comissões e indicações de grupos fechados são outras ações praticadas na área. “Os fornecedores que atendem aos grandes casamentos têm um hall de indicações. Pois se trata de um mercado e eles preferem trabalhar com empresas conhecidas e de grande porte”, comentou.
E essas ações podem levar a crimes ao consumidor, como venda casada e propaganda enganosa, como explicou a superintendente do Procon-MT (Órgão de Proteção do Consumidor), Gisela Viana. “No caso da venda casada, é muito importante que os noivos não sejam constrangidos pelas empresas e cerimoniais a fecharem erroneamente contratos com fornecedores que queiram obter vantagens indevidas”, explicou. Gisela informou também que todos os serviços precisam estar detalhadamente expostos no contrato, no ato do fechamento. “Como se trata de serviços que mexem muito com o emocional dos clientes, esta área é muito delicada. É preciso que tudo esteja o mais explícita e documentalmente exposto sobre os trabalhos”, comentou a superintendente.
Às vezes, por se tratar de serviços específicos, uma decoração diferente ou a contratação de freelancers pode resultar numa ação de dano moral. “Se a noiva exige e paga por uma flor e o decorador coloca outra coisa no lugar, ou mesmo se contrata um fotógrafo/músico e ele não comparece no local, a empresa pode ser processada civilmente”, explica Viana.
Mas a representante do Procon pondera: “Cada caso é um caso, porém a recomendação é que se a noiva sentiu algo vago, implícito, ou mesmo a incomodando, antes do casamento é a melhor hora para ela procurar o Procon. Assim nós poderemos analisar e detalhar tudo o que está mal entendido entre cliente e empresa e tentar prevenir futuras dores de cabeça”, afirmou.
Investigações
Um caso que movimentou as redes sociais e a mídia mato-grossense ainda está sendo investigado pela delegada da Delegacia contra Crimes Econômicos (Decon) Ana Cristina Feldner. A investigadora responsável pelo inquérito já ouviu, até o fechamento desta matéria, 45 vítimas de Emanuely Félix (dentre eles quatro fornecedores de flores e móveis). “As investigações estão em andamento e até o dia 25 enviaremos o resultado à Justiça de Mato Grosso. Se condenada, ela poderá pegar mais de cinco anos de prisão (sendo cinco anos por estelionato e seis meses por propaganda enganosa)”, disse a delegada.
Conforme informações de Ana Cristina, a investigada está fora de Cuiabá. “Sabemos o paradeiro dela e estamos ouvindo todas as vítimas que registraram boletins de ocorrência contra ela. Estima-se que o golpe envolva uma cifra que ultrapasse os R$ 800 mil”, comentou. Ainda segundo informações de Feldner, a decoradora contou que fugiu após um parente não assinar a hipoteca da casa da mãe. “Ela teria, conforme falou, oferecido a casa por R$ 300 mil. Mas por falta da assinatura de um parente, a hipoteca não vigorou. Aí ela fugiu”, revelou Ana Cristina.