O farmacêutico é um dos profissionais mais próximos da população quando o assunto é saúde. Não raro, na ausência do médico, ele é figura recorrente nas dúvidas que podem surgir, auxiliando com orientações necessárias ao nosso bem-estar. A Medida Provisória 653, que esteve em tramitação no Congresso, ameaçava a atuação desses agentes, desobrigando pequenas farmácias de sua contratação para atendimento ao público. No entanto, a MPV mascarava interesses obscuros de outros atores desse jogo.
A Medida Provisória, que caducou por decurso de prazo (veja matéria abaixo), pretendia alterar a Lei nº 13.021, de 8 de agosto de 2014, que disciplina o exercício e a fiscalização da atividade farmacêutica no Brasil. Parlamentares envolvidos na discussão, contudo, denunciaram que a MPV possuía um “jabuti” – jargão utilizado no Congresso quando uma Medida Provisória recebe proposições diferentes do seu tema.
O “jabuti” em questão eram 5 artigos que tratavam da fiscalização de frigoríficos, que segundo o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), “atendia a interesses da Friboi, que financiou a campanha eleitoral de 82 deputados”. A Friboi é uma das marcas da JBS, a maior empresa de processamento de carne bovina, ovina e aves do mundo.
O presidente do Sindicato dos Farmacêuticos de Mato Grosso (Sinfar-MT), Wille Calazans, estranhou que artigos estranhos ao tema proposto estivessem dentro da MPV 653/2014, afirmando que ele atendia a “determinadas situações claras”.
“[A MPV 653] Tratava de farmácia, mas foi colocada uma posição encima da fiscalização de frigoríficos. Não tem nada a ver com farmácia. Estava embutido na MPV para satisfazer determinadas situações claras. Fomos surpreendidos, mas conseguimos reverter”, diz.
Os artigos que pretendiam alterar a legislação acerca da fiscalização de produtos de origem animal e agropecuária eram o 9º, 10º, 11º, 12º e 13º. Curiosamente, outras tentativas de mudança das leis, que não tinham qualquer relação com a atividade farmacêutica no Brasil, foram rechaçadas pelo relator da Medida Provisória, o deputado Manoel Júnior (PMDB-PB). Entre elas, uma proposta do também deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que sugeria alterar o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Entre as consequências da aprovação da MPV 653 para a atividade frigorífica no país está a centralização da fiscalização agropecuária no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o que desarticularia as inspeções municipais e estaduais. Especialistas apontam que o Mapa não dispõe de estrutura para tanto, o que poderia quebrar pequenos abatedouros, impossibilitando-os da atividade comercial devido à falta do alvará sanitário, fazendo com que o monopólio da JBS seja ainda maior.