Opinião

Plantar, comer, contar e… colher!

 
Muita gente foi fisgada pelo formato do texto sem saber que durante anos induzida por minha avó tive o prazer de ser leitora assídua do grande Apícius, crítico de gastronomia do Jornal do Brasil. Ele usava esse pseudônimo para escrever sobre restaurantes cariocas. Sempre acompanhado por madames (a mais frequente era a “M”), suas incertas anônimas geravam colunas deliciosas, ora favoráveis, ora desancando os estabelecimentos do Rio. Seu apelido fazia referência a um comilão romano, dos tempos do Imperador Augusto e servia para proteger um dos melhores textos que “assombrou” a imprensa durante mais de 20 anos.
 
Pois foi sob sua inspiração que durante um tempo, bem no início da década de 90, tive uma coluna gastronômica num jornal de Cuiabá editado pela minha chefa predileta, a jornalista Lígia Lemos, mãe do Marcão, hoje secretário de Comunicação do Estado de Mato Grosso. Não me recordo se no Jornal Independente ou na Tribuna Cuiabana, de Shirley Ocampos.
 
Durante várias edições falei sobre restaurantes e acepipes que encontrava na capital mato-grossense. Rapidamente consegui entender por que João Roberto Marinho de Azevedo, filho de uma tradicional família carioca, se escondia atrás do codinome romano. Por uma questão de sobrevivência, acabei definindo que iria apenas destacar as qualidades da culinária de Cuiabá e simplesmente ignorar o que não me caía bem no paladar e no estômago.
 
Mas, como Apícius, adotei um estilo narrativo menos científico e mais poético, o que fazia que a “fantástica” coluna fosse de vento em popa.  
 
Até o dia em que… para falar da Batata Rostie, acompanhamento que sempre a-mei e só havia encontrado muito bem feita num pequeno restaurante de um casal alemão, talvez no Jardim Tropical, escrevi um texto em que fantasiava que, por causa da batata, o lendário bandido Márcio Martins, o Rambo do Garimpo, preso no batalhão da PM na XV de Novembro, ao encomendar a iguaria e ter seu pedido negando, não resistiu ao desejo e fugiu pelo portão principal, se misturado aos convidados de um casamento que acontecia na igreja em frente, e botou o pé no mundo. Não sem antes passar no restaurantezinho (que, esclarecendo, não era a Casa da Suíça)e degustar uma porção caprichada da iguaria.
 
Tirando a parte da batata, por incrível que pareça, a fuga realmente havia acontecido como narrava a coluna. Corria na cidade, inclusive, que o mesmo havia molhado a mão do comandante da unidade com uma grande quantidade de ouro!  Pois essa foi a última vez que escrevi regularmente sobre gastronomia. Imagino que vocês calculem o motivo.
 
Hoje, quando encontro um lugar que prepare o prato com o capricho necessário, sempre penso no bandidão que, involuntariamente, acabou cortando minhas asinhas de crítica gastronômica. Normalmente, quando muito, pincelo o assunto. Era o que ia fazer aqui, falando sobre a evolução da Batata Rostie. Ela,  atualmente,  frequenta meu cardápio recheada por gostosuras como carne seca desfiada com catupiry, no Bistrô La Fidúcia Café, em Copacabana, Rio de Janeiro.
 
Mas fui fisgada pela lembrança de um tempo em que, no mínimo, bandido ia para a cadeia mesmo que pra fugir depois virando lenda, e Mato Grosso era o lugar que havia escolhido para viver e testemunhar histórias saborosas como uma Batata Rostie que evoluiu e, agora, é recheada de temperos e aventuras (bem) vividas…
 
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Ponta do Leme”, do SEM   FIM…  delcueto.wordpress.com

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