Depois de tocar R$ 5,55 pela manhã sob impacto de nova pesquisa eleitoral, o dólar à vista perdeu fôlego ao longo da tarde e operou em baixa na maior parte da segunda etapa de negócios, com mínima de R$ 5,5019. Na reta final do pregão, a moeda americana voltou a ganhar força e fechou a R$ 5,5237 (+0,01%), passando a acumular valorização de 2,21% nas últimas cinco sessões.
Operadores afirmam que o mercado de câmbio ainda busca uma acomodação após a arrancada recente do dólar. A recuperação do real ao longo da tarde foi atribuída a ajustes de posições e realização de lucros, em meio a um ambiente mais favorável a divisas emergentes latino-americanas e sinais de um cacique do Centrão de que a candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ao Palácio do Planalto ainda não está consolidada.
O head de banking da EQI Investimentos, Alexandre Viotto, afirma que a surpresa com o anúncio da pré-candidatura de Flávio no último dia 5 desencadeou um desmonte de parte de posições de estrangeiros em ativos locais, movimento que ganhou ainda mais tração após pesquisas mostrarem que o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro parece não ter chances de barrar a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Vi muitos estrangeiros revertendo posição no Brasil. Parece que nesta quinta tivemos um movimento de realização de lucros no segmento de derivativos que acabou tirando parte da pressão sobre o real”, afirma Viotto, que vê o dólar rondando os R$ 5,50 até o fim do ano, caso não haja novidades na configuração do quadro eleitoral.
Pela manhã, pesquisa AtlasIntel/Bloomberg mostrou que o presidente Lula lidera as intenções de voto no primeiro turno e bateria todos os nomes da oposição em eventual segundo turno. A vantagem do presidente seria maior contra Flávio do que na comparação com Tarcísio e Michelle em uma segunda rodada.
No início da tarde, operadores comentaram declarações do presidente Nacional do PP, Ciro Nogueira (PI), ao “Valor” sobre a corrida presidencial. Um dos líderes do Centrão, Ciro afirmou que se, em março, a pré-candidatura de Flávio não mostrar viabilidade eleitoral, a tendência é de que o ex-presidente Jair Bolsonaro “não vai arriscar”. Mais: a candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), não seria, no momento, “um projeto enterrado”.
Tarcísio é visto como o nome que pode agregar o campo da direita e barrar a reeleição de Lula. Ala relevante dos investidores vê a vitória da oposição na corrida presidencial como fundamental para uma mudança na política fiscal que leve à redução da relação dívida/PIB e, por tabela, reduza os prêmios de risco.
“Não vejo um ‘overshooting’ do câmbio no curto prazo. Mas podemos ver uma alta mais forte do dólar no ano que vem caso se consolide o cenário de reeleição de Lula. A taxa de câmbio podendo se aproximar dos R$ 6,00”, diz Viotto.
O economista André Perfeito observa que a perspectiva de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deixe o governo em março para cuidar da campanha de Lula “implica dizer que não haverá mais nenhum grande movimento na área econômica” daqui para frente.
“Não bastasse isso, o campo da direita anunciou Flávio Bolsonaro e atrapalhou a perspectiva daqueles na Faria Lima que imaginavam Tarcísio como candidato”, afirma Perfeito, para quem havia bons motivos para que o dólar pudesse ter caído anteriormente abaixo do nível de R$ 5,30. “Tudo se encaminha para uma eleição em 2026 na base da foice com conflitos generalizados em ambos os campos do espectro político. Ruído significa risco e risco tem ‘preço'”.
Por ora, operadores não relatam um movimento de remessas de lucros e dividendos ao exterior maior do que o tipicamente observado em fim de ano. Havia temores de uma saída mais forte de recursos, dadas as incertezas sobre a tributação de dividendos após as mudanças no Imposto de Renda.
Divulgado pela manhã, o Relatório de Política Monetária (RPM) reforçou o tom cauteloso adotado pelo BC tanto no comunicado quanto na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) e desencorajou apostas no início de um ciclo de corte de juros em janeiro.
Bolsa
O dia foi de recuperação relativamente bem distribuída pelas ações de primeira linha na B3, que colocou o Ibovespa de volta ao campo positivo no fechamento desta quinta-feira, 18, lutando muito, porém, sem obter o degrau acima do nível em que havia encerrado quarta e também a sessão de 5 de dezembro, que ficou conhecida como ‘Flávio Day’. A então surpreendente pré-candidatura presidencial do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) pegou o mercado no contrapé, há quase duas semanas, intervalo em que a percepção de risco político, ausente havia algum tempo, voltou a dar o tom.
Nesta quinta-feira, 18, contribuiu para a relativa melhora da percepção do investidor o relato do senador Ciro Nogueira (PI), presidente da federação partidária União Brasil-Progressistas e um dos principais líderes do Centrão, de que se não houver viabilidade eleitoral de Flávio até março, a tendência é de que a carta Tarcísio de Freitas permaneça sobre a mesa na disputa pelo Planalto.
Em entrevista ao Valor, Nogueira avaliou que o ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente preso e fiador da campanha do filho, “não vai arriscar” caso a candidatura de Flávio não decole até março. Dessa forma, segundo o senador, a possibilidade de o governador de São Paulo disputar a Presidência não seria, no momento, “um projeto enterrado”. “Vai depender da viabilidade eleitoral de Flávio”, acrescentou. Quarta, a posição de Nogueira que havia sido reportada por um site de notícias era oposta à da expressa nesta quinta pelo próprio senador do PP – no sentido, então, de que Tarcísio buscaria a reeleição em São Paulo no próximo ano.
Assim, com foco no noticiário de Brasília, o Ibovespa ganhou um pouco de tração ainda no início da tarde, mas fechou o dia em alta moderada a 0,38%, aos 157.923,34 pontos, um pouco mais perto da máxima (158.495,49) do que da mínima (157.123,58) da sessão, em que saiu de abertura aos 157.326,54 pontos. O giro financeiro da B3 ficou em R$ 26,3 bilhões nesta quinta. Na semana, o índice da B3 ainda acumula perda de 1,77% e, no mês, recua 0,72%, após ter fechado as duas sessões anteriores em baixa. No ano, o índice da B3 sobe 31,29%.
Na agenda econômica, destaque para os comentários do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, em entrevista coletiva após a divulgação do Relatório de Política Monetária (RPM). Ele disse que ainda não há uma definição sobre o próximo ajuste da taxa Selic em janeiro, destaca Luise Coutinho, head de produtos e alocação da HCI Advisors. “Essa fala trouxe um alívio para o mercado e fez com que as taxas dos contratos de juros futuros passassem a operar em terreno negativo”, acrescenta Luise, referindo-se à curva do DI em um ponto de inflexão durante a coletiva de Galípolo, o que contribuiu para dar apoio ao apetite por ativos de risco, como ações, na virada da manhã para a tarde.
O presidente do BC observou, também, que o mercado costuma buscar “dicas em um texto que não tem dica”, em referência à comunicação do Comitê de Política Monetária (Copom). “Tem um ‘memezinho’ já sobre isso rodando, e é meio um problema da quadratura do círculo, porque eu estou tentando achar uma dica em um texto que não dá dica”, ressaltou Galípolo. “Eu não consigo achar uma dica sobre o que vai ser feito, e é por isso que a gente está dizendo que está dependendo dos dados, porque não decidimos o que vamos fazer”, acrescentou o presidente do BC.
Na B3, entre as ações de primeira linha, apenas Petrobras destoou ao fim, em leve baixa de 0,25% na ON e de 0,58% na PN. Principal ação do Ibovespa, Vale ON subiu 0,26% e, entre os bancos, os ganhos no fechamento desta quinta-feira ficaram entre 0,19% (BB ON) e 1,95% (BTG Unit). Na ponta do Ibovespa, destaque para Brava (+6,16%), Suzano (+5,74%), Klabin (+2,32%) e PetroReconcavo (+2,08%). No lado oposto, Direcional (-3,48%), Natura (-2,59%), Assaí (-2,57%) e Hapvida (-1,93%).
Para Nicolas Gass, estrategista de investimentos e sócio da GT Capital, os mercados locais têm apresentado, recentemente, forte volatilidade muito mais “em função do cenário eleitoral do que de qualquer outro fator”.
“Tivemos falas do governador Tarcísio de Freitas sinalizando apoio a Flávio Bolsonaro, o que imediatamente chamou a atenção dos investidores. E, agora, também a pesquisa da AtlasIntel mostrando que Lula venceria ainda em todos os cenários simulados, inclusive em eventual confronto com o próprio Tarcísio”, diz Gass, observando que Flávio Bolsonaro começa a emergir, atualmente, como o principal nome da oposição – o que não impede a liderança “com folga” de Lula na pesquisas de intenção de voto.
Juros
Se, na primeira etapa do pregão, o reforço do tom conservador do Banco Central no Relatório de Política Monetária (RPM) e o pessimismo sobre as eleições presidenciais provocaram abertura generalizada dos juros futuros negociados na B3, no início da tarde desta quinta-feira, 18, os ânimos se acalmaram, ainda que de forma comedida.
Em sessão volátil, as taxas curtas passaram a rondar os ajustes anteriores e os vértices longos e intermediários reduziram o ritmo de elevação por volta das 13h. O movimento ocorreu após declarações do presidente do BC, Gabriel Galípolo, lidas como mais ‘dovish’ do que o RPM.
No campo político, entrevista ao Valor Econômico concedida pelo presidente nacional do PP e um dos líderes do Centrão, o senador Ciro Nogueira (PI), indicou que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ainda está no páreo como possível presidenciável da direita em 2026.
Também aliviou a dinâmica da curva local o ambiente externo, com redução dos rendimentos dos Treasuries em reação ao CPI de novembro, que renovou expectativas de continuidade de cortes dos juro básico americano em 2026. O dado subiu 0,2% ao fim de novembro, ante setembro, e 2,7% no comparativo anual. Ambos ficaram abaixo da mediana do Projeções Broadcast, de 0,3% e 3,1%, respectivamente.
“A inflação abaixo do esperado em novembro deu aos membros mais moderados do Federal Reserve um forte argumento a favor de um corte nas taxas em janeiro. Trata-se apenas dos dados de um mês, e não se pode descartar distorções, mas a queda acentuada na inflação anual deixa o Fed com poucos argumentos para não responder ao aumento do desemprego”, afirmou Seema Shah, estrategista-chefe global da Principal Asset Management.
Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 passou de 13,826% no ajuste anterior para 13,860%. O DI para janeiro de 2029, que chegou a operar em máxima intradia de 13,510%, oscilou de 13,33% no ajuste a 13,34%. O DI para janeiro de 2031 marcou 13,635%, vindo de 13,631% no ajuste.
Gestor de fundos multimercados da Azimut Brasil Wealth Management, Marcelo Bacelar avalia que os dados e o noticiário doméstico não trouxeram novidades – mostraram um Banco Central conservador, dependente de dados e piora no cenário político -, mas o índice inflacionário americano aquém do previsto ajudou a moderar a alta dos DIs.
Por aqui, publicado antes da abertura e considerado alinhado à última ata do Copom, o RPM observa que as expectativas inflacionárias caíram desde o último trimestre, mas seguem acima do centro da meta, de 3%. Nos prognósticos do BC, o IPCA acumulado em 12 meses só vai alcançar o alvo central no primeiro trimestre de 2028. A projeção para o segundo trimestre de 2027, atual horizonte relevante da política monetária, foi mantida em 3,2%.
Segundo participantes do mercado, a manutenção foi interpretada como um sinal hawkish, reforçando perspectivas de que a Selic não deve ser reduzida em janeiro. Ao comentar o documento, porém, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, reafirmou que a autoridade monetária tem postura dependente dos dados e não dá sinalizações à frente, mas declarou que não há “portas fechadas” sobre as próximas decisões do Copom.
“Galípolo foi dovish dizendo que a porta para janeiro está aberta – muito mais explicitamente do que nas comunicações escritas”, disse um economista de uma grande tesouraria à Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado. A fala não chegou a mexer consideravelmente nas apostas do mercado para a trajetória da Selic, mas foi suficiente para reduzir a alta das taxas futuras, que passaram a rondar os ajustes após a coletiva do BC.
Cálculos de Flávio Serrano, economista-chefe do banco BMG, indicam que a curva apontava, por volta das 16h, 44% de chances de corte de 0,25 ponto da Selic em janeiro, 100% de probabilidade em março, e taxa terminal de 12,80% em 2026, praticamente sem mudanças em relação a quarta.
Já outro participante do mercado, também em condição de anonimato, avaliou que as falas do comandante do BC foram mais dovish do que o RPM, mas que a moderação do ritmo de alta dos juros futuros a partir do meio da tarde está mais relacionada ao ambiente eleitoral. Em entrevista ao Valor, o presidente da federação União Brasil-Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI), descartou que a candidatura de Tarcísio à presidência esteja “sepultada”.
Bacelar, da Azimut, não vê grande peso no fluxo de notícias desta quinta, mas afirma que a possibilidade de ficar aplicado em juros voltou a ser discutida, devido ao nível das taxas, que têm muito prêmio ainda para queimar. Atualmente, o gestor não tem nenhuma posição no mercado nominal de juros. “Antes eu achava que o nível era alto e o risco, ruim. Agora, voltamos a discutir o nível das taxas”.



