Em Amores Materialistas, sob a direção de Celine Song nos coloca diante de um espelho que reflete com precisão o nosso tempo — um tempo em que o amor, muitas vezes, é avaliado como se fosse um investimento. Lucy, interpretada com delicadeza e força por Dakota Johnson, é a arquiteta de uniões perfeitas, dessas que combinam currículos e patrimônios, mas esquecem de medir o pulso do coração. Ela acredita poder controlar o destino dos outros como quem organiza uma vitrine de afetos, até que a própria vida a confronta com a mais simples e desarmante das verdades: o amor não é o que se possui, é o que se sente.
O filme não fala de paixões cegas ou de amores românticos que sobrevivem à fome e à chuva; fala de algo mais sereno e mais humano — o encontro entre duas almas que se reconhecem na leveza do cotidiano, no respeito mútuo, na liberdade que permite ser quem se é. É um amor que não precisa se exibir, nem se justificar. É o amor que chega sem ruído, mas que permanece mesmo quando a admiração pelo outro é posta à prova.
Song constrói essa narrativa com mãos firmes e sensíveis. Sua direção é contida, quase contemplativa. Os diálogos, muitas vezes interrompidos por silêncios, dizem mais que os discursos.
A fotografia é um retrato de transições: ora banhada pela luz dourada dos sonhos, ora mergulhada em tons frios que denunciam a solidão de quem vive de aparências. A câmera segue Lucy de perto, revelando a tensão entre o que ela mostra e o que sente. Não há exageros, apenas o desnudamento lento de uma mulher que, aos poucos, descobre que o amor verdadeiro não é uma conquista — é uma permissão.
Há uma cena em que Lucy observa o casal que acaba de unir, radiante com alianças e sorrisos de fotografia. O olhar dela, entre o orgulho e o vazio, é o resumo do filme: ela percebe que o amor não nasce no palco, mas nos bastidores — nos gestos simples, nos desacertos, nas pequenas concessões que a vida exige.
Amores Materialistas é uma fábula moderna sem moral de conto, um retrato honesto do coração humano em conflito com as promessas do sucesso e da aparência.
Não se trata de renunciar ao conforto ou à ambição, mas de compreender que nada disso tem sentido se o outro não nos enxergar de -verdade. Que a cumplicidade vale mais do que qualquer plano, que o riso espontâneo é mais raro que o luxo, e que o amor, quando é real, não precisa ser grandioso — basta ser verdadeiro.
Ao fim, o filme deixa a sensação de que amar, hoje, é um ato de coragem. Coragem para não se esconder atrás de status, coragem para admitir fragilidades, coragem para escolher alguém não pelo que tem, mas pelo que é. E talvez essa seja a maior beleza de Amores Materialistas: lembrar-nos de que, em um mundo onde tudo parece negociável, ainda há sentimentos que não têm preço.
Vale a pena assistir

Olinda Altomare é magistrada em Cuiabá e cinéfila inveterada, tema que compartilha com os leitores do Circuito Mato Grosso, como colaboradora especial. @aeternalente
Foto Capa: Reprodução/Divulgação