O Plano de Segurança Viária de São Paulo (PSV-SP), apresentado pelo governo do Estado no dia 18 de setembro, ficará em consulta pública até o dia 19 de outubro, prazo para que qualquer cidadão possa enviar sugestões e críticas. O documento é o primeiro do tipo a ser elaborado para o Estado de São Paulo e tem como meta reduzir pela metade as mortes no trânsito até 2030.
Em 2024 houve 6.069 óbitos por sinistros de trânsito no Estado. Destes, cerca de 2,6 mil vítimas foram motociclistas. Os dados são do Infosiga, sistema estadual de monitoramento da violência do trânsito.
O plano inicial contou com o apoio técnico de várias instituições, como o WRI Brasil, a Vital Strategies e a Iniciativa Bloomberg para a Segurança Viária Global (BIGRS), entidades parceiras do Detran-SP desde 2023, e do Global Road Safety Partnership (GRSP).
De acordo com o Detran-SP, as metas do documento, que tem cerca de 80 páginas, estão alinhadas ao Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans), elaborado em 2018, e à 2ª Década de Ação pela Segurança no Trânsito da ONU. De maneira geral, o plano tem a ambição de evitar 19 mil mortes até 2030 e continuar consolidando políticas de segurança viária até 2035.
Ações articuladas
“A meta é viável do ponto de vista técnico”, diz Paulo Guimarães, CEO do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), entidade organizadora do movimento Maio Amarelo. “Mas depende de ações articuladas, continuidade institucional, recursos adequados e, principalmente, de coragem política para enfrentar resistências históricas”, acrescenta.
Irineu Gnecco Filho, diretor de projetos da Urucuia, especializada em mobilidade urbana, também enxerga as metas como possíveis. “Outros países conseguiram. Temos o exemplo de Helsinque, capital da Finlândia, que zerou o número de mortes no trânsito durante um período de 12 meses entre 2024 e 2025”, afirma.
Entretanto, na visão de Gnecco Filho é fundamental que todas as ações ocorram de forma simultânea. “É necessário reduzir velocidades dos veículos, melhorar a infraestrutura, redesenhando as vias, e priorizar o transporte coletivo e a mobilidade ativa (pedestres e ciclistas). Além disso, fiscalizar de forma consistente e alinhada com a política do Visão Zero e investir em campanhas de conscientização”, diz.
Acertos
Entre os pontos positivos do plano, Guimarães destaca a estrutura técnica robusta, construída com base em dados e evidências. “O documento também prevê integração entre órgãos estaduais e apoio técnico aos municípios, além de priorizar ações voltadas aos usuários mais vulneráveis, como pedestres, ciclistas e motociclistas”, afirma.
A importância da articulação entre diversos órgãos também foi destacada por Gnecco Filho. “O documento estabelece metas claras, alinhadas ao Pnatrans, e propõe ações integradas entre DER, Artesp, Polícia Rodoviária e Secretaria de Saúde. Seu maior mérito é colocar a segurança viária como prioridade de governo, algo que nem sempre aconteceu no passado. Destaco, ainda, a coragem de colocar a questão da velocidade no centro da discussão: esse é um passo importante para salvar vidas”, acrescenta o diretor da Urucuia.
Desafios
Embora elogiem a maneira como o plano foi feito, os especialistas dizem que há obstáculos importantes a superar. Para Gnecco Filho, “o desafio não é fazer o plano, e sim colocá-lo em pé. Como ele é muito estratégico, precisa de um cronograma mais detalhado, recursos garantidos e metas intermediárias para acompanhamento. E tem a questão da integração com os municípios. Grande parte das mortes acontece nas cidades. Portanto, será fundamental trazer prefeitos e secretarias municipais para a mesa”.
Para Guimarães, são pontos de atenção a falta de cronogramas claros para a implementação das ações – demanda que o Sistema Estadual de Trânsito de São Paulo (Sistran-SP) informa que será cumprida ainda neste ano, após as considerações da consulta popular (veja ao lado) -, além de algumas medidas estratégicas que dependem de articulação com o Governo Federal. “Como exemplo destaco a revisão dos limites de velocidade e dos métodos de fiscalização eletrônica que estão em tramitação no Contran e no Congresso Nacional, sem previsão de conclusão. A alteração prática dessas velocidades, portanto, ainda não tem prazo definido”, alerta o executivo do ONSV.
Gnecco Filho também destaca esse ponto da tramitação, que está em consulta pública, para atualizar o Guia de Gestão de Velocidade nas áreas urbanas. “Em rodovias estaduais, o governo de São Paulo pode agir mais rápido. Então, é possível ver algumas alterações já em 2025 ou 2026, a começar pelos trechos mais críticos. Nas áreas urbanas ou em mudanças nacionais, pode levar mais tempo, pois depende de alteração de normas federais”, acrescenta.
Outro ponto sensível, de acordo com Guimarães, é a resistência política e social frente a mudanças como a redução de limites de velocidade. “Muitas vezes esse tema é tratado de forma ideológica, e não técnica”, destaca Guimarães. “A superação desses obstáculos exigirá uma comunicação clara com a sociedade e a valorização de uma cultura de prevenção. Por isso, a participação social se torna um eixo central para o sucesso do plano de segurança viária.”