Um dos motivos da demora no processo é o fato de o Estatuto da Criança priorizar sempre o retorno do menor para a família natural, ou extensa, que seriam os avós ou tios. Contudo, até encontrar esses familiares e analisar a viabilidade de eles serem os responsáveis, essa ação pode levar anos, apesar de a Lei 12.010 prever prazo máximo de dois anos para a permanência das crianças dentro de abrigos.
De acordo com a defensora pública de Várzea Grande Cleide Regina Ribeiro, uma das ações que facilitaria o serviço de fiscalização para que não permitisse que as crianças ficassem muito tempo dentro dos abrigos seria o acesso irrestrito da Defensoria ao cadastro.
“Há vários casos de adoção que estão parados na Justiça por até quatro anos esperando uma decisão, sendo que a prioridade é o retorno da criança para a família de origem ou ser entregue a pais adotivos. Mas se a Defensoria tivesse acesso a esses processos, poderíamos fiscalizar mais bem o andamento e pedir agilidade nos que ultrapassaram o limite”, diz a defensora.
Outra questão levantada pela defensora é a falta de políticas públicas para acompanhar as mães antes de terem os filhos e os abandonarem. “Hoje conhecemos muito a expressão “filhos do crack”, mas essa situação só existe porque o Estado não acompanha as mães que engravidaram e continuam no mundo das drogas. O certo a se fazer nesse caso é oferecer um local de internação para que pelo menos durante a gestão seja realizado o pré-natal e assim evitar que muitas crianças nasçam com doenças, mas isso não existe em Mato Grosso”, lamenta Cleide Regina.
Com relação à atenção às famílias, casos de irmãos que são retirados dos pais também teriam mais sucesso caso o Estado colaborasse com tios ou avós para que estes tivessem condições de cuidar das crianças. A prioridade nesses casos deveria ser a abertura de vagas em escolas públicas integrais para que as crianças tivessem ensino de qualidade, além disso, o Bolsa Família para atender à demanda da renda que cresceria e o acompanhamento psicológico ao longo do crescimento.
“Em Várzea Grande temos casos de nove irmãos que estão no abrigo e estamos buscando a viabilidade de eles morarem com os avós, contudo não podemos jogar toda a responsabilidade para essas pessoas que nem têm a situação de alimentar mais nove bocas. Então, é nesse momento que todo um conjunto de ações deve se organizar para que as crianças não retornem para o abandono”, diz a defensora Cleide Regina.
Demora terá intervenção do CNJ
Esta semana o Conselho Nacional de Justiça determinou mudanças para acelerar os processos de adoção, e entre as medidas está a investigação de juízes que conduzirem a tramitação de processos de adoção há mais de um ano sem proferir sentença.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 1990) determina prazo máximo de quatro meses para conclusão do estudo social para analisar se a criança continuará ou não no poder familiar. O objetivo é evitar que as crianças fiquem nos abrigos indefinidamente, sem vínculo familiar.
Para o defensor público de Mato Grosso, Cláudio Souto, que também já esteve na fila de espera para adotar uma criança e hoje se alegra com as vantagens de ter uma criança em casa, afirma que o prazo ideal para que toda a investigação seja realizada é de no máximo seis meses; mais do que esse tempo a criança perde toda a referência de família dentro do abrigo e pode entrar em casos que ultrapassam a idade de adoção que a maioria das famílias procura.
“Já defendi casos na Justiça que duraram três anos para que as famílias conseguissem adotar uma criança e esse tempo é muito longo para um menor que está dentro do abrigo. Lógico que considero a investigação para que a criança retorne para a família essencial, contudo essa morosidade pode levar a outro problema social que seria a adoção ilegal, e com isso podem surgir vários problemas futuros, como no caso da mãe natural que tenta tomar o filho de volta, causando um grande transtorno”, diz Cláudio Souto.