O lema do célebre palhaço Bozo, que teve seu auge na televisão brasileira entre as décadas de 1980 e 1990, no SBT, era “sempre rir”. No entanto, nos bastidores do programa, o clima não era tão leve assim.
É o que revela o documentário Sempre Rir: A História do Palhaço Mais Famoso do Mundo, produção original do SBT que já está disponível na plataforma +SBT. Dirigida por Jefferson Cândido, a produção revê, em dois episódios, a história do palhaço Bozo, criado nos anos 1940 pelo ator americano Alan Livingston – e que estreou no Brasil em 1980, trazido pelo apresentador e dono da emissora Silvio Santos.
Com depoimentos de ex-intérpretes do personagem aqui no Brasil, entre eles Luís Ricardo e Arlindo Barreto, o documentário ainda conta com a participação de nomes como a jornalista Sonia Abrão, que conduz a história, do ex-diretor do programa, Luís Mendes, e de ex-executivos do SBT.
Sempre Rir lembra que o primeiro intérprete do Bozo no Brasil foi o ator Wandeko Pipoca, que morreu em 2024 – ele foi treinado por Larry Harmon, que adquiriu os direitos autorais do palhaço em 1956.
Com o sucesso do programa na então TVS, emissora que depois se integraria ao SBT, Pipoca ganhou fama e dinheiro, mas, por escolha de Silvio Santos, foi preterido por Luís Ricardo, que, em um primeiro momento, chegou a dividir as gravações com o ator original. Wandeko deixou o SBT em 1982, após se recusar a se apresentar gratuitamente na festa de aniversário de uma das filhas de Silvio, conforme relatado no documentário.
Diante do aumento do tempo do programa no ar – Bozo chegou a ocupar mais de oito horas na grade da emissora -, outros intérpretes foram chamados para dividir as gravações com Luís Ricardo. Um deles foi o ator Arlindo Barreto, que já atuava em alguns programas humorísticos do SBT e havia trabalhado em pornochanchadas no cinema.
No documentário, Luís Ricardo conta que o clima nos bastidores entre ele e Arlindo – e, posteriormente, outros intérpretes do Bozo – não era dos melhores. “Eu inventei o ai, que peninha (um dos bordões do Bozo) e ele inventou o dá uma bitoca no meu nariz. Mas um não falava o bordão do outro”, conta Ricardo.
Barreto, por sua vez, afirma que era necessário manter um padrão de interpretação para o Bozo, o que, segundo ele, não era seguido por Ricardo. “Ele era jurado do Show de Calouros e fazia a mesma voz nos dois programas”, conta.
O resultado foi uma troca de socos entre os dois nos corredores dos estúdios do SBT, conforme narrado pela apresentadora Sônia Abrão e pelo produtor Edílson Oliveira, que conta que teve de separar a briga. Na ocasião, Ricardo e Barreto estavam vestidos de Bozo, entre o intervalo das gravações.
No documentário, Barreto admite que fez uso de bebida e drogas na época em que trabalhava como Bozo, mas nega que ia trabalhar sob o efeito de qualquer substância.
Nariz vermelho
Outro intérprete do palhaço, Marcos Fiel, que atualmente também é pastor de uma igreja evangélica, conta que igualmente sofreu uma agressão por parte de Arlindo Barreto, que, ao vê-lo chegar ao estúdio, puxou o nariz vermelho de plástico que fazia parte da caracterização do personagem e o soltou com força contra seu rosto.
À parte das brigas nos bastidores, o documentário Sempre Rir: A História do Palhaço Mais Famoso do Mundo exalta o pioneirismo de Silvio Santos em apostar e dedicar grande parte da programação infantil da emissora ao palhaço Bozo, além de ressaltar o sucesso do programa e do personagem, que teve produtos licenciados, fila de anunciantes e shows lotados em todo o Brasil.
A produção ainda destaca outros personagens do programa, como a Vovó Mafalda (Valentino Guzzo), Papai Papudo (Gibe), Salsi Fufu (Pedro de Lara) e Kuki (Rony Cócegas) e relembra os problemas de saúde e a morte do último intérprete do Bozo na primeira fase do programa no Brasil, Décio Roberto, que aceleraram o fim do programa no SBT, que já sofria com a queda de audiência no início dos anos 1990.
Trajetória de Arlindo Barreto inspirou Bingo: O Rei das Manhãs
Em 2017, estreou o filme Bingo: O Rei das Manhãs, dirigido por Daniel Rezende e protagonizado pelo ator Vladimir Brichta. O longa é inspirado livremente na carreira de Arlindo Barreto, um dos intérpretes de Bozo.
O roteiro tem como personagem principal Augusto, um ator que tem a chance de se tornar um apresentador de programa infantil de grande sucesso no Brasil, mas terá sempre de se mostrar maquiado de palhaço, não podendo dizer quem está por trás dessa máscara. O filme está disponível na HBO Max, no Prime Video e na AppleTV+.