A anta se achava feliz. Pensava que era algo além de uma anta, a enta assumida. Assinava, sorria e presepava para o resto da floresta. Diziam que era top e a anta acreditava. Fazia o seu papel de enta e se achava! Passeava entre os leões, tomava café com as hienas, banhava com jacarés, piranhas e lulas também, macaqueava com os símios… e assinava. Nem sempre sabia muito bem o que. Mas o simples fato de meter seu jamegão nos papéis oficiais fazia dela a mais vaidosa entre as… antas especialmente as de motocicleta.
Foi assim até o dia que o resto da floresta encheu o saco de tanta palhaçada e resolveu demostrar de forma clara e inequívoca o descontentamento vigente no mundo animal. A anta e seus prepostos levaram um susto! Afinal, se estavam bons pra eles as assinaturas, os sorrisos e as presepadas, do que os demais reclamavam? Não recebiam seu quinhão de bolsa floresta?
As reclamações e os protestos cresceram de forma exponencial e tomaram a fauna em geral. Uma estratégia tinha que ser montada. Se não para impedir o sacode, pelo menos para se apropriar dele. Botaram no meio dos encontros populares batalhões de formigas, enxames de abelhas, seus paus mandados mais obedientes, deturpando as marchas e tocando horror no meio da mata. Como ter certeza que a violência não era oriunda dos manifestantes originais? Bastava ver quantos foram presos ou punidos pelos atos de destruição.
A intimidada floresta voltou ao normal e a corte dos predadores retornou suas atividades de sempre. Só que, obviamente, tanto a anta quanto a corte notaram finalmente que algo não estava bem. Algum sacrifício teria que ser feito para “ajustar” o meio ambiente!
A anta, jogando para a torcida, requentou a proposta de reordenar os poderes da corte. Claro que isso não agradou aos chupa-cabras de plantão. A proposta foi enfiada no fundo da mais profunda gruta da corte na floresta. Também detectaram que a anta poderia ser, sim, uma ameaça(zinha), já que havia demonstrado que pretendia botar as patinhas de fora. Apareceu a assinatura da anta num dos papéis que permitiam a mamação coletiva que estava sugando as maiores reservas do maior empreendimento, já quase falindo, da floresta. Mostraram que a enta não passava de uma mera e simples anta mal informada, já que como a própria reconheceu, havia praticado o malfeito… sem saber. Pobre animal!
Também deram entrada numa lei que fazia dos manifestantes que abrissem seus bicos ou fizessem barulho nas trilhas da floresta criminosos da pior espécie. Para suprimir no grito qualquer ruído durante o maior evento esportivo das florestas do mundo.
Só que a pressão cresceu demais, a péssima fama da enta começou a prejudicar sua aspiração de continuar anta-rainha. Não restou a ainda enta-mór outra alternativa, a não ser chamar seus exércitos de formigas e as espécies servis de sempre para pedir-lhes que, depois do tal evento, ocupassem novamente as trilhas da floresta. Dessa vez, exigindo, “como nas Diretas Já”, mudanças no regime da corte da floresta. O pau vai quebrar a pedido da enta/anta!
O fim da fábula é pule 10: a anta, para manter a coroa de enta, pedirá penico à corte que continuará a predadora de sempre. A bicharada irá para o sacrifício e, quem sabe, para a jaula: pagará o pato! Que nem estava na floresta na hora do vamos ver…
Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Fábulas fabulosas”, do SEM FIM… delcueto.wordpress.com