A saturação de produtos na prateleira, a ansiedade dos investidores em ter os ativos da moda e até o perfil “vendedor” dos profissionais de investimentos podem levar a uma carteira demasiadamente complexa. Os portfólios vastos, mesmo que busquem a diversificação, podem até mesmo não gerar benefícios. Especialistas alertam para os riscos de se ter uma carteira de investimentos demasiadamente complicada, que pode, paradoxalmente, comprometer os objetivos financeiros ao invés de favorecê-los.
A diversificação de ativos é uma estratégia amplamente recomendada. É caracterizada como “o único almoço grátis do mercado financeiro”, já que permite mitigar riscos e buscar retornos consistentes a longo prazo. Contudo, a partir de um certo ponto, a adição de novos produtos financeiros à carteira pode trazer mais confusão do que clareza. “Às vezes, você vê uma complexidade de produtos tão grande que as coisas nem se conversam”, disse Jayme Carvalho, cofundador da consultoria SuperRico Saúde Financeira e membro da Associação Brasileira de Planejamento Financeiro (Planejar), em evento sobre wealth planning na última semana.
Para o especialista, parte do motivo vem do comportamento dos clientes, que quando não veem retorno mudam de produtos e até mesmo de plataformas. Por outro lado, ele considera que os profissionais de investimentos também têm sua parcela de atuação, ao atuar simplesmente como vendedores. Guilherme Assis, CEO e cofundador da fintech Gorila, afirma ainda que parte desse exagero vem das ondas de produtos da moda. “Há um tempo começou com os ativos incentivados, passou por multimercados, depois crédito. As pessoas acabam ficando até com um legado de produto no portfólio.”
Um emaranhado de ativos pode ser contraproducente por potencialmente acarretar em custos elevados, além de aumentar a chance de que o portfólio fique em desalinho em relação aos objetivos do investidor. Para os profissionais, ainda pode ser uma armadilha: tornar difícil explicar para o cliente tudo que está na cesta de investimentos.
Assis enxerga uma tendência: o aumento desta complexidade, já que o número de produtos de investimentos vai continuar crescendo. E isto em si não é negativo, ele avalia, desde que as explicações para os investidores sejam mais simplificadas. “Acho que o contato com o cliente no futuro vai ser muito mais de você contar uma história sobre o que está acontecendo e como as alocações dele foram influenciadas, em vez de você falar que no produto A aconteceu isso, no produto B aconteceu aquilo.”
Bruno Ballista, sócio e líder da área de assessoria e relacionamento com clientes da XP, considera que há uma necessidade por parte dos profissionais do mercado financeiro em demonstrar seu conhecimento e valor por meio da complexidade das carteiras que gerenciam. “Existe o assessor-gestor, que quer fazer o asset allocation e acaba trazendo mais complexidade do que o cliente precisa”, diz.
Essa tendência, somada ao desejo de alguns clientes de tentar o ‘market timing’ – a prática de tentar prever os movimentos do mercado para comprar ou vender ativos no momento ideal – pode transformar a carteira de investimentos em um verdadeiro “Frankenstein”, avalia Ballista.
Estas movimentações muitas vezes levam a uma desconexão da carteira daquilo que era o planejamento financeiro original do investidor. O sócio da XP aponta que ferramentas de planejamento financeiro têm uma função importante aqui: de dar visibilidade ao investidor de que o plano de longo prazo está em andamento.