Enquanto isso, o dólar pulava a uma cotação de 88 bolívares no mercado paralelo, apesar das medidas de “equilíbrio” anunciadas na quarta-feira por Maduro.
Diante dessa realidade, o Governo desviou a atenção culpando a imprensa. “A mídia criou desassossego na população”, acusava ontem Gabriela Ramírez, Defensora do Povo e ex-parlamentar chavista. “A CNN poderia estar incorrendo em propaganda de guerra”, continuou, dando a razão ao presidente Maduro, que na noite anterior dava ordens à ministra de Comunicação e Informação, Delcy Rodríguez, que iniciasse o processo administrativo para tirar do ar o sinal dessa rede internacional. Por sua vez, o prefeito oficialista de Caracas e irmão da ministra, Jorge Rodríguez, opinou que a CNN estava fazendo "exatamente o mesmo que fez a rádio hutu que chamava de baratas aos tutsis na Ruanda”.
A CNN em espanhol —que é vista na Venezuela por meio de diversos serviços de televisão por assinatura— dedicou boa parte de sua programação a informar sobre os protestos na Venezuela que foram ignorados ou minimizados pelos meios locais, sob um forte controle governamental. Sua apresentadora principal, a jornalista Patricia Janiot, chegou à Venezuela na terça-feira para cobrir os protestos no local. No entanto, na sexta-feira Janiot abandonou o país depois das acusações de Maduro contra a CNN, pouco depois de o Governo anular a credencial da correspondente permanente na Venezuela, Osmary Hernández. Na última semana, o Executivo suspendeu, “por uma decisão de Estado”, o sinal da NTN24, um canal colombiano de notícias que cobriu ao vivo o primeiro dia de protestos.
Durante a crise registraram-se 50 casos de ataques contra a imprensa, reportou o Instituto Prensa y Sociedad de Venezuela. Em uma coletiva de imprensa, o presidente do Colégio Nacional de Jornalistas Alejandro Tinedo Guía, exigiu ao Estado venezuelano garantir as condições para o exercício da profissão. “Respeitem e protejam os jornalistas na rua”, disse, “eles são os olhos e as vozes do mundo”.
“O Governo venezuelano adotou abertamente a tática clássica de um regime autoritário”, expressou desde Washington José Miguel Vivanco, diretor de Human Rights Watch. “Encarcerando seus oponentes, amordaçando os meios e intimidando a sociedade civil”.
O Governo exerce, além disso, a perseguição pura e dura. Na terça-feira entregou-se às autoridades o líder do partido Voluntad Popular, Leopoldo López, a quem o Governo aponta como principal instigador das desordens. Preso em um cárcere militar, enfrenta acusações de associação criminosa e dano de bens públicos. Se for considerado culpado, poderia ficar preso dez anos. Ao mesmo tempo, o poder judiciário emitiu ordens de captura contra outros dirigentes do Voluntad Popular.
Em resposta, a oposição convocou para hoje uma grande concentração na capital. Além da libertação dos presos e o fim da perseguição, a oposição exige o desarmamento dos grupos de choque chavistas que participaram no controle das manifestações.
Depois de o presidente Maduro suspender o serviço de metrô e ônibus nas zonas opositoras do leste de Caracas — medida que foi revogada 24 horas depois —, ontem o ministro de Petróleo e Minas, Rafael Ramírez, anunciou que estuda outra manobra de controle social: o corte do fornecimento de gasolina “às zonas sob o assédio de bandas fascistas”. Enquanto os confrontos continuavam, o mais temível adversário do regime de Maduro, a crise econômica, continuava intacta.
ElPaís