Com larga experiência no mercado de sucessão de líderes de grandes empresas, a headhunter – termo usado para recrutadores de vagas importantes nas companhias – Fatima Zorzato já entrevistou cerca de 1,5 mil CEOs, presidentes e heads de business unities. Ao longo da carreira, a veterana desenvolveu um estilo próprio na hora de identificar as características em comum entre lideranças bem-sucedidas. Hoje, à frente da INWI Consulting, Fatima destaca três aspectos inegociáveis para líderes de sucesso: estratégia, comportamento e alinhamento emocional.
Na contramão dessas habilidades, Fatima aponta o ego como um grande obstáculo na liderança. “Quando o líder entra na empresa, o ego entra antes dele. Então, ele não consegue se relacionar e ouvir”, alerta. Confira trechos da entrevista.
Quais são as principais habilidades que observa entre grandes líderes?
Temos o líder funcional e o líder de empresa. Com o líder funcional, a profundidade técnica e analítica é o que vai diferenciá-lo durante a carreira. Mas, quando ele vai crescendo, a profundidade técnica não é suficiente porque se tornam necessárias características de liderança, que são as soft skills, como a capacidade de mobilizar pessoas. No caso dos líderes empresariais, que podem ser empresas pequenas, médias ou grandes, diria que existem três características. A primeira é a capacidade de visão e de estratégia. A segunda é o comportamento, o líder fala e faz a mesma coisa, são transparentes. Eles não ficam em cima do muro e sabem como se comportar em público, sem público, em momentos fáceis e nas situações de pressão. Por fim, o bloco emocional que combina todas as soft skills, principalmente a capacidade de as pessoas simpatizarem com você. Não é ser bonzinho, é ter as variações necessárias para lidar com diferentes situações.
Existem outras habilidades predominantes em líderes bem-sucedidos?
O nível de resiliência. Por exemplo, não gosto de quem faz uma carreira de três anos em cada lugar. Porque em dois, três anos, você está na lua de mel. Faço a analogia com a árvore, você não faz raiz e não finca. Então, o líder não tem como falar que entregou transformação porque demora mais de seis anos. No máximo, deu um tapa. A resiliência é para alegria, tristeza, para passar por relações difíceis, por turbulências no negócio e na economia. Gosto muito de líderes resilientes. Eles leem livros, fazem programas educacionais, olham vídeos, e ao ver ou conversar com alguém relaxam e conseguem ter insights.
Isso se repete no aprendizado da educação executiva?
A educação executiva é muito propícia, mas não pode ser o dar e receber. Tem líder que vai fazer educação executiva e fica nervoso porque são situações tensas. Por exemplo, podem ser atividades com pessoas da mesma empresa, então, o líder vai se sentir avaliado. Se for em inglês e precisar apresentar um caso, vai aumentar a barra. Só esse fator já reduz a possibilidade de aprendizagem. Quando você vai a um ambiente de educação executiva fora do Brasil, em que conhece outras pessoas, fica mais aberto porque não tem preconceito, não tem baias.
Na hora de escolher um curso de educação executiva, o que a liderança deve levar em consideração?
A educação executiva tem alguns formatos. Temos os programas customizados in company, em que trabalham o que é o problema comum e o que eles querem apresentar de método. Por exemplo, método de gestão ou de liderança. Quando você vai para os programas abertos temos vários níveis, como programas mais voltados para liderança. Por exemplo, muita gente com formação técnica procura programas voltados para administração ou para finanças, que pode ser um MBA ou certificados. Ainda temos os programas que são de soft skills, é a educação continuada voltada para soft skills e liderança. Diria que 100% das pessoas são líderes no começo de carreira ou pessoas mais velhas que desejam dar uma revisão. No meu caso, fiz um programa de CEO que deu o insight para escrever um livro. Demorei muito para fazer o curso porque achava que não precisava, depois me questionei por que não entrei antes. Hoje em dia, o que acaba diferenciando as pessoas é: qual é o tamanho da sua curiosidade?
Por quê?
Um dos itens que avaliamos em assessment (diagnóstico elaborado para apontar tendências de comportamento e desempenho do profissional) é a curiosidade. Alguns líderes são supercuriosos naquilo que é especialista, conhece tudo, mas somente de um assunto. Temos outro perfil de liderança que conhece pouco de muita coisa. O balanço entre um e outro é legal. Não dá para aprender habilidades em cursos, mas é possível ter insights. Tem alguns livros que falam de coisas específicas. Poder é uma coisa que cega ou às vezes ajuda. Se você me perguntar o que mata o executivo, vou dizer que é o ego. Quando o líder entra na empresa, o ego entra antes dele. Então, ele não consegue se relacionar e ouvir.
É possível aprender a controlar o ego?
Não dá para ensinar, mas se a liderança lê coisas que falam que o ego é um problema e começa a aumentar os feedbacks, ela pode se preocupar e notar que a escuta ativa é importante. Escuta ativa significa não falar e não ter de ser a última voz. Isso dá para ensinar.
Então, de alguma forma, a educação executiva pode ajudar o líder a combater o ego?
Por meio do ensino da liderança, a educação executiva pode mostrar exemplos de comportamento inadequado. Ainda que de um jeito superficial, pode ajudar na autopercepção. Muitos líderes usam isso com propriedade e fazem as pessoas ficarem encantadas. E o que encanta as pessoas? Pessoas comuns, que você olha e fala: “É humano como eu, acorda, escova os dentes, vai ao banheiro, mas se preparou e tem visão para ser o nosso líder”. É uma pessoa normal. Este é o grande segredo.