O dólar à vista encerrou a sessão desta sexta-feira, 1º, em alta de 1,53%, cotado a R$ 5,8694. Trata-se do maior valor de fechamento desde 13 de maio de 2020, quando registrou o nível nominal mais alto da história (R$ 5,9008). Com os ganhos de 6,13% em outubro e o avanço de hoje, a moeda americana passou a acumular valorização de mais de 20% em relação à divisa brasileira em 2024.
O real já sofria pela manhã com o mal-estar provocado pelo anúncio da viagem do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à Europa na próxima semana, visto como um sinal de falta de urgência no governo Lula para anunciar o prometido pacote de corte de gastos para cumprir as metas fiscais.
As máximas da sessão, quando o dólar atingiu o pico de R$ 5,8738, vieram no fim da tarde, à medida que a moeda americana acentuava os ganhos no exterior tanto em relação a divisas fortes quanto emergentes, diante da expectativa pelo desenlace da eleição presidencial nos EUA na próxima semana.
Pela manhã, dados fracos da geração de empregos em outubro revelados pelo payroll não autorizaram apostas de aceleração do ritmo de corte de juros pelo Federal Reserve, uma vez que foram contaminados por questões pontuais, como greves e dois furacões ao longo do mês passado. Foram criadas 12 mil vagas no mês passado, bem abaixo da previsão (100 mil). Mas a taxa de desemprego ficou estável e os salários avançaram além do esperado.
As taxas dos Treasuries até ensaiaram uma queda após a divulgação do payroll, mas trocaram de sinal ainda pela manhã e acentuaram o ritmo de alta à tarde, o que contribui para a piora do desempenho do real e do peso mexicano, que atingiu o menor nível em relação ao dólar desde setembro de 2022.
“O payroll reforçou as apostas de que o Fed vai cortar apenas 25 pontos-base na próxima reunião, no dia 6, mantendo a tendência de aceleração do yield americano, tendo em vista o bom resultado do PIB do 3º trimestre e a perspectiva das eleições. O movimento do índice DXY reforça essa leitura”, afirma o economista sênior do Banco Inter, André Valério.
Ao quadro externo de fortalecimento do dólar se soma um ambiente de desconfiança crescente com a disposição e a capacidade do governo Lula de entregar um pacote crível de corte de gastos que leve ao cumprimento das metas fiscais, observa o economista-chefe da corretora Monte Bravo, Luciano Costa.
“Temos o peso da eleição americana, com sinais de que o republicano Donald Trump pode ser o favorito, o que leva ao ‘trade’ clássico de aposta contra divisas emergentes. O peso mexicano sofre hoje tanto quanto o real”, afirma Costa, lembrando que Trump pode impor tarifas a exportadores de commodities. “Com um ambiente global que não é amigável e a questão fiscal aqui dentro, não aparece vendedor de dólar.”
Como a alta do dólar é atribuída ao aumento da percepção de risco, não haveria razões para uma intervenção do Banco Central. Apesar da liquidez mais estreita no segmento futuro, operadores afirmam que não há “disfuncionalidades” no mercado cambial.
Para o economista-chefe da Monte Bravo, um alívio na taxa de câmbio na próxima semana depende do desfecho da eleição americana, que pode tirar pressão de divisas emergentes, e, sobretudo, de um sinal mais claro do governo brasileiro de apoio à agenda de controle fiscal do ministério da Fazenda.
“A notícia de que o Haddad vai ficar fora na semana que vem sugere que não há urgência dentro do governo para soltar o pacote de corte de gastos. A alta do dólar mostra que a situação está ficando cada vez mais complicada”, afirma Costa. “O governo deveria dar pelo menos algum sinal de que o debate das medidas fiscais está avançando.”
Ibovespa
O Ibovespa iniciou novembro convergindo para nível do início de agosto, a 128 mil pontos, com a pressão sobre o câmbio – ante o que o mercado percebe como demora da ação do governo sobre as despesas públicas – mantendo a curva de juros em alta e o apetite por ações na Bolsa enfraquecido. Nesta sexta-feira, o índice da B3 recuou 1,23%, aos 128.120,75 pontos, o menor nível de fechamento desde 7 de agosto, então aos 127,5 mil pontos. O giro financeiro foi a R$ 21,8 bilhões na sessão.
Na semana, o Ibovespa acumulou perda de 1,36%, após ter recuado 0,46% no intervalo anterior. Nas últimas cinco semanas, o índice obteve avanço em apenas uma – e bem leve, de 0,39%, entre 14 e 18 de outubro. Hoje, oscilou de 128.069,79 a 129.902,20, saindo de abertura a 129.718,01 pontos. No ano, recua 4,52%.
A cereja no bolo da piora de percepção sobre a situação fiscal veio nesta sexta-feira, com a divulgação de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estará na próxima semana em viagem à Europa. Uma ausência que desagrada ao mercado – e que resultou em pressão adicional no câmbio e na curva de juros doméstica nesta sexta-feira -, impaciente com o que percebe como falta de senso de urgência do governo com relação ao ajuste fiscal.
“A expectativa de um atraso na divulgação do pacote fiscal gera clima de insegurança, especialmente com a viagem do ministro da Fazenda, o que aumenta a desconfiança no mercado”, resume Christian Iarussi, sócio da The Hill Capital, destacando o efeito, em especial, sobre as ações de setores mais sensíveis a juros, como os de varejo e construção civil – exceção nesta sexta-feira para Eztec, na ponta ganhadora do índice, após reportar lucro líquido de R$ 132,6 milhões no 3º trimestre, em alta de 239% ante o mesmo intervalo do ano anterior.
No quadro amplo, o Ibovespa mostrou desalinho ao desempenho de Nova York nesta sexta-feira, onde os ganhos chegaram a 0,80% (Nasdaq) no fechamento, após leitura bem abaixo do esperado para a geração líquida de vagas de trabalho nos EUA em outubro, de apenas 12 mil no mês. A fraca criação de empregos mantém sobre a mesa a perspectiva de que o Federal Reserve poderá efetivar corte de 25 pontos-base na taxa de juros na reunião do próximo dia 7, quinta-feira.
Em contraponto, no Brasil, a economista Bruna Centeno, advisor na Blue3 Investimentos, aponta que o receio fiscal ainda pesa muito sobre a confiança dos investidores, o que impede a Bolsa de pegar a carona do exterior um pouco mais favorável, onde os mais recentes dados agregados sobre a economia americana, entre os quais o payroll, mantêm os Estados Unidos no rumo de juros mais baixos.
Aqui, “a deteriorada percepção sobre o fiscal pesou bastante sobre os preços dos ativos ao longo da semana. E mesmo com a alta vista hoje no petróleo no mercado internacional, as ações da Petrobras estiveram entre as perdedoras do dia na B3, assim como as de grandes bancos e as de varejistas”, acrescenta.
No fechamento, Petrobras ON e PN mostravam baixa de 1,95% e de 1,36%, respectivamente, enquanto as perdas da sessão chegaram a 1,81% (Bradesco PN) entre as maiores instituições financeiras. O dia também foi negativo para a principal ação do Ibovespa, Vale ON, em baixa de 0,05%. Na semana, como Gerdau PN (+1,17% no intervalo), a ação da mineradora esteve entre as poucas de primeira linha a avançar, com ganho de 0,49% no período. Na ponta perdedora do índice na sessão, destaque para Vamos (-8,27%), Azul (-6,51%) e Magazine Luiza (-6,34%). No lado oposto, Eztec (+6,51%), São Martinho (+5,21%) e Totvs (+3,72%).
A despeito do cenário doméstico ainda nebuloso, cresceu o otimismo do mercado financeiro sobre o desempenho do Ibovespa na próxima semana, mostra o Termômetro Broadcast Bolsa desta sexta-feira. Entre os participantes, 62,50% disseram esperar que o índice tenha uma semana de alta, em comparação a 42,86% na edição anterior. A expectativa de ganhos não aparecia como majoritária desde a semana de 14 de outubro. Os que esperam estabilidade são 25%, abaixo dos 42,86% na última pesquisa. E a fatia dos que disseram que a Bolsa deve ter uma semana de baixa caiu de 14,29% para 12,50%.
“A temporada de resultados do terceiro trimestre pode ser decisiva para impulsionar o Ibovespa em novembro. As expectativas são positivas, para aumentos de Ebitda e da receita, apesar da retração nas commodities, que pode limitar uma recuperação mais intensa do índice”, diz Eduardo Nogueira, sócio da One Investimentos. Ele ressalva que o panorama macroeconômico e político, tanto no Brasil como nos Estados Unidos, permanece “repleto de incertezas”, entre as quais as eventuais consequências da eleição americana – como as “possíveis tarifas de Donald Trump, que podem impactar a inflação e afetar emergentes como o Brasil”.
Juros
Os juros futuros fecharam a sexta-feira em forte alta, refletindo a falta de perspectiva sobre quando o governo vai divulgar o pacote de corte de gastos, após a informação de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estará em viagem à Europa na próxima semana. As taxas chegaram a abrir mais de 30 pontos-base nas máximas e praticamente toda a curva superava 13% no fim da sessão, pressionadas ainda pelo dólar perto de R$ 5,90, num dia em que os Treasuries longos também não colaboraram.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 fechou em 13,08%, de 12,80% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027, em 13,23%, de 12,96% ontem. O DI para janeiro de 2029 terminou com taxa de 13,22%, de 12,97% ontem no ajuste.
“O mercado inteiro está esperando uma resposta, mas há uma total falta de senso de urgência dentro do governo. Por trás de uma realidade política, há uma realidade econômica que não pode ser subestimada”, afirma o estrategista-chefe da Monte Bravo, Alexandre Mathias.
A expectativa era de que o pacote fosse anunciado logo após as eleições, mas até o momento nada foi divulgado, com a equipe econômica tentando manter as propostas guardadas a sete chaves. Mathias acredita que as medidas podem estar prontas, a espera do um aval do presidente Lula, mas emperradas pelo jogo político. “A viagem do ministro pode ser uma estratégia didática para mostrar para as demais áreas o custo da demora do anúncio”, afirma. Para ele, no entanto, ao fim e ao cabo, o presidente Lula será “pragmático” e “fará o que tem de ser feito”.
A diretora de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management, Solange Srour, lembra, em mensagem no Linkedin, que ao anunciar medidas significativas para garantir que o arcabouço econômico seja viável em 2026, a equipe econômica gerou expectativas de que um pacote relevante seria proposto. “No entanto, se o tempo passa e nada é anunciado, a incerteza aumenta”, afirma. Para a diretora, se as expectativas começam a reverter para o pessimismo, há risco de uma “profecia autorrealizável” em que o pessimismo leva à redução do investimento, do consumo e a um comportamento de aversão ao risco, com a deterioração dos ativos financeiros.
O imbróglio fiscal levou o dólar a fechar nos R$ 5,8694, maior nível desde a pandemia, o que preocupa sobre o cenário de preços e de ancoragem das expectativas de inflação, e a curva de juros a precificar uma Selic terminal acima de 13,5%. É nessa toada que o mercado começará a próxima semana, em que a agenda é carregada de eventos e indicadores, com destaque para a eleição americana e as reuniões de política monetária no Brasil e nos Estados Unidos.
As taxas chegaram a ter algum respiro pela manhã, em reação ao payroll fraquíssimo no que diz respeito à criação de apenas 10 mil vagas. Ao longo do dia, porém, o rendimento da T-Note de dez anos foi subindo, pela leitura de outros recortes do relatório de emprego e do índice de atividade industrial (PMI) dos Estados Unidos em outubro, que registrou avanço no componente de preços pagos acima do esperado. À tarde, a taxa ganhou ainda mais fôlego, batendo novas máximas desde julho, com o mercado se posicionando para a vitória de Donald Trump. No fim do dia, o yield batia a máxima de 4,384%.