O poeta carioca Antonio Cicero morreu na quarta, 23, na Suíça, aos 79 anos. Diagnosticado com Alzheimer, Cicero optou pelo suicídio assistido, e estava na Suíça, onde a prática é permitida, acompanhado do marido, o figurinista Marcelo Pies.
“O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem”, escreveu Cicero em carta endereçada aos amigos próximos.
“Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo.”
Apesar disso, ele continua, “ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação”.
“Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade.” A morte de Cicero ocorre no mesmo momento em que entra em cartaz nos cinemas o filme O Quarto ao Lado, de Pedro Almodóvar, que aborda a trajetória de uma escritora que, sofrendo de câncer, luta pelo direito de recorrer à eutanásia.
DIVERSIDADE
Poeta e imortal da Academia Brasileira de Letras desde 2017, Cicero foi compositor, crítico literário e filósofo. Irmão da cantora Marina Lima, teve a trajetória na literatura cruzada com o universo da música. Escreveu letras de canções como Fullgás e Pra Começar, em parceria com a irmã, e também colaborou com outros artistas, como João Bosco, Adriana Calcanhotto e Lulu Santos, com quem trabalhou em O Último Romântico.
Cicero começou a cursar filosofia na Pontifícia Universidade Católica do Rio e, na sequência, estudou no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio (UFRJ) e foi terminar seus estudos na Universidade de Londres – decidiu mudar-se para a capital britânica, em 1969, por problemas políticos.
Ele é autor de diversas publicações de poesia e reflexões sobre a modernidade. Em 1994, em parceria com o poeta Waly Salomão, organizou o livro O Relativismo Enquanto Visão do Mundo, que reuniu conferências realizadas no projeto Banco Nacional de Ideias, promovido pelos dois poetas.
Entre seus livros de poemas destacam-se Guardar (Editora Record), de 1996, e A Cidade e os Livros (Editora Record), de 2002. Cicero ainda teve o poema Guardar incluído na antologia Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século (Editora Objetiva) em 2001 e foi finalista do Prêmio Jabuti pelos ensaios filosóficos reunidos em Finalidades Sem Fim (Companhia das Letras) em 2005.
Ele lançou, em 1996, o CD Antonio Cicero por Antonio Cicero, em que recita seus poemas, e participou, em 2002, de uma coletânea de quatro CDs feita com nomes como Gabriel o Pensador, Chico Buarque, Ronaldo Bastos e Fernando Brant, em homenagem a Carlos Drummond de Andrade.