A operação, realizada hoje de manhã e apelidada de "Necator" (um tipo de parasita) pela prefeitura, tem potencial explosivo: iniciada pela administração de Fernando Haddad (PT-SP), ela atinge em cheio a cúpula das finanças da gestão de seu antecessor, Gilberto Kassab (PSD-SP). Ele é aliado de Dilma Rousseff no governo federal. A operação faz parte da ação 'Acerto de Contas', que será implementada por Haddad.
Um dos acusados das supostas falcatruas é o ex-subsecretário da Receita Municipal Ronilson Bezerra Rodrigues. Outro é Eduardo Barcelos, diretor de arrecadação do mesmo órgão. Eles eram da equipe do secretário Mauro Ricardo, de Finanças. Os outros presos são Carlos Augusto Di Lallo Leite do Amaral, ex-diretor da divisão de cadastro de imóveis e o agente de fiscalização Luis Alexandre Cardoso de Magalhães.
Os funcionários são acusados de integrar uma quadrilha que recebia propina de grandes construtoras para fornecer a elas certidões de quitação de ISS (Imposto Sobre Serviço) sem que pagassem tudo o que era devido.
O documento precisa ser emitido para que as construções obtenham o habite-se da prefeitura.
O grupo se reunia em um escritório a 300 metros da sede da prefeitura, no centro, apelidado de "ninho".
Kassab diz que nenhum dos investigados foi indicado ao cargo por ele. "São técnicos, funcionários de carreira."
MEDIDAS
A cgm (Controladoria Geral do Município) vai instaurar processo disciplinar para apurar as responsabilidades dos servidores envolvidos. Também vai determinar a instituição de uma força-tarefa para a adoção de medidas para o ressarcimento aos cofres municipais.
Os servidores também deverão responder pelos crimes de concussão/corrupção passiva, advocacia administrativa, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
PATRIMÔNIO
De acordo com a investigação, os quatro servidores teriam amealhado um patrimônio que, somado, chegaria a R$ 100 milhões. Ele seria formado por centenas de imóveis em várias cidades do país, além de carros de luxo e contas bancárias no exterior. Alguns são proprietários também de lotéricas.
Entre os bens adquiridos estão apartamentos de luxo, flats, prédios e lajes comerciais, em São Paulo e Santos, barcos e automóveis de luxo, uma pousada em Visconde de Mauá (RJ) e um apartamento duplex em Juiz de Fora (MG).
Na operação desta quarta-feira foram apreendidos com os quatro investigados motos e carros importados, grande quantidade de dinheiro (reais, dólares e euros), documentos, computadores e pen-drives.
Os bens localizados estão em nomes de familiares e de empresas nas quais os acusados figuram como sócios.
O Ministério Público deve enquadrá-los nos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva ou concussão, lavagem de dinheiro e advocacia administrativa.
INVESTIGAÇÃO
A investigação começou em março, quando a CGM (Controladoria Geral do Município), criada por Haddad, passou a monitorar a evolução patrimonial de 140 mil funcionários públicos.
Cruzamentos feitos em diversas bases de dados, como a de registro de imóveis de SP e de outras cidades, detectaram servidores com patrimônio incompatível com os seus vencimentos.
A CGM passou então a acompanhar de perto a situação daqueles que ocupavam cargos considerados sensíveis, como os de fiscalização.
Foi então que identificou o grupo da Secretaria de Finanças, liderado, sempre de acordo com as investigações, pelo subsecretário da Receita Municipal de São Paulo.
A CGM passou então a compartilhar os dados com o Ministério Público, que solicitou à Justiça a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico dos envolvidos.
Além de grampo em telefones fixos e celulares, foi realizada também escuta ambiental no escritório apelidado de "ninho".
Há casos em que os depósitos realizados por construtoras na conta de um dos acusados chegaram a alcançar R$ 1,8 milhão em apenas um mês.
Em uma ocasião, uma construtora fez depósito de R$ 480 mil e conseguiu a certidão de ISS depois de pagar apenas R$ 12 mil.
A prefeitura calcula que a propina chegava em alguns casos a 50% do imposto que as empresas deveriam pagar.
A administração e o MP já solicitaram o bloqueio de bens dos funcionários. As empresas privadas envolvidas serão investigadas e intimadas a pagar o que deixaram de recolher aos cofres públicos municipais.
Folha de S. Paulo