A comunidade do bairro se diz acuada pelos criminosos. Na noite em que o corpo do professor era velado, próximo ao local, ladrões roubavam moradores na rua. Grades, câmeras de segurança, muros altos já não intimidam os criminosos que em suas motos passeiam tranquilamente pelo bairro fazendo “levantamento” das próximas vítimas.
Um estudo da Polícia Militar, feito com dados oficiais, tenta mapear a violência no município, na segunda maior cidade do Estado, penalizada por estar tão próxima a Capital. Apesar de estar separada dela apenas pelo rio Cuiabá, é considerada hoje a cidade mais violenta de Mato Grosso, se analisada a proporção da população. É a 129ª mais violenta entre os 5.665 municípios do país, como mostra o mapa da violência de 2010, com uma taxa de homicídios crescente. Colada à Capital, a renda per capita do município é de 11,28, contra os 20,04 de Cuiabá. O índice de Mato Grosso fica na casa dos 17.92 e o brasileiro na casa dos 15,24. Para a funcionária pública Aparecida Maria Santos, 47, que mora há 25 anos no bairro onde ocorreu o crime, a situação é insustentável. Vizinha do professor morto, disse que nos últimos 3 anos o medo tomou conta da comunidade, composta em sua maioria de moradores antigos.
Ela disse que não consegue ficar tranquila enquanto os filhos não chegam em casa. As rondas policiais são insuficientes. O medo atinge o grupo de funcionários do mercado que viu o professor ser morto friamente durante a tentativa de roubo, por volta das 16h30 da segunda-feira (20). Um dos 2 jovens que invadiram o mercado fez os disparos, quando o professor esboçou uma reação. O aposentado J.F.N., 72, pai da proprietária, disse que a filha ainda está em choque.
Aponta que a violência crescente que invade os bairros, tem como origem a falta de cuidado das famílias. Os crimes, na opinião dele, são praticados por jovens que não são cobrados, monitorados e que não contam com bons líderes.
Para o autônomo Antônio Lauri, 62, a morte do vizinho foi uma grande perda. Descreve Mauro como uma pessoa tranquila, que nunca teve qualquer problema com os vizinhos. No dia em que foi morto o viu, cerca de 5 horas antes, quando levava a filha de 7 anos para a escola.
Depois, ao final do dia, se deparou com o corpo dele, caído no chão do mercado onde foi comprar um refrigerante. O fim trágico de uma amizade de 15 anos. A mulher e os 2 filhos não retornaram mais para a casa depois do crime. Lauri reflete e diz que como foi o vizinho, poderia ter sido ele, a esposa ou qualquer outro morador a vítima dos bandidos. Resta a revolta com a brutalidade.
Se os moradores que se deslocam pelo bairro sofrem por serem alvos de ladrões nas ruas e em pontos de ônibus, a situação dos comerciantes também é crítica. Aldir Sidnei Lauri, 35, há 12 anos montou uma loja e escola de informática, no bairro e também relata que nos últimos 3 ou 4 anos os roubos e furtos se intensificaram. Até as lâmpadas externa da empresa são alvos dos ladrões. Recentemente, levaram o escapamento das motocicletas de alunos, estacionadas no entorno da empresa.
O comerciante Arnaldo Gomes, 45, dono da distribuidora de bebidas, ao lado do mercado, acredita que poderia ter sido alvo dos ladrões se na hora do crime estivesse com as portas abertas.
Saiu por volta das 16h, depois de receber mercadorias. Poucos minutos depois, os ladrões invadiram o mercado. Ele só trabalha atrás das grades, atendendo clientes por meio de uma pequena abertura. Já adquiriu a empresa assim e admite que já pensou em fechar parte da grade com concreto. Já reduziu o horário de atendimento, que das 22h agora vai até no máximo às 19h. Vê os ladrões circulando durante o dia, analisando os futuros alvos. Soube até que tem uma escala de dias de preferência para a prática de roubos. As segundas-feiras, quintas-feiras e as tardes e noites de domingos, que consideram os melhores dias de trabalho.
ESTUDO -O coronel PM Wilquerson Felizardo Sandes, responsável pelo policiamento ostensivo no município de Várzea Grande, fez um estudo profundo sobre a violência no município, nos últimos 10 anos, usando números de fontes oficiais. Acredita que para combater a criminalidade é preciso saber que fatores a geram. Ele tem ciência que o município é a cidade mais violenta do Estado, com base na taxas oficiais. Aponta que as desigualdades sociais são fatores que contribuem para o aumento desta violência que se vive hoje. Doutor em educação, assegura que a Polícia sozinha não tem poder para reverter o quadro. Mas sim uma ação social. Entre as mudanças é preciso levar escola em tempo integral para crianças e adolescentes, tirando-os da vulnerabilidade das ruas.
Os administradores precisam criar espaços públicos que oferecem lazer saudável para a comunidade, para que as praças não continuem se tornando ponto de encontro para criminosos e traficantes. Para Wilquerson, a redução de horário de funcionamento de bares é fundamental para a redução de execuções na cidade. São nestes locais ou no entorno deles que ocorre a grande parte dos crimes. Lembra que, recentemente, foi feita uma fiscalização, mas que o município deveria exigir dos comércios que querem funcionar após às 22h critérios de segurança mais rígidos. Um exemplo é a instalação de câmeras de segurança. Na opinião do titular do Comando Regional 2, quando o Código de Posturas do município for aplicado integralmente, com certeza toda sociedade vai ser beneficiada.
Por ser considerada uma cidade dormitório, Várzea Grande absorve os problemas da região metropolitana, agravados pela situação geográfica, por ser rota de escape para a faixa da fronteira com a Bolívia. Observa ainda que 85% dos envolvidos em crimes são maiores de 18 anos e grande parte atua em roubos e tráfico de drogas.
As 192 vagas existentes na Cadeia Pública da cidade hoje são ocupadas por 325 presos, com uma superlotação de 70%.
Fonte: Gazeta Digital
Foto: Ilustrativa