Jurídico

Graciema Caravellas toma posse como desembargadora do TJMT

O Pleno do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, presidido pela desembargadora Clarice Claudino da Silva, deu posse hoje (27), às 10h, no Palácio da Justiça, a magistrada Graciema Ribeiro de Caravellas, promovida pelo critério de antiguidade ao cargo de desembargadora numa cerimônia prestigiada por várias autoridades entre as quais estavam o senador Jayme Campos, a deputada Janaina Riva, o procurador-geral de justiça Deosdete Cruz Júnior, a defensora pública-geral Maria Luziane, além de grande assistência que lotou os lugares destinados ao público em geral. 

Graciema Ribeiro de Caravellas foi escolhida em sessão do órgão plenário na data de ontem (26) por unanimidade de votos dos desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, recebendo várias manifestações de elogio a sua carreira como magistrada durante seus 36 anos de judicatura, iniciada na comarca de Pontes e Lacerda em 1986, passando pelas comarcas de Alta Floresta, Rondonópolis, Diamantino e Cuiabá. 

A novel desembargadora foi conduzida ao plenário para tomar posse pelos desembargadores Orlando de Almeida Perri e Maria Aparecida Fago, sendo saudada pelo desembargador Sebastião de Moraes Filho em nome do Tribunal de Justiça, num discurso que realçou as qualidades técnicas e morais da empossada, bem como a sua luta contra a injustiça contra si cometida e seu retorno a carreira da magistratura em 2022. 

O discurso de Graciema Ribeiro de Caravellas calou fundo nos presentes a sessão, tendo realizado a empossada uma incursão profunda e sensível sobre a sua origem, carreira, família, perdas de entes queridos e luta incessante para demonstrar sua inocência e o retorno com dignidade restaurada a magistratura.  

Ao final de sua manifestação, a desembargadora Graciema Ribeiro de Caravellas foi aplaudida de pé e incessantemente pelos seus pares e por toda a assistência da solenidade, realizando-se um gran finale típico de William Shakespeare sobre injustiça e gravado pela sua imortal frase: "Ame a todos, confie em poucos. Não seja injusto com ninguém."  

Confira a íntegra do discurso de Graciema Ribeiro de Caravellas: 

– Excelentíssima Senhora Desa. Clarice Claudino da Silva, digníssima Presidente do e. Tribunal de Justiça, na pessoa de quem cumprimento as autoridades que compõem a mesa de honra e a Corte

– Demais autoridades presentes, senhores convidados, caros amigos, prezados servidores, querida família.

O tempo, com sua velocidade inexorável, muitas das vezes nos faz impacientes, especialmente quando buscamos alcançar satisfações pessoais, como a que ora me é propiciada, quando logro alçar o mais alto posto da Carreira do Judiciário de Mato Grosso, passados 36 anos de magistratura.

São muitas as lembranças que me vêem à mente, desde que em 09 de dezembro de 1986 assumi as funções judicantes na Comarca de Pontes e Lacerda, em companhia do colega Sebastião Barbosa de Farias, como bem lembrado por ele na Sessão Plenária de ontem.  Recordo que, ao falar aos presentes, externei a felicidade que me invadia a alma pela ventura de ver realizado um sonho acalentado desde a juventude – o de exercer a judicatura – e que só então Deus me considerava capaz.

A partir de então é que pude me conscientizar do quão difícil, apesar de nobre, é o exercício da magistratura, numa comarca na época considerada de difícil provimento, dadas as suas peculiaridades, notadamente o alto e diversificado índice de criminalidade que a assolava, instalada há apenas um ano e ainda precária de recursos físicos e de pessoal, quando o nosso meio de comunicação oficial com o Tribunal de Justiça era o telex do Banco do Brasil.

O passar dos tempos me foi ensinando, desde aqueles idos de 1986, que ser juiz não se limitava a realizar audiências e a decidir processos. Era preciso se desdobrar na administração de um Fórum ainda carente de quase todos os recursos; era necessário exercer as funções de assistente social e psicólogo, ainda não previstas no quadro lotacional ou pelo menos ainda não instaladas e cuja ajuda era buscada por mulheres que vinham de longe, procurando o auxílio e a orientação da juíza que, como mulher, poderia lhes solucionar os conflitos familiares para que não mais continuassem espancadas e traídas por seus cônjuges. Eram atendimentos que se arrastavam até tarde da noite, muitas das vezes à luz de velas, como geralmente também eram concluídas as longas e exaustivas audiências, porque os motores geradores de energia eram desligados a partir de determinado horário. Os registros, todos feitos em máquinas manuais. A primeira elétrica, por mim adquirida, foi motivo de visitação no cartório. O serviço de internet nos era desconhecido e a jurisprudência, acessível a poucos, por meio dos repositórios, RT’s e demais livros especializados adquiridos especialmente da Livraria Janina.

Foram anos de dedicação e luta, por vezes respondendo também pela Comarca de Mirassol D’Oeste, realizando inúmeras reuniões nas escolas, Lions, Maçonaria e com os Órgão de Segurança, em especial com as Policiais Civil e Militar, buscando conscientizar a sociedade local sobre a necessidade de mudança comportamental e de ideais para suas futuras gerações.

Nada disso, nem mesmo a ausência de meu amado esposo que, para sua ascensão na Carreira Militar, se submetia a curso de especialização fora do Estado e dos meus três filhos, que não puderam me acompanhar por falta de casas disponíveis para aluguel na cidade e por isso foram estudar no sudeste do país sob os cuidados dos avós paternos, deixaram arrefecer o meu ânimo de distribuir a melhor Justiça, aquela a que me propunha desde quando apenas sonhava ser juíza: séria, firme, mas humana e eficaz.

Lá, cultivei amizades das quais até hoje partilho e quando, em agosto de 1989 fui promovida por merecimento para a Comarca de Alta Floresta, no Nortão, também no início de seu mais amplo desenvolvimento, deixei a comarca com uma agradável sensação de que nosso trabalho havia fincado raízes na consciência da população, em especial sobre a necessidade de um crescimento ordeiro.

Nessa época, minha filha Cláudia Helena já me acompanhava, inclusive trabalhando ao meu lado e os dois menores residiam com o pai, que já havia retornado a Mato Grosso e comandava o Batalhão Militar responsável por Cáceres e região.

Em dezembro daquele ano fui designada para a acolhedora Comarca de Rondonópolis e, em outubro de 1990, para jurisdicionar Pedra Preta, cuja Comarca tive a honra de instalar. Respondia também, nas faltas e impedimentos dos magistrados, por Alto Garças e Alto Araguaia, com deficiente pavimentação asfáltica e o perigoso trajeto de retorno à noite, em época chuvosa, tornava tenso o trajeto de retorno para casa.

Em Rondonópolis, logrei o primeiro passo à informatização. Adquiri meu primeiro computador e junto com a colega Marilsen, recebíamos aulas aos finais de semana sobre o difícil manejo daquela estranha máquina com experiente instrutor garimpado na Capital.

Só em Rondonópolis pude levar comigo os três filhos, mas continuava distante do meu marido, que na época, servia em Cuiabá e que nos visitava, sempre que possível, aos finais de semana.

Em setembro de 1992 fui promovida, também por merecimento, para Diamantino, de onde guardo boas recordações, de momentos de muito trabalho e de diversão após o expediente na companhia da colega Helena Maria.

De lá vim promovida para Cuiabá, outra vez por merecimento, em dezembro de 1992, onde assumi a 5ª Vara Criminal e, a exemplo das demais Comarcas, passei a exercer a concomitante Diretoria do Fórum.

Aqui, tive a honra de assumir a primeira Diretoria do Fórum Criminal, na época desmembrada pelo saudoso Des. Salvador Pompeu de Barros Filho da Diretoria do Fórum Cível e que assim permaneceu até a instalação do atual Fórum da Capital, quando foram novamente unificadas sob a gestão do des. José Ferreira Leite.

Em 27 de janeiro de 2005 fui removida para o exercício das funções de Juiz Substituto de 2º Grau ao lado dos colegas Clarice Claudino, Marilsen Addario e Cirio Miotto, também pelo critério de merecimento e então passei a participar de julgamentos colegiados.

 Já nessa época, havia sofrido duras e irreparáveis perdas físicas de entes queridos: do meu amado filho Caio Graco em 1995, do meu pai e do meu marido em 1999.

O destino, porém, me reservava outra profunda e avassaladora perda: da moral, da dignidade, da honradez. Meu nome, que nunca havia sofrido qualquer nódoa, jamais manchado por qualquer processo administrativo, nem por simples reclamação funcional foi, repentinamente jogado ao vento, com todas as forças disseminantes de uma parte da imprensa, talvez até por desconhecimento da realidade dos fatos e que culminou com uma posterior decisão administrativa injusta, derruindo toda uma vida de luta e de inteira, digna e honrada dedicação ao nobre exercício da judicatura.

Infelizmente, julgada, antes, por parte da mídia que deturpava os fatos, acabei também injustamente julgada pelo CNJ e aposentada compulsoriamente em 2010, em Processo Administrativo ali instaurado.

Desde então, passei, ao lado das minhas filhas, genros e netos, longos e angustiantes anos a fio, aguardando que a Justiça fosse feita, e que Deus me concedesse a graça de viver o tempo suficiente para ver resgatada a minha dignidade e reconhecida a minha inocência, para que minha descendência não se visse marcada por uma conduta ofensiva à ética funcional a mim injustamente atribuída.

Essa tão esperada decisão veio da colenda 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal no Mandado de Segurança 28.799, em 08 de novembro de 2022,  anulando a aposentadoria compulsória e  assegurando-me a reintegração no cargo, oportunidade em que a justa Justiça realmente se fez, como esperada, sendo reconhecida e declarada a minha total inocência bem como a de outros colegas, e mais, deixando grafado que desde os idos de 2009, nós, as juízas envolvidas, já estávamos inocentadas pelas provas dos autos, conforme o parecer do Ministério Público Federal que postulou o arquivamento a nosso respeito.

Foi essa justa e corajosa decisão que me permitiu retornar às funções judicantes, com o exercício, por designação, desde 12 de novembro do ano passado, na Câmara Temporária de Direito Público deste Tribunal.

Assumi essa nova incumbência com o mesmo ânimo que me impulsionava ao ingressar na Magistratura, agora com novos desafios, pois diante de um novo Código de Processo Cível e outras normas pertinentes, de uma sistemática de precedentes repetitivos, de um sistema de processo eletrônico e de matéria com nuances completamente diversas daquelas da área criminal em que atuei nos últimos anos de exercício, o que reacendeu o meu ânimo, consciente do quanto ainda poderia me manter produtiva no exercício do meu mister.

Abracei o Direito Público e Coletivo, me dediquei e ainda me dedico, dia após dia, no aprimoramento da entrega da prestação jurisdicional para atender a máxima que estampa o Brasão deste Sodalício, de “dar a cada um o que for seu” (suum cuique tribuere), o que vem sendo cumprido com auxílio de uma equipe de aguerrida e eficiente Assessoria Jurídica.

Junto à Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, esta sob a Presidência da querida e dinâmica Desa. Maria Aparecida Ribeiro e ainda ombreada com os colegas Edson Reis e Gilberto Bussiki, tenho atuado de forma ativa e producente, o que me permite, sem falsa modéstia, dizer que o propósito a que me dispus a cumprir vem sendo alcançado.

Hoje, após 36 anos de magistratura, estou aqui, honrada e honrosamente, assumindo o cargo de Desembargadora desse egrégio Tribunal de Justiça, pela estreita porta da antiguidade, alcançada pelo decurso do tempo e ao qual fazia jus e era merecedora desde 2011 mas  só tenho a agradecer por esta dádiva, consciente de que o nosso tempo não é o por nós esperado, nem desejado  e programado, mas é o tempo de Deus, e que Ele, sabedor de tudo e de todas as coisas, decidiu que só agora sou merecedora do privilégio por muitos perseguido, mas por poucos alcançado, de ocupar uma das cadeiras da mais alta Corte de Justiça estadual.

Estarei aqui neste Tribunal por pouco tempo, mas o suficiente para concluir minha carreira com a cabeça erguida, com minha honra e dignidade resgatadas e, principalmente, com a grata e indescritível satisfação de saber que minha família, principalmente minhas filhas, genros, netos e bisnetos poderão transitar sem constrangimentos por qualquer lugar por onde decidirem trilhar.

Não posso deixar de externar que sou a prova viva de que quedas e atropelos nos fazem crescer em conhecimento, paciência, equilíbrio, obstinação e humildade. Estes atributos, somados a uma força quase sobrenatural, me mantiveram firme e confiante ao longo de todos esses doze anos, permitindo-me chegar até aqui de cabeça erguida e de forma honrosa.

No caminho que me trouxe a esta conquista suportei muitas adversidades, muitos dissabores e momentos de profundas lesões na alma, mas mesmo assim permaneci de pé, sustentada por uma inabalável confiança em um Deus grandioso que manteve sempre a espada da Justiça voltada em minha direção.

E foi por essa fé que sempre me senti revigorada e consegui transformar os percalços em motivo para manter a cabeça erguida, confiante de que mais cedo ou mais tarde, eu haveria de me sagrar vencedora.

E hoje aqui estou, partilhando com minha família e amigos esta felicidade que se mostra avassaladora, quase que inenarrável, quando após longa e exaustiva espera sou promovida e assumo o tão esperado desembargo, certa de que, embora – repito – seja breve o espaço de tempo de que disponho em atividade, Deus me proverá os meios para que eu seja digna desta nova e nobre missão.

E é assim que me apresento hoje, para integrar essa corte de Justiça, com o firme propósito de oferecer a minha melhor contribuição para que o Judiciário de Mato Grosso continue avançando, cada vez mais célere, no seu propósito de distribuir justiça rápida e eficaz.

O momento, contudo, mais do que um caminho de recordações e realizações pessoais, é de agradecimentos.

Quero agradecer profundamente a Deus, a quem deposito uma fé inabalável e que me concedeu saúde e força para suportar todas as adversidades do caminho da vida e da carreira da magistratura, permitindo-me crescer em sabedoria de vida, paciência, humildade e maturidade, e por me possibilitar vivenciar a Justiça sendo feita a mim e a meus colegas magistrados Antonio Horácio, Maria Cristina, Juanita e Marcos Aurélio, que também voltaram a honrosamente integrar o Poder Judiciário deste Estado e neste momento, tenho a grata satisfação de incluir dentre os vitoriosos o des. Mariano Travassos, que teve o seu julgamento pela Suprema Corte hoje concluído, tendo a notícia me chegado ao conhecimento há poucos instantes, mesmo êxito que espero seja alcançado pelos demais colegas que ainda aguardam igual desfecho positivo. 

Agradeço ao meu saudoso pai Jair  o exemplo de dedicação ao trabalho e à minha amada mãe Lucila, mulher de grande e inabalável caráter, os ensinamentos que nortearam minha conduta e meus princípios como ser humano. Ambos me ensinaram a ser forte, a enfrentar os momentos difíceis com coragem, dinamismo e sobretudo com dignidade. 

Apesar de não mais contar com a presença física de meu amado esposo Tito Lívio, sinto-o em espírito ao meu lado, continuando a me proteger e sei que também está feliz pela minha ascensão. Agradeço a ele por sempre me haver encorajado, sem castrar um sequer dos meus ideais. Pelo contrário, durante toda a nossa vida em comum, sem qualquer discriminação à época usual na convivência conjugal, deu-me o apoio que só um grande homem é capaz de oferecer  e de quem muito me orgulho.

Agradeço ao meu amado filho Caio Graco, de quem sinto uma falta imensurável, a quem manterei vivo comigo durante toda a minha existência, pelo tempo de convivência entre nós, ensinando-nos a alegria de viver, com seu espírito pacificador. Estou certa de que ele também, junto com o pai, se alegra com esse momento de tamanha felicidade familiar.

Agradeço às minhas amadas filhas Claudia Helena e Rhea Silvia e aos meus queridos genros Harry e Emerson, por sempre se manterem firmes ao meu lado, me apoiando em todas as situações.

Aos meus tão amados netos Caroline, Gabrielle, Emerson Caio, Emanuelle e João Vitor; à minha linda e esfuziante bisnetinha Livia e ao meu tão esperado bisnetinho Caio, ainda sendo gestado, por reascenderem, um a um, a minha alegria de viver e me propiciarem tantos momentos de feliz convívio familiar.

Minha família, de forma inegável, é a minha maior fonte de incentivo e onde, quando as forças parecem esvair, as encontro para não desistir durante a caminhada e por quem sou impelida a tomar atitudes que só lhes possam servir de exemplo.

Agradeço a todos que têm me acompanhado durante todo o meu percurso, aos meus assessores e  servidores, do passado e atuais, aos amigos de todas as horas e a todos aqueles que me alegram com sua presença, prestigiando este momento tão importante de minha carreira.

Os meus mais sinceros e profundos agradecimentos aos Senhores Desembargadores que depositaram em mim a sua confiança e pelas palavras tão elogiosas a mim dirigidas na sessão Plenária de ontem, o que muito me emocionou e engrandeceu, assim como foram as palavras do querido des. Sebastião Moares, aqui hoje proferidas. O meu especial e mais profundo agradecimento à nossa querida Presidente, desembargadora Clarice Claudino, pela luta hercúlea desenvolvida para que eu pudesse chegar, em tempo hábil, a esse momento de plena realização profissional, propiciando tamanha felicidade a mim e à minha família.

Que Deus ilumine a todos e continue nos guiando, permitindo que continuemos sempre dignos e honrados e que nossos corações jamais endureçam, apesar das dificuldades e adversidades e que, semeadores conscientes que somos, possamos escolher, dessa colheita farta que ora saboreamos, sempre as melhores sementes, espalhando-as diariamente ao nosso redor, para que, ao final de tudo, tenhamos apenas motivos para continuar agradecendo.

Muito obrigada a todos.

Graciema Ribeiro de Caravellas

    Desembargadora – TJMT

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